Skip to main content

título: edifício andraus
data de publicação: 30/09/2022
quadro: luz acesa
hashtag: #andraus
personagens: nelson

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. E eu cheguei pra uma Luz Acesa. Hoje eu vou contar pra vocês a história do Nelson. — O Nelson era uma das pessoas que estavam em 24 de fevereiro de 1972 no Edifício Andraus, quando aconteceu o incêndio. — Então vamos lá, vamos de história.

[trilha]

— Esta história é uma história cheia de sinais… Eu acho que mistérios e sinais. De tudo que foi colocado ali pro seu Nelson que, na época, tinha uns 30 anos. Tudo o que foi colocado pra ele ali naquele dia desde a hora que ele acordou e ele não percebeu os sinais. — O Nelson trabalhava no décimo andar ali do Edifício Andraus. — Para quem não conhece, o Edifício Andraus é um edifício aqui do centro de São Paulo. Você pode jogar no Google aí “Edifício Andraus”, com o S no final e saber mais aí sobre o prédio, que eu vou contar específica a história do seu Nelson. —

O seu Nelson, em 1972, era um recém casado. Ele não tinha filhos ainda, né? A mulher do seu Nelson trabalhava como professora primária numa escola municipal ali também no centro de São Paulo. — E o seu Nelson trabalhava no Edifício Andraus, no décimo andar. — Ele, um advogado, trabalhando como auditor. E assim era a vida do seu Nelson… A rotina dele era acordar de manhã, tomar café, ficar um tempinho com a esposa e depois ir trabalhar. Naquela manhã, — de 24 de fevereiro de 1972 — o seu Nelson acordou [efeito sonoro de bip de relógio] como todas as manhãs… A esposa dele já tinha levantado, já tinha feito o café, ele levantou, foi até ela na cozinha… Só que quando ele entrou na cozinha, ele sentiu um cheiro muito forte de queimado, mas muito forte mesmo. E aí ele falou: “Nossa, amor, você queimou o café?”, ela falou: “Não, por que você tá falando isso? Não queimei nada”. Ele falou: “Nossa, mas tá um cheiro de queimado aqui”. E a esposa do seu Nelson, — que a gente pode chamar de Glória — a Glória falou pra ele: “Olha, eu não tô sentindo nada. Não senti cheiro nenhum”.

Ele falou: “Bom, estranho”… E sentou ali pra tomar o café dele. E ele sentou pra tomar o café ainda pensando assim, né? Só ali com os miolos dele… [efeito de voz fina] “Vai ver ela queimou a frigideira, não quer falar e nã nã nã”. Ele estava de cabeça baixa, ali tomando cafezinho dele…  — E de onde ele estava sentado, ele via o vitrô ali da cozinha, que dava pra fora, né? Pra área externa da casa. — Quando o seu Nelson levantou a cabeça, pelo vitrô — que era um vitrô de vidro liso — ele viu a figura de uma pessoa, mas era totalmente de fumaça… [efeito sonoro de tensão] — Não tinha corpo, mas era um formato de uma pessoa de fumaça. — E, assim, isso durou segundos e desapareceu. E aí seu Nelson falou: [efeito de voz fina] “Nossa, hoje eu tô, né? Tô que tô… Vendo coisa, cheirando coisa… Devo ter dormido mal, dormido pouco, enfim”… Ele não encarnou com isso. A Glória — professora, esposa do seu Nelson — ela saía primeiro pra trabalhar para dar aula. Então, ela foi lá e deu um beijo no seu Nelson. — É estranho eu chamar “seu Nelson”, né? Porque eu conversei com ele já idosinho, então, assim… Mas na época, Nelson… Então vou tentar falar “Nelson”. — 

Então ela foi lá, deu um beijo no Nelson, saiu, trancou a porta e foi trabalhar. Só que ela estava com a chave dela na bolsa, não percebeu e ela trancou a porta e levou a chave do Nelson. Então, ele ficou trancado dentro de casa… Depois que ele se arrumou e tal, pôs ali o terno dele, que ele trabalhava de terno, que ele viu que ele estava trancado para dentro de casa. — Olha quantos sinais, né? — Era pra ele não ir trabalhar. Mas o que o Nelson fez? Ele pulou a janela. Ele pulou a janela e falou: “Não, vou trabalhar sim”. — Só que tinha um detalhe… — O portão da casa deles era muito alto e o Nelson ficou com medo de pular e rasgar o terno. — Então, o que ele fez? — Ele chamou a vizinha, porque era um murinho muito baixo, explicou a situação e falou: “Posso pular? Sair por aqui”. A vizinha falou: “Lógico, claro… Pula aí”. E aí o Nelson só foi lá, com todo o cuidado, porque estava de terno e tal e pulou. 

