título: corda
data de publicação: 03/07/2025
quadro: luz acesa
hashtag: #corda
personagens: cléber, ronaldo e joel
TRANSCRIÇÃO
[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei para mais um Luz Acesa. E hoje eu vou contar para vocês a história do Cléber. Então vamos lá, Vamos de história.
[trilha]O Cléber ele era baixista de uma banda de rock, banda cover, tinha cinco integrantes e iam de cidade em cidade — dentro do estado ali onde eles moravam —, a banda tinha mais um motorista e um hold. — Que é o cara que monta e desmonta ali os equipamentos e tal. — Então, essa era a configuração, eles sempre viajavam em sete pessoas, cinco integrantes da banda, um hold e um motorista. — Às vezes ia a namorada de um ou a namorada de outro, mas eles tinham um combinado que somente as namoradas sérias ou as esposas poderiam ir, eles não podiam, por exemplo, terminar um show, ficar com uma menina e botar ali na van da banda, mesmo porque a van não era da banda, era do motorista. — Eles iam cedo porque tinha que passar som, essas coisas, ficavam ali pela cidade e a noite acontecia o show. Normalmente começava ali pelas 23h00 e acabava umas 02h00 e eles já entravam na van.
Geralmente o motorista ficava dormindo na van, jantava com eles e tal e depois voltava para a van para dormir, para estar inteiro para de madrugada dirigir. E o hold ficava por ali com a banda, se acontecesse alguma coisa com o som ou depois para desmontar os equipamentos, enfim, esse era o trampo de cada um, né? E eles fizeram isso por anos e sempre dando certo aí. — A gente pode chamar a banda aqui de “Os Pôneis”, [risos] amo… — Os Pôneis tocavam em várias cidades pelo estado, rodavam mesmo, as vezes quando era de sábado, eles faziam dois shows se a cidade era perto, então começava um, sei das oito a meia noite, meia noite ia para outra casa de rock e fazia o show, enfim… A alma da banda era o Ronaldo, que é o vocalista que era o cara ali que tomava a frente de tudo, né?
Então sempre o Ronaldo que agitava tudo, o Ronaldo também que cuidava da agenda, e o Ronaldo sempre foi um cara muito animado. Ali na van mesmo ele sempre foi muito divertido, contava piada, ninguém conseguia dormir porque o Ronaldo ficava enchendo o saco, enfim, ele era esse cara e todo mundo gostava muito dele. A banda Pôneis foi fazer um show aí numa cidade e, naquele dia, eles saíram de casa umas onze horas, porque tinha todo o trajeto e eles tinham que chegar e tinham que passar o som, então eles estavam a umas três horas da cidade onde eles iam tocar, então eles saíram ali por volta das onze horas para chegar umas quatorze, quatorzes e pouco no lugar para passar o som tal, e depois eles ficaram ali pela cidade para começar o show. Era um show que começaria mais cedo e eles também voltariam mais cedo para casa.
E o motorista da van ele marcava num lugar para pegar todo mundo, mas por exemplo, o baterista que tinha mais coisa para levar, eles passavam na casa do baterista e o último que ele pegava era o Ronaldo, então o Ronaldo já entrava fazendo festa e, nesse dia, o Ronaldo estava muito calado… Ele entrou, cumprimentou todo mundo e tal e estava calado. Ronaldo estava diferente, ninguém sabe explicar. E aí perguntaram para ele, ele falou: “Não, tô então com a garganta um pouco ruim e tal, mas vou ficar mais quieto aqui porque na hora de cantar” — ainda mais rock e tal — “Então eu vou preservar aqui um pouco a minha voz”, a galera entendeu, e aí o povo também acabou adormecendo ali na van. E chegaram, passaram o som, nesse momento também o Ronaldo sempre brincava muito e ele passou o som muito sério… Depois eles foram andar pela cidade e o Ronaldo preferiu ficar deitado ali na van, descansando.
