título: bruxo
data de publicação: 18/01/2021
quadro: picolé de limão
hashtag: #bruxo
personagens: sandro e vinícius
TRANSCRIÇÃO
Déia Freitas: Oi, gente… Que saudade. Voltei, para contar mais uma história para vocês. Então hoje eu vou uma que não tem nada a ver com relacionamento amoroso, mas um relacionamento aí entre colegas.
[trilha]O Sandro ele alugou um apartamento e morava nesse apartamento já há uns quatro anos, e o negócio começou a apertar. O aluguel subiu e ele não estava dando conta de pagar mais, ele tinha dois quartos no apartamento e ele falou: “Bom, eu vou alugar um quarto, vou dividir aí as despesas que me dá uma folga no orçamento e também eu tenho uma companhia aqui para conversar de vez em quando e tal”. Aí ele colocou um anúncio nesses aplicativos de locação de imóveis, não foi por imobiliárias. — Acho que na imobiliária nem tem, né? Porque ele estava alugando uma vaga. — E apareceu ali meia dúzia de candidatos, acabou não dando certo. Tinha esse detalhe: ele queria que fosse um cara, para ele continuar com a privacidade dele. — De repente quer anda ali de cueca até a sala, não precisa ficar preocupado porque tem uma moça ali dentro do apartamento. Então ele queria que fosse um cara. —
Daí apareceu um cara que ali, trocando mensagem, ele achou que tava ok, que ia dar certo e chamou o cara pra conversar, para conhecer o apartamento, pra ver se o cara gostava do apartamento. Aí marcaram e o cara foi lá. O cara chegou lá no apartamento, — o nome do cara é Vinícius. — O Sandro achou o Vinicius um pouco estranho, o Sandro puxando assunto, falando ali do apartamento, como era a vizinhança e o que tinha que pagar de despesa para dividir… — Falando do que tinha pra falar, né? — E esse Vinicius super calado. Respondi que sim, que não, muito vago assim… — Pra mim isso já é um indício de que não ia dar certo, sei lá, mas o Sandro achou ok. — Aí eles conversaram mais um pouco, o Sandro perguntou o que ele fazia, ele já tinha falado ali por mensagem que trabalhava com desenho, aí o Sandro perguntou mais detalhes e tal, meio que pra ver se ele tinha um emprego mesmo que daria para pagar a estadia dele ali, o aluguel mensal.
E eles foram conversando e acertando detalhes, aí uma hora lá surgiu um assunto e ele acabou falando pro Sandro que ele era um bruxo templário. [risos] Eu nem sei o que é isso, se é uma seita, uma religião, sei lá… O cara era um bruxo templário…. — Isso pra mim não seria uma nota de corte, vai, eu não dispensaria o cara pelo cara ser um bruxo, mas por ele ter ficado muito calado, muito esquisito, eu já acho estranho. — Mas o Sandro achou ok, eles combinaram, o Sandro tinha pedido dois meses adiantado e o cara ficou de fazer a transferência ali no meio da semana e mudar. E assim foi feito.
No meio da semana o cara fez a transferência, realmente, e na sexta feira, ele começou a levar as coisas dele para o quarto, que tinha só uma cama, um guarda e… — Tipo uma escrivaninha. — O cara levou as coisas dele e tal, tinha muita coisa assim, como o Sandro disse, meio gótica. — [risos] Deve ser roupa preta, essas coisas… E tudo bem também, pro o Sandro tudo ok. — Aí o cara mudou, isso na sexta-feira, no sábado a chave já estava com ele, o cara já estava com a chave. E aí o Sandro saiu, foi ver a namorada dele, foi fazer as coisas dele. E quando ele voltou… [risos] Isso já no primeiro dia que eles estavam morando juntos… Pensa em um apartamento de cara solteiro, assim, não tem decoração, não tem nada. Tem lá o sofá, televisão, as coisas que precisam ter, não tem um quadro na parede… Pelo menos o Sandro não tinha nada…
Quando ele voltou, tinha um pano, um tecido enorme na parede da sala com uma coruja que parecia meio malvada. [risos] E ele ficou chocado, porque o cara bateu uns pregos na parede sem perguntar se podia. — Porque tem apartamento que não pode, você alugou, sei lá. — E aquele tecido enorme, um tecido meio encardido já com aquela coruja mal encarada, estranha, olhando pra ele o tempo todo… Mas ele achou melhor não já implicar no primeiro dia. Então aí ele não falou nada da coruja, fingiu que não viu. [risos] — Eu não sei se isos é a melhor coisa a se fazer, né? Um tecido enorme na parede e você fingir que não viu e nem falar pro cara: “Ô, você pregou os negocios aí sem me avisar?” — Devia ter falado, mas o Sandro não falou.
