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título: grisalha
data de publicação: 23/11/2022
quadro: picolé de limão
hashtag: #grisalha
personagens: talita e um cara

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei pra mais um Picolé de Limão. — E hoje eu não tô sozinha, meu publi… — [efeito sonoro de crianças contentes] Quem tá aqui comigo hoje é a Pabllo e o seu mais novo lançamento “AMEIANOITE”, em parceria com a Gloria Groove, amo… Gente, o clipe tá uma produção de cinema, tá lindo… Foi lançado no halloween e tem, assim, uma super pegada de filme de terror, de bruxas e nã nã nã… — Eu amei. — Eu vou deixar o link para o clipe no Youtube aqui na descrição do episódio e a música tá disponível em todas as plataformas digitais. — Pablloooo, te amo. — E hoje eu vou contar pra vocês a história da Talita. Então vamos lá, vamos de história.


[trilha]


Quando a Talita tinha ali pelos seus 28 anos — assim, quase 29 — a Talita conheceu o amor da vida dela. Um cara maravilhoso, um cara gentil, um cara companheiro… E eles começaram a namorar e, em um ano — antes da Talita completar aí os seus 30 anos — eles se casaram. [efeito sonoro de sino tocando] Um casamento lindo, as famílias unidas, muito amor envolvido… Foi tudo maravilhoso. E eles começaram ali uma vida juntos. Ambos trabalhando ali em suas áreas, o casamento foi seguindo e eles decidiram que eles não teriam filhos — então foi ali de comum acordo, Talita nunca quis ter filho, o cara também não — e o relacionamento foi seguindo.


Quando eles estavam ali com cinco anos de relacionamento, — portanto, Talita com 35, jovem né, gente? 35 é jovem. — os primeiros cabelos brancos começaram a aparecer ali na Talita… E este homem ficou incomodado. Ele ficou incomodado e ele perguntou pra Talita se ela não ia pintar o cabelo. — Cobrir aqueles brancos. — A Talita disse que ia cobrir sim, que ela já tinha marcado até cabelereiro e tudo bem, o assunto passou. — E aqui cabe a gente fazer aí um parênteseszinho na história, pra falar que cada um encara seus cabelos brancos de um jeito. Por exemplo, eu, quando a minha mãe morreu, eu era adolescente e, na semana seguinte da morte dela, foi tão traumático para mim que eu fiquei com muito cabelo branco… Eu não sei se isso tem a ver ou não, ou se eu já ia geneticamente ficar com cabelos brancos aos 16 anos, mas eu fiquei… E aquilo me incomodou. E, a partir daí, eu passei a pintar o cabelo. Então, desde os 16 anos eu pinto o cabelo porque eu tenho bastante cabelo branco. Só que agora… Antes era assim, nossa, apareceu um branco, eu corria e pintava. Agora eu estou mais ok com isso. Então, assim, às vezes fica, sei lá, um centímetro e meio de raiz branca e a Janaína ficou aqui me falando: “Tá branca essa raiz, tá parecendo um gambá”, [risos] “tá parecendo o Pepé Le Pew”. [risos] E realmente eu não gosto dos meus cabelos brancos, porque meu cabelo é muito escuro, então fica um contraste, né? Mas assim, às vezes eu demoro pra pintar, fica, assim… Pra mim não fica legal. Mas, assim, eu relaxei quanto a isso, então eu pinto a hora que der pra pintar. Tem hora que eu estou com preguiça e não pinto, enfim… —

E a Talita ela estava numa vibe de pintar, tipo “não quero ter cabelo branco agora”, beleza… O tempo foi passando, chegamos a pandemia. — E você concorda que, se você está em casa ali, você e seu marido, você está se sentindo bem com aqueles seus cabelos brancos, você não precisa pintar toda hora, precisa? Não precisa. Não deveria precisar, né? — Só que esse cara ficava enchendo muito saco da Talita pra ela pintar o cabelo. Então, mesmo na pandemia, ela comprava online ali as tintas e pintava em casa só pra este cidadão parar de reclamar dos cabelos brancos dela. — Porque, enfim, ele reclamava… — Mas isso não era uma grande questão, isso não gerava uma briga, era apenas ele reclamando e ela que queria pintar também foi pintando.


No final do ano passado, assim, a Talita começou a entrar em contato com algumas coisas que ela viu na internet, alguns movimentos, algumas pessoas e começou a ver moças jovens de cabelo grisalho. — Grisalhas. — Que simplesmente ali, por uma questão do organismo, genética, enfim, estavam muito novas já de cabelo branco e tinham decidido parar de pintar o cabelo. — E aqui a gente volta falando: tem gente que gosta, tem gente que não gosta. Eu, no caso, não gosto, não quero ficar grisalha ainda, por isso que eu pinto. Mas tem muita gente que ama, é uma libertação, né? Você tem ali, você não precisa mais pintar o cabelo, enfim… — E a Talita foi gostando disso. E o cabelo da Talita tava assim, mais ou menos assim no ombro, sabe? E ela sempre usou assim, no ombro. Então ela começou a deixar a raiz branca. E aí esse marido… — Poxa, um marido seu de dez anos, gente… Sabe? — Começou a surtar.