E aí a cidade fica agitada porque a “ah, pô, tem os caras aí”, “os cabeludos, os roqueiros”, “que legal” e não sei o que lá. E aí o show lotou, foi um show, assim, espetacular… O Cléber falou: “Andréia, parecia que, sei lá, parecia que a gente estava num festival, assim… Tinha muita gente, muita gente… Lotou a casa, o pessoal pediu bis, a gente tocou uma hora a mais do que o combinado no nosso contrato, né?” e foi um show maravilhoso, o Ronaldo estava sensacional. Foi bom que ele preservou a voz porque o cara cantou demais, e aí eles terminaram ali, o hold desmontou as coisas, guardou os equipamentos na van, eles comeram ali um cachorro-quente, alguma coisa e era voltar, né? — Voltar pra casa agora. — Isso era ali mais ou menos umas duas da manhã, o motorista estava vivão, tinha dormido já na van, ele não bebia absolutamente nada, então ele tava sóbrio, estava inteiraço, tinha dois ali integrantes da banda que tomaram ali umas cervejas a mais, mas eles iam dormindo e tranquilo.
E numa van, assim, é difícil você ver todo mundo colocar o cinto de segurança, né? E era uma coisa que o motorista não cobrava deles… Só que nesse dia, o motorista… — A gente pode dar um nome aqui pra ele, “Joel”. — O Joel falou: “Galera, vamos botar o cinto aí, bota o cinto, bota o cinto”, fez todo mundo botar o cinto, coisa que ele nunca fazia… Ele nunca fazia. Eles pegaram uma estrada, uma rodovia, uma pista boa, bem iluminada… — Tripla, então tinha muito espaço ali. — E foram vindo, estrada, estrada, estrada, e do nada algum veículo tocou na van e a van já perdeu o controle e capotou. [efeito sonoro de carro capotando] O Cléber falou: “Andréia, não dá pra explicar muito bem, a gente tava na estrada, algo tocou a gente atrás, a gente sentiu o tranco e a van já perdeu o controle e capotou. A gente capotou do lado de um trecho que era de ponte mesmo, tinha um rio embaixo e a van não caiu no rio… A van capotou para o lado, mas desceu aquela ribanceira que dava lá embaixo, perto do rio”.
A hora que que a van capotou, ele tava dormindo, mas ele acordou uns segundos antes… Ele acha que era um farol e que por isso que ele acha que era um caminhão ou um ônibus, porque o farol bateu no retrovisor da frente e iluminou o carro. Outros integrantes da banda achavam que aquilo não era o farol, que o carro iluminou de uma maneira estranha por dentro. O Cléber perdeu os sentidos ali na metade da coisa e, quando ele acordou, ele começou a perguntar: “Tá todo mundo bem, tá todo mundo bem?” e estava todo mundo bem, todo mundo vivo, graças ao cinto de segurança, mas eles estavam presos na van. Aí o Joel, que estava na frente, ele conseguiu sair e foi puxando as pessoas, só que ele estava sozinho para fazer isso, porque os caras estavam machucados e tal. De repente, apareceu um homem… Ele estava vestido com o que parecia ser um macacão de obra, macacão de trabalho, só que era preto, era estranho assim… — Ao mesmo tempo que parecia um macacão de trabalho, parecia que era um cara vestido assim com um macacão preto, estranho. —
Ele tinha o cabelo branco, uma barba preta e ele tinha um rosto que o Cléber falou: “Andréia, às vezes eu olhava para ele e parecia que o rosto dele se mexia”, falei: “Mas como isso? Se mexia?”, ele falou: “Parecia que tinha… Imaginado, assim, ó: Como se tivesse um besouro, uma aranha, uma bola, qualquer coisa por dentro da pele do rosto dele e que se mexia. Ele tinha algum caroço, alguma coisa que se mexia. Eu não sei te explicar bem o que era”, e aí esse cara foi tirando as pessoas da van, tirou todos os integrantes e falou: “Eu botei uma corda ali”, e o baterista não queria sair porque a bateria dele era muito cara e os cara começaram a brigar ali, porque enfim, você tem que deixar as coisas, vai que explode ali, né? “Primeiro vamos sair, depois a gente vê o que faz, né? Não é que a gente abandonar a van”, o Cléber falou, “mas a gente precisava sair dali, daquele buraco, que a gente caiu praticamente num buraco”.
E aí esse cara estranho falou: “Eu botei uma corda ali para vocês, pode subir” e eles foram subindo por essa corda que ia dar lá na estrada. E o Cléber falou pra ele assim: “Poxa, cara, meu… A gente não sabe como te agradecer, eu vou te dar meu telefone, que eu faço questão que você vá no próximo show da banda”, o Cléber falou isso pra ele e ele estava ali já vendo as pessoas subindo, uns tentando tirar coisa ainda da van, outros brigando, mas enfim, começaram a subir e este cara virou para o Cléber num tom mais baixo e falou para ele: “Não vai mais existir a banda, não vai mais ter banda”. O Cléber ficou sem entender… E aí nesse ponto ele viu esse negócio mexendo na cara do cara, assim, ele falou: “Andréia, eu não sei, parece que o cara, sei lá, tinha uma doença. Eu não sei, eu não sei o que era… E me deu um arrepio na coluna, assim, mas tava todo mundo vivo, tava todo mundo bem”.
