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título: quarto andar
data de publicação: 05/10/2020
quadro: picolé de limão
hashtag: #quarto
personagens: miriam e cibele

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta] 

Déia Freitas: Oi, gente… A história hoje é da Miriam e da Cibele, quem me escreve é a Miriam.

[trilha]

A Miriam e a Cibele moram no mesmo prédio, elas sempre foram amigas, mas amigas assim, no nível vizinha. Então elas moram há muitos anos no mesmo prédio e elas assim, eram cordiais uma com a outra, as duas faziam academia no prédio juntas, então elas às vezes marcavam de malhar juntas. E a mina era casada, se divorciou tem quatro anos e meio e mora sozinha lá no apartamento, não teve filhos e o apartamento ficou pra ela. Eles tinham um outro apartamento em outro lugar, o outro apartamento ficou pro ex-marido, tudo certo.

E elas faziam academia juntas, mas não passava disso assim, elas não tinham nem amizade a ponto de uma ir na casa da outra no mesmo prédio, não tinham. Então, às vezes “Ah, você vai descer pra malhar hoje?”, “vou”, “também vou”, e aí malhavam juntas e tal. Às vezes, lá na frente do prédio tinha feira, então às vezes elas se encontravam na feira também. Assim, coisa tudo muito simples, né? E aí, gente, quarentena chegou e o prédio tem muitos idosos, então eles criaram várias regras, inclusive a regra do elevador, o elevador não pode mais ser compartilhado e os idosos têm prioridade. — O que está corretíssimo. — Então, se você é mais jovem, você sobe de escada ou você espera até que não tenha nenhum idoso no elevador e tá todo mundo cumprindo, todo mundo aceitou, tudo certo. 

Os próprios moradores que higienizam o elevador, tem um sprayzinho lá do lado, enfim, regras. E elas são vizinhas não de apartamento assim um do lado do outro, só do prédio, mas uma mora no quarto andar e outra mora no sexto. Elas se encontraram lá embaixo, que as duas vinham do mercado, mas não foram juntas ao mercado, se encontraram no prédio. Aí o elevador estava meio concorrido lá, pra não criar muvuca lá embaixo, começaram a subir, e a Miriam mora no sexto, a Cibele mora no quarto andar. Começaram a subir de escada as duas juntas — E aquela coisa, né? Por mais que você faça uma academiazinha, subir escada com compra é puxadinho, né? — E a Miriam lá meio esbaforida, meio cansada de subir e tal chegou no quarto andar, quarto andar é o andar da Cibele. 

Ela encostou na parede assim e falou: “Ai, eu tenho mais dois ainda”, e assim pensando, né? E dando risada. Menina, [risos] no que ela encostou na parede, ela só sentiu a beijoca. [risos] Cibele tascou-lhe uma beijoca. Primeiro que furou quarentena, né? Porque beijo de língua, gente, passa vírus. — Coronavírus vai no beijo de língua, saliva pura. — E aí a Cibele ficou chocada porque, assim, de onde veio isso? E aí meio que ali no meio chocada, não chocada, meio que deu uma retribuída, [risos] falei: “Aí Cibele, você gostou?”, ela falou: “Olha, não vou mentir, [riso] eu meio que dei uma retribuída na beijoca”. [risos] 

E aí a Cibele já ficou olhando pra cara dela assim, abriu a porta e falou: “Ai, você não quer entrar?” E a Cibele assustou. — Eu acho, eu não sei se eu falei o nome certo, falei o nome certo? É Cibele. — A Miriam assustou, e a Miriam falou: “Não, não, não, não, não, não”, e já pegou as compras e subiu pra casa, pro sexto andar, mais dois lances de escada que ela não sabe nem como chegou. E aí agora a Miriam tá nessa, trocou uma beijoca com a Cibele, então assim, a quarentena meio que já foi pro saco, né? Já começou dia um novamente, [riso] porque vai saber se a Cibele está com coronavírus. E, detalhe: Miriam sempre foi hétero e agora ela tá ai se questionando se, de repente, ela tem aí alguma coisa, se ela sente alguma coisa pela Cibele, né? Um lance bi, porque ela continua diz ela “atraída por homens também”. 

Mas, e aí, assim? Ela não sabe fazer. E falou que a Cibele foi lá no sexto andar bater na porta dela, aí falou pela porta: “Ai, eu sei que a gente está em quarentena, não vou chegar perto de você, só queria pedir desculpa, mas se você quiser descer, tomar um vinho, agora que a gente já ultrapassou aí uma barreira. [risos] Eu tô lá sozinha, você tá aqui sozinha, se você quiser…” E assim, o vinho, se ela descer pra tomar o vinho já sabe, né? Não é só o vinho. E aí ela tá muito na dúvida, tá muito a fim de descer, mas também não sabe o que tá sentindo, se de repente isso é só mesmo a solidão da quarentena e ela não quer machucar a Cibele, né? Não quer que a Cibele crie uma expectativa. E ela também não tá sabendo lidar com esses sentimentos dela, novos, por uma mulher que ela nunca sentiu nada, por nenhuma mulher… E aí agora teve essa beijoca. [risos]

Então ela tá nessa, e aí gente? Ela desce ou não desce? E eu falei com ela hoje, domingo, ela não foi, não desceu. Teve o final de semana todo pra ir, mas é aquela coisa, quarentena: todo dia é dia, [risos] não tem mais essa, todo dia é dia, se ela não descer hoje, ela pode descer amanhã. Mas e aí, ela desce? Eu falei: “Olha, se você descer e rolar, você, por favor, me escreva que é mais uma historinha pra nós”. [risos] — Se eu contar aqui vai dar uma animada. —[risos] Mas ela tá na dúvida, porque ela não sabe se isso, de repente, é uma carência só de quarentena, se ela vai viver isso com a Cibele ou não, ou se é uma coisa que vem coisa boa por aí, sabe? Assim, tá surgindo e ela vai viver isso?

Eu não sei, gente, o que me preocupa mais é o coronavírus nessa hora, né? Porque estão isoladas mesmo, vão ficar isoladas juntas? É bom que estão no prédio, né? São só dois lances de escada. Mas não sei, se assim depois vai que ela desce também e se apaixona, ou a outra se apaixona e aí não é isso… Ou vamos viver isso aí na quarentena, meu, coronavírus está aí, daqui a pouco morre todo mundo e ninguém sabe mais nada. O que vocês acham? O que a Miriam faz? Miriam vai e desce até o quarto andar e vai tomar um vinhozinho com Cibele e seja o que Deus quiser? Ou fica na dela? Porque ela falou, de repente, espera passar quarentena que é lá pra setembro, [risos] e aí pode ver se realmente ela tem algum interesse de fato na Cibele, se não é só uma carência, não sei, gente, o que vocês acham? 

Eu sou muito preocupada com o coronavírus, eu tô fazendo tudo certinho que é pra não morrer. Então, eu fico com medo disso, de morrer, das duas se colocarem em perigo, sei lá, de repente ela vai e a Cibele além de ir no mercado já foi agora em outro lugar, já pegou corona, vai saber, então não sei. O que vocês acham? Mandem aí os recados de vocês pra nossa amiga Miriam. Então um beijo e até amanhã.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.