Quando ele pulou, a vizinha olhou pra cara dele e tomou um susto… Falou: “Nossa, Nelson, parece que você limpou uma chaminé… Sua cara está preta de fuligem, assim…”, aquela fuligem… — Sabe quando, tipo, na churrasqueira? — E aí ele falou: “Que?”, ela falou: “É, lava o rosto ali no tanque, seu rosto tá preto de fuligem”. Só que a vizinha ficou olhando estranho pro Nelson… Por que o que aconteceu? Quando ele pediu pra pular, que ele estava do lado de lá do muro, o rosto dele não tinha fuligem. Depois que ele pulou o muro, que ele ia sair pra rua, pra ir trabalhar, o rosto dele coberto de fuligem. — Como pode? — E não tinha como ele ter se sujado, porque assim, ela ficou o tempo todo com ele ali enquanto ele pulava o muro, não tinha nem onde se sujar e sujar a cara de fuligem. Não tinha… E aí o Nelson foi trabalhar… Ele era auditor, então um trabalho que exige muita concentração e tal, ele tinha umas coisas muito sérias ali para resolver… 

E a manhã passou muito rápido. E, se teve algum detalhe, algum outro sinal que tentaram passar pra ele, ele não viu porque ele estava muito ali concentrado no trabalho. [efeito sonoro de bip de relógio] E aí deu hora do almoço, ele foi com os colegas almoçar num boteco que eles almoçavam ali no centro mesmo e mais um detalhe aconteceu… Quando o cara do bar entregou o prato dele, que ele começou a comer, ele percebeu que a parte de baixo do prato — tipo o arroz, o bife — estava tudo queimado, o feijão… Tudo queimado por baixo, não dava pra comer. E aí ele ficou sem entender porque parecia que tudo tinha sido queimado, assim, meio que individualmente, sabe? Não estava uma coisa dura inteira, estava todas as coisinhas queimadas. E aí ele já perdeu o apetite, devolveu o prato ali, nem cobraram e tal… E ele resolveu voltar pra empresa. Nelson voltou para o Edifício Andraus sozinho. Os colegas ficaram lá almoçando e ele voltou sozinho. [efeito sonoro de elevador se movimentando]  Entrou num dos elevadores — tinham mais pessoas ali, né? — e eles começaram a subir… 

Quando chegou no segundo andar, o elevador parou e ele teve que subir até o décimo andar, que era onde ele trabalhava de escada. [efeito sonoro de passos] E o Nelson fala que foi muito engraçado, porque assim, não é que o elevador parecia que estava quebrado, não… Chegou no segundo andar, ele abriu a porta e ele não subia e nem descia. E depois descobriram que o incêndio começou entre o segundo e o terceiro andar. Nelson continuou trabalhando ali, concentrado nas coisas que ele tinha que fazer e, quando foi exatamente 15h35, as luzes do Edifício Andraus se apagaram… 15h35 as luzes do Edifício Andraus se apagaram porque lá embaixo tinha começado o incêndio. Naquele momento em que as luzes se apagaram, o Nelson saiu ali da repartição para ver o que estava acontecendo e já do sexto andar pra baixo não se via mais nada, tamanha era a fumaça. E o Nelson sentiu aquele mesmo cheiro que ele sentiu quando ele acordou e entrou na cozinha da casa dele… Ele estava no décimo andar, do sexto pra baixo não se via nada de fumaça, a fumaça já começando a subir mais… 

E como eles viram que não dava pra descer, eles resolveram subir pra ir até o heliponto. Só que quem estava acima do Nélson, dos andares acima do Nelson, já tinham pensado nisso, né? Então, quando ele chegou a subir um tanto pra ir até o heliponto, ele não conseguiu entrar porque a porta estava fechada. E isso o Nelson nem tinha conseguido subir tudo ainda, né? Porque as pessoas estavam sendo pisoteadas. Ele estava no décimo andar e o Andraus tem 31 andares… E por que as pessoas não estavam conseguindo entrar mais no heliponto? Porque um dos chefes ali, de uma outra empresa qualquer, resolveu que era melhor trancar a porta, porque se as chamas subissem e tal, ou se o heliponto ali lotasse e caísse a laje do prédio… Então ele trancou a porta e não deixou mais que as pessoas entrassem no heliponto. O Nelson falou que as pessoas tentavam arrombar a porta porque a fumaça já estava intensa e ele achou que ali ele ia morrer mesmo. Pessoas que viram que ninguém estava conseguindo abrir a porta, resolveram descer novamente. Aí o Nelson falou: “Bom, é o único jeito, né? Se não dá pra subir, vamos tentar descer, sei lá”. 