Eles caíram numa ribanceira bem íngreme, que sem a corda eles não conseguiriam subir e eles foram subindo e, em determinada parte, quando já dava para você segurar no mato e subir, a corda sumia. Então, pensa assim: Você está subindo, botando o seu, o peso de seu corpo numa corda que tá presa em algum lugar pra sustentar o peso do seu corpo, só que em determinado ponto, onde já dava pra você subir segurando nas coisas no mato, enfim, não tinha mais corda. Quando o Cléber, que foi o último a subir e viu que ele segurava a corda até certo ponto e depois não tinha mais corda, ele olhou pra trás… Quando ele olhou para trás, ele não viu mais o cara e não tinha corda. Não tinha corda…
Na cabeça do Cléber, eles imaginaram aquela corda e conseguiram subir… Porque só isso faz sentido… Estava todo mundo vivo, estava todo mundo bem, não tinha nenhum carro parado na estrada. Nada… Um dos integrantes da banda falou que viu aquele cara descendo pela ribanceira, que ele veio de cima. — Então não é que ele veio do rio, ele não estava molhado, eles caíram bem ali numa parte perto do rio… —
E aí eles fizeram sinal pra algum carro, conseguiram o carona, foram até o posto policial e aí é aquele trâmite de tirar a van, enfim, tudo… E o cara da van tinha seguro, não é assim que não ia ter mais van, os equipamentos também não danificaram a ponto de não ter mais banda… E o Cléber ficou com aquilo na cabeça porque o cara falou isso só pra ele. Isso foi ali na madrugada de um domingo, eles teriam show na outra sexta—feira… Um show perto de casa, suave, 20 minutinhos já estava no lugar onde eles iam tocar, um lugar que geralmente eles tocavam de sexta—feira… Na sexta—feira todo mundo fazendo suas coisas, tinha gente que trabalhava, que não vivia só da banda também — o hold, por exemplo, não vivia só da banda, então ele estava trabalhando e tal — quando, de repente, o telefone da galera começou a tocar e era a família do Ronaldo. O Ronaldo foi dormir na quinta—feira e não acordou na sexta—feira, Ronaldo morreu dormindo. — O vocalista da banda… O cara que organizava tudo, além de ser o vocalista, organizava tudo e tal, cuidava da agenda, enfim, a alma da banda morreu. —
E aí, aquele desespero, como é que faz, não sei o que… E eles sempre brincavam que quando um morresse, eles iam querer fazer um show no velório. — Um show de rock no velório. — Não foi um show, porque a família do Ronaldo, enfim, né? Mas eles cantaram no velório ali uma das músicas preferidas do Ronaldo e uma hora que eles olharam para aquela multidão, porque foi muita gente no velório e no enterro do Ronaldo, eles viram aquele cara. O Ronaldo foi enterrado no cemitério da cidade da família dele, então era umas duas horas ali de onde todo mundo morava, né? E eles foram com a van… — Já uma nova van, mas do Joel, do motorista de sempre, todo mundo chorando, todo mundo mal, né? — E aí aconteceu o enterro e eles saíram de lá e, quando eles pegaram a estrada de novo, passando muito rápido, eles estavam na pista do meio, eles viram no acostamento este cara, todo de preto com esse macacão estranho, o cabelo branco, a barba escura e lá…
O Cléber acha que este cara é a morte e que ele veio avisar sobre o Ronaldo. Talvez fosse para o Ronaldo morrer na van, né? Mas todo mundo tava de cinto. Por que todo mundo estava de cinto? O Joel dormia na van e ele estava dormindo e ele sonhou com o avô dele, que morreu quando ele era pequeno, ele nem lembrava da cara do avô e foi o avô dele que pediu para que ele e todas as pessoas que ele fosse transportar usassem cinto. Inclusive, ele fez uma coisa que ele nunca fazia: Eles colocavam os equipamentos todos na parte de trás — quem colocava era o hold e o hold prendia ali, mas, assim, prendia — quando o hold foi trazendo as coisas, o Joel foi amarrando os equipamentos, ele amarrou… Talvez no capotamento eles pudessem ter sido machucados mais por um equipamento que batesse neles que tivesse solto, entendeu? Estava tudo preso. — Então, ao mesmo tempo que o Joel teve um aviso do avô de que era para todo mundo usar cinto… E, a partir daí, o Joel nunca mais deixou alguém entrar na van dele seja, sei lá, grupo de empresários, família que você leva para festa, evento, essas coisas, banda de rock, o que fosse, andar sem cinto… Todo mundo com cinto e todos os pertences presos lá no bagageiro, sabe? A partir desse dia do aviso do avô também isso mudou no Joel. —