E assim, a semana foi passando, ele notou que o Vinicius não gostava mesmo de conversar, era um cara mesmo mais calado. Então eles se falavam bom dia, boa tarde e boa noite e antes de ter um colega de apartamento, o Sandro que gosta muito de ver TV e só tinha uma TV no apartamento, colocou a TV que estava na sala no quarto dele, porque ele falou: “bom, se a pessoa vier e ela tiver a TV dela, ela põe no quarto dela e a sala fica aí para uma leitura, para receber a visita”. Aí um dia ele chegou e ouviu um barulho da TV dele, quando ela entrou no quarto dele, o Vinicius estava lá sentado assistindo TV [risos] no quarto dele. E aí a única coisa que ele conseguiu falar foi: “ô, Vinicius, você tá aqui…” — O Sandro falando pra mim: “Andréia, a cena era: o Vinicius com uma cara de morto vivo, assim muito sério e meio desanimado, olhando para uma TV que estava passando um desenho animado muito feliz.” Não fazia sentido a cena na cabeça dele. Isso tudo dentro do quarto do Sandro. —
Ele ficou tão sem palavras que ele falou pro Vinicius: “ah, Vinícius eu vou colocar a TV lá na sala.”[risos] — Quer dizer, já acabou, estragou o esquema dele. — Ele falou: “não, vou pôr fiquei essa TV na sala, já pensou eu chego e esse cara tá no meu quarto?” — Sendo que ele devia ter falado, né? “Não quero você no meu quarto”. Só que o Sandro falou que ele parecia meio assustador. Agora que já estava uma semana lá, ele estava mais estranho. Aí agora com a TV na sala de novo, às vezes o Sandro estava assistindo à noite ali, pegava no sono e acordava de madrugada, dormia assistindo TV e ia para o quarto…
Aí um dia ele tava lá, pegou no sono assistindo TV e, quando ele acordou, [risos] ele percebeu uma sombra assim meio que atrás dele, atrás do sofá em pé. Era o Vinicius, o Vinícius tava em pé. E ele não sabe se o Vinicius estava olhando para a TV, porque aí ele acordou e o Vinicius saiu ou se ele tava ali olhando o Sandro dormir. Então a coisa começou a ficar meio complicada, ele passou a ter medo de, de repente, o Vinicius matar ele. [risos] — Eu tô rindo porque vocês já sabem que não aconteceu nada de grave, né? Porque senão eu não ia rir. Mas ele passou perrengue porque ele achava que, sei lá, de repente ele podia estar lá deitado no sofá e o cara dar uma facada no peito dele. — Então o que o Sandro pensou? “Bom, eu tenho os dois meses de depósito do cara, eu acho que eu vou falar pra ele que eu vou precisar do outro quarto, que o meu irmão vai vir morar comigo, e aí ele fica mais esses dois meses e eu mando esse cara embora. Eu já tô começando a ficar paranoico já”. — Com medo de ser assassinado pelo Vinicius. —
Só que nesse tempinho que ele ficou pensando como que ele falaria pro Vinicius que não ia rolar mais, ele teve que fazer uma viagem pela firma, e era uma viagem perto assim, tipo, estava em São Paulo e ia para Minas ficar quatro dias. Era máximo quatro dias. Então, era uma viagem curta, ele falou: “bom, na volta eu converso com ele e eu falo”. O Sandro viajou e, quando ele voltou, a surpresa… — Vocês adivinham? Será? Acho que não. [risos] Várias coisas. — Um: Vinicius tinha pintado as paredes da sala de cinza escuro. — Sim… [risos] — Do nada, sei lá o que deu na cabeça aí desse cara ele pintou a sala, sem pedir autorização… Do mesmo jeito que ele pôs lá o pano com a coruja, ele pintou a sala. O Sandro chegou, a sala estava preta escura, com aquela coruja já de volta na parede. — Então, quer dizer, ele deve ter pintado no primeiro dia. — E ele atônito, ele ficou bravo mesmo e falou: “cara, o que você fez? Não podia pintar sem autorização do proprietário, que isso, que aquilo”.
E aí o Vinicius falou: “mas eu não moro aqui também? Aqui também não é minha casa?” E aí eles tiveram uma breve discussão e, enquanto eles estão discutindo, saí lá do quarto do Vinícius uma senhora de uns cinquenta e poucos anos e fala assim: “não, meninos, não briguem. Meninos, não briguem” [risos] Aí o Sandro ficou olhando e falou: “eita, será que é a mãe dele?” e não perguntou nada porque ele tava puto também e foi para o quarto dele pensando já que, puts, ele ia ter que gastar dinheiro para repintar a sala quando fosse entregar o apartamento, porque ele tava meio sem grana, “vai ficar dessa cor mesmo, vai ficar a sala preta”. Isso que ele chegou já era tipo uma sete da noite, e aí ele foi para o quarto dele aborrecido e falou: “não saio mais desse quarto hoje”.