Quando Nelson virou pra descer, ele viu o sogro dele, que já era falecido há um bom tempo… E o sogro dele fez que não com a cabeça e fez com a mão pra ele ficar onde ele estava. — E, gente, vocês podem procurar aí que vocês vão achar algumas notícias dizendo que o vento estava muito forte nesse dia e, por fatores científicos aí, assim, que eu não vou saber explicar agora, as labaredas desviaram de onde estava essa galera aí, de onde estava o Nelson. O Nelson fala que parecia mágica mesmo assim, que as chamas desviaram. — Como o espírito do sogro tinha mandado ele ficar no lugar, ele ficou. E, dali um tempinho, os bombeiros fizeram uma escada, uma ponte com escada de um prédio no outro, do Andraus para o prédio do lado e a maioria das pessoas saiu do edifício assim, por essa escada que virou uma ponte. O Nelson me disse na época que eu gravei essa história — que eu esqueci de dizer, é uma história lá do Twitter também — que o cara que trancou a porta lá e não deixou mais ninguém subir no heliponto, o cara morreu, assim, de maneira misteriosa. Ninguém sabia do que o cara tinha morrido.

Só que muita gente encontrava esse cara nas escadas ali do Andraus. Dizem que este cara — que trancou a porta e não deixou que as pessoas saíssem — ficou ali dentro do prédio. Então, se você subir hoje o Andraus pelas escadas, pode ser que você encontre ele. Esse cara ele gostava de fazer uma brincadeira, ele desenhava na parede com o dedo, assim, — sem ter caneta, nada — e falam que ele você pode ver ele fazendo isso ali pelas escadas do Andraus. Eu não acredito que o lugar seja mal assombrado, mas tem muito relato aí na internet. Foram 16 mortos, 11 deles no décimo primeiro andar. — Então pensa: Seu Nelson estava no décimo… — E essas pessoas estavam numa parte do décimo primeiro andar que a porta, uma porta de ferro estufou e ficou muito quente e eles não conseguiram sair. Então eles morreram ali carbonizados. — Foram 16 mortos e mais de 300 e tantos feridos. E vocês acham bastante relatos assim, eu posso passar, se vocês quiserem, algum relato que tenha mais dados do que realmente aconteceu, sem essa parte mística, né? Mas do incêndio mesmo, dos fatos. —

E é isso, essa é a história do seu Nelson, que teve vários avisos de que não era pra ele ir trabalhar. — E eu fiquei de postar… — Só que, durante o dia da, eu mandei uma mensagem pra filha do seu Nelson, né? Dizendo que já… Quando ele conversou comigo, ele já estava bem idosinho… E pra falar, né? Que eu ia contar a história no podcast e tal, e ela me mandou um áudio curto dizendo: “Ah, espera, eu queria falar com você”. Falei: “Bom, de repente ela vai me falar que não é para eu gravar”, enfim, e eu não soltei pra vocês… Mas ela só queria me informar que o seu Nelson tinha falecido. Já faz um tempo e tal. E aí fica então essa história aí a memória do seu Nelson que escapou, né? Foi uma das pessoas que conseguiu escapar aí do incêndio do Edifício Andraus. 

[trilha]

Assinante 1: Oi, Não Inviabilizers, aqui é a Thayná de Belo Horizonte. E eu tô chocada, assim… [risos] Desde o início do áudio eu comecei a me arrepiar e eu não parei mais. Eu acredito que a gente tenha guias espirituais, anjos da guarda, como quer que você queira chamar… São espíritos mesmo que nos guiam, que nos protegem e nos avisam de diferentes formas quando há algum perigo iminente, mas eu não acredito em predestinação, não acredito que as coisas são pra acontecer, estão escritas e elas vão acontecer e, assim, nossos guias só nos desviam desses perigos, dessas possíveis tragédias. Aí quando eu ouço relatos como os do seu Nelson, eu fico bugadassa, eu fico assim: “Gente, o que explica isso?”, sabe? Esse incêndio era pra acontecer? Essas pessoas que morreram tinham que morrer? Eu acho bizarro pensar nisso, eu acho um pouco cruel também com a memória das pessoas que faleceram, mas assim, tô boquiaberta… Ainda não absorvi direito a história do seu Nelson.

Assinante 2: Olá, Não Inviabilizers, aqui é a Paula de São Paulo, Capital. E eu acabei de ouvir a história do Edifício Andraus… E essa história me deixou bastante triste, né? Com tudo que aconteceu lá no Andraus… E também me deixou uma lição, pra que a gente nunca deixe de ouvir os sinais que estão acontecendo à nossa volta, nunca deixe de ouvir a nossa intuição. Porque, pra mim, é o nosso anjinho da guarda tentando nos alertar pra algo, tentando fazer com que a gente enxergue alguma coisa e, às vezes, a gente acha que não é nada, é besteira da nossa cabeça e a gente ignora. Então é isso… Seu Nelson não tá mais entre nós, mas eu deixo um grande beijo pra filha dele e um beijo pra todo mundo.

[trilha]   

Déia Freitas: Comentem lá no nosso grupo do Telegram. Se você não tá no nosso grupo ainda, entra lá, é só jogar na busca “Não Inviabilize”. Nós estamos no YouTube, nós estamos no Tik Tok… É só jogar na busca “Não Inviabilize” que nós aparecemos. [riso] Então é isso, gente, um beijo e eu volto em breve.

[vinheta] Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.