A banda Pôneis terminou ali com a morte realmente do Ronaldo e essa morte foi avisada para o Cléber no dia do acidente da van. O Cléber acha que este cara era a morte e ele ficou olhando para eles no acostamento enquanto eles voltavam do sepultamento do Ronaldo. — Quem é esse cara, gente? E essa corda? O que me intrigou demais foi essa corda… — O Cléber falou: “Andréia, não tinha como a gente sair de lá sem corda e a gente botava o peso… E todo mundo bem pesadinho, cabeludo pesadinho, e a gente botava muito nosso peso naquela corda e chegava num determinado ponto que já dava pra gente subir sozinho, não tinha mais corda. Não tinha mais corda… E não é uma coisa que uma pessoa passou, né? Todo mundo que estava ali naquela van passou por isso”. Então, o que, uma alucinação coletiva? O que foi isso? Quem é esse cara que foi ajudar eles? Se era a morte mesmo, por que a morte ajudou eles a sair daquele buraco? Por que que a morte ali naquele capotamento, mesmo o Ronaldo de cinto, não levou o Ronaldo ali? Ronaldo tinha mais uns dias? Quem bateu na van?
Alguém bateu na van? Porque uns acham que realmente tinha um carro, outros acham que não, que a van deu um tranco. O Joel, por exemplo, que estava dirigindo, falou: “Galera, se eu tivesse visto um caminhão, um ônibus na nossa traseira dando luz, alguma coisa, eu saía… Eu ia para lateral para o cara passar. Não tinha nada atrás da gente. Não tinha nada atrás da gente”. Então você vê, né? Num carro com sete pessoas praticamente cada um tinha uma versão assim do que aconteceu, mas todos são unânimes em dizer que a corda desaparecia em certo ponto daquela subida, quando eles já conseguiam segurar nos matos e subir sozinhos. O que vocês acham?
[trilha]Assinante 1: Oi, nãoinviabilizers, aqui é a Catarina de São Carlos. Por que que o Ronaldo tava tão cabisbaixo, quieto nesse dia? Eu fico pensando se, igual o Joel, o motorista, se ele não teve algum tipo de premonição ou sonho também que ele sabia que talvez ia acontecer alguma coisa naquela noite, não sei se necessariamente o acidente e tal, e que ele foi tão bom no show assim, se ele tinha algum sentimento de que talvez pudesse, não sei ,ser a última vez… E também, a corda, por que como que você, mesmo se você tá em choque do acidente, como que você consegue alucinar o seu peso sendo puxado por uma corda, assim, você colocando o seu peso numa corda e ela não tá lá? Você olhar e ela acabar antes e depois de você? Isso me deixou maluca. É isso, um beijo, gente.
Assinante 2: Oi, nãoinviabilizers, aqui é a Marcela e eu falo de Brasília. Sinto muito, Cléber, por você ter passado por essa experiência aterradora. Ainda mais que seu colega de banda faleceu uns dias depois. Acredito que estamos todo o tempo cercado de espíritos, de vibrações diferentes, e sim recebemos visitas de espíritos bons, espíritos ruins o tempo todo… Queria aproveitar para deixar uma utilidade pública, né? Sempre que a gente se acidenta, a gente tem que passar no hospital, fazer um check-up, porque pode ter uma hemorragia interna, alguma lesão que não é visível externamente. Claro que ninguém quer passar por acidente, mas quando acontecer, tem que dar aquela passadinha no hospital sim e verificar se tá tudo ok. Um beijo.
[trilha]Déia Freitas: Essa é a história do Cléber, comentem lá no nosso grupo do Telegram. — Eles alucinaram? Imaginaram essa corda e, sei lá, na adrenalina ali conseguiram subir? Fica aí o questionamento. — Deus me livre encontrar a morte desse jeito. Então é isso, gente, um beijo e eu volto em breve.
[vinheta] Quer sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]