Só que lá pelas onze e meia da noite começou a dar uma fominha nele. Ele chegou, não comeu nada, foi direto para o quarto e falou: “bom, vou comer alguma coisa, vou ter que passar por aquela sala preta” e ele estava com ódio. Quando ele sai do quarto, ele disse que a cena era assustadora… Um monte de vela no chão da sala, tipo um círculo assim e, no meio das velas, o Vinicius transando com aquela senhora que ele jurava que era a mãe do Vinicius. [risos] Na hora ele voltou para o quarto, ele falou: “Não, eu acho que eu tô alucinando”, aí ele abriu de novo a porta e os dois estavam lá com umas velas em volta e transando. Ele não sabe se era um ritual ou se era romântico. — Eu perguntei para ele: “que tipo de vela?” Ele falou eram uma vela gordinhas, pequenas…” e eu falei: “ah, então devia ser um clima romântico, tipo, sei lá, um coraçãozinho de vela no chão e você transa no meio”. Eu teria medo de queimar o cabelo, pegar fogo no meu cabelo. [risos] Mas aí cada um cada um, né? —
E ele falou: “pronto, pra mim já chega, pra mim esse cara vai ter que sair daqui amanhã”. Aí o Sandro dormiu aborrecidíssimo e na manhã seguinte ele chamou o Vinicius lá na sala e falou mesmo: “Olha, você vai ter que sair daqui, não está dando certo, que isso, que aquilo”. E aí o Vinicius aumentou um pouco a voz, aí veio a senhora, que a senhora estava dormindo lá no quarto. Só que a mulher ela começou a falar numa língua estranha assim olhando pro Sandro e falando numa língua estranha… Pronto… — O Sandro falou que dava a impressão que a mulher estava amaldiçoando ele. Ele falou: “ai, meu deus, eu já não estou conseguindo pagar aluguel, a maldição.” [risos] Ele falou: “Déia, parece coisa de doido, mas não, a mulher começou a falar em uma língua estranha e olhando pra mim com ódio”. — E aí ficou acertado que o Vinicius ficaria ali mais uns dois três dias até tirar as coisas e ir embora e ele devolveria o dinheiro do depósito… O único jeito que ele conseguiu acordo, sem descontar o valor pra repintar a sala ali, ele ia ter que ficar com a sala preta.
Passou o prazo que ele tinha dado pro Vinicius, o Vinicius saiu, levou as coisas dele, não levou nada a mais do apartamento. Só ficou ali de lembrança as paredes pretas e o quarto dele também tinham umas coisas escritas na parede lá que ele não conseguia entender, mas ele falou “isso eu passo um sabão e acho que sai, né?” E passou, ele falou: “nossa, que alivio, que alivio. Vou botar anuncio de novo, mas, nosso, vou dar um mês, pelo menos, pra colocar porque eu tô traumatizado, que isso, que aquilo”. Uns dez dias depois que o Vinicius saiu, a namorada dele, que era uma namorada já de uns dois anos terminou com ele, falou que não gostava mais dele, que não estava mais dando certo, que não queria mais ficar com ele e terminou com ele. Ele não tinha se ligado ainda que podia ser a maldição, ele não estava pensando nisso…
Ai depois de mais uns três dias, ele foi demitido, e ele era PJ, então ele não tinha… — PJ é pessoa jurídica. — Ele não tinha indenização, não tinha nada… Saiu com uma mão na frente e outra atrás. Aí ele lembrou da senhora lá que ficou falando lá em uma língua estranha e falou: “pronto, agora eu tô amaldiçoado”. E aí ele tinha que sair do apartamento, que não ia ter mais como pagar e ele tinha que pintar a sala… Ele não tinha dinheiro nem para comprar a tinta, teve que pedir para a mãe dele, teve que voltar a morar com a mãe dele… E ele falou que foi, assim, uns dois anos para conseguir se reerguer de novo. A namorada dele que ele gostava e tudo nunca mais quis falar com ele e ele jura que foi uma maldição. — Eu acho que foi coincidência. —
Então ele escreveu pra saber isso, o que vocês acham, se se foi uma maldição… Ele falou que agora as coisas estão começando a entrar eixo, que ele também não acreditava em nada dessas coisas, mas meio que passou a acreditar, né? Porque ele achou que aconteceu com ele… E se tem alguma coisa que ele possa fazer para melhorar [risos] mais rápido, porque ele falou que as coisas estão engrenando, mas ainda não estão tão boas. Aí eu acho que também é um reflexo do que a gente está passando no país agora, economicamente, sei lá. Eu não acredito nessas coisas vocês sabem, né? Então eu acho que foi uma coincidência mesmo, ele já devia tá certo pra ser mandado embora e a menina já não devia estar a fim dele, sei lá… Vai ver que ele viajou, ela conheceu outro… Vai saber, né? Pode ser mil coisas, mas ele acha que foi a maldição lá da namorada, que ele jura que acha que é a mãe, porque os dois eram um a cara do outro. [risos] — Mas aí se for a mãe complica, né? Os dois transando na sala, mas também não é problema meu. —
Então o que vocês acham? Vocês acham, como eu, que foi uma coincidência ou vocês concordam com o Sandro que foi uma maldição e se alguém tem uma dica pra ele aí do que ele possa fazer para melhorar. eu espero que as coisas melhorem aí pro Sandro e eu volto logo. [risos] Beijinhos.
[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]