“Não, porque esse cabelo… Olha, olha como tá, tá duas cores… Fica metade branco… Metade fica a parte de cima branca e o resto com cor”. E aí a Talita falou: “Bom, ele tem razão, tá estranho essa metade branca e essa metade com cor”. O que Talita fez? Talita saiu um dia, foi até um cabeleireiro e cortou o cabelo… Deixando o cabelo bem curtinho e grisalho. — E eu vi as fotos… Agora já está mais cumprido, né? Mas eu vi as fotos, gente, ficou muito bonitinha, muito moderna, sabe? Ficou bonita mesmo assim. Ela ficou uma jovem grisalha, parece que ficou até mais jovem e de cabelo curtinho assim, bem moderna. — E, quando ela chegou em casa… Esse homem surtou… [música de suspense] Ela já esperava que ele fosse reclamar? Esperava, mas foi o que a Talita falou pra mim: “Andréia, eu não consigo conceber que eu precise de autorização do meu marido, do meu irmão, do meu pai, de quem quer que seja, para cortar o meu próprio cabelo. Se eu quero cortar o meu cabelo, independente do que as pessoas vão achar de mim, eu tenho que ter o direito de cortar o meu cabelo”. E foi isso que ela fez.


Ela foi até o cabeleireiro, fez uma trança ali, cortou, doou o cabelo dela e ficou com o cabelo curtinho. — E, gente, cabelo cresce… Concorda? Cabelo cresce. Assim, não consigo pensar até essa história que eu recebi, né? Essa história da Talita… Que alguém pudesse surtar por causa de um corte de cabelo. E foi o que esse cara fez. — Ele ficou tão bravo, tão bravo, que ele saiu de casa. E a Talita falou: “Bom, deve ter ido dormir na casa dele”, porque ele nunca tinha saído de casa assim… [efeito sonoro de chamada telefônica] E aí a Talita começou a ligar, ele não respondia, só foi aparecer no dia seguinte. — E agora vocês estão sentados? — Essa criatura pediu o divórcio num casamento de dez anos porque a Talita cortou o cabelo e deixou o cabelo grisalho, que é o cabelo dela. E aí ele falou um monte, falou que não se sentia mais atraído por ela… — Mas, gente, toda a atração que ele sentia por ela estava no cabelo? Estava na aparência física dela? São dez anos de casamento. —


E a Talita não estava esperando por isso… Ela esperava, assim, que ele fosse reclamar sim, tipo, ah, os homens não gostam de mulheres de cabelo curto. — Sabe essas babaquices? — Ela achou que ele fosse reclamar, mas pedir o divórcio porque ela cortou o cabelo e deixou o cabelo grisalho? A Talita ficou tão chocada, tão desesperada que ela propôs pra este homem que ela usaria uma peruca até o cabelo dela crescer pra ele continuar com ela. — Vocês acreditam nisso? — E aí ele ficou mais ofendido, porque ele jamais… — “Jamais”, palavras dele. — ficaria com uma mulher de peruca. — Gente? Gente? — E a Talita falou que sempre foi um cara muito gentil, muito engajado em várias causas, muito bacanudo, sabe? E aí o cara fez isso. E ele sim, ele pediu o divórcio e ele foi até o final nessa ideia de divórcio por causa do cabelo da Talita. 


A Talita entrou numa depressão, ficou mal, precisou tomar medicação… Ficou, assim, no fundo do poço mesmo, porque ela não esperava. — Ela não esperava. — E esse cara irredutível… E até hoje ele tem raiva da Talita. Raiva… Porque ela cortou o cabelo e deixou grisalho. E aí, assim, você pode se perguntar: “mas, gente, devia ter mais coisa”. E, segundo a Talita, não, sempre foi um casamento bacana. A única questão que ele implicava era isso, dos fios brancos que apareciam e ela pintava — porque ela queria pintar — e tudo bem, porque o cabelo dela, ela faz o que ela quer. Se ela quer pintar, ela pinta, se ela quer deixar branco, ela deixa… Mas por ele e por ela, porque ela também queria pintar, ela pintava. E aí esse cara fez isso… A Talita não esperava, real assim, ela ficou muito mal e muito magoada, muito chocada com tudo. E agora é isso, ela tá seguindo a vida dela, ainda não conseguiu se recuperar totalmente… 


E o cabelo dela já está mais compridinho assim, mas tá grisalha… E tá muito bonita, assim, muito moderna e ela falou que ela vai continuar grisalha, não vai pintar, que ela está se sentindo bem em relação a isso. Só que ela ficou traumatizada, porque ela não esperava que o marido dela fosse pedir divórcio por causa do cabelo. Até o advogado da Talita ficou chocado com isso, assim, e fez questão de colocar isso lá, que tivesse essa anotação, de que ele estava terminando o casamento por conta da aparência física da Talita, especificamente por seu corte de cabelo e cor de cabelo. — Você já imaginou que em algum fórum aí desse Brasil tem esse processo? — E ele, assim, ele foi cruel, ele brigou por umas coisas que eles tinham conquistado juntos… Ele ainda quis, tipo, deixar Talita sem nada, sabe? — Raiva, raiva, raiva… O cara ficou com raiva. — E aí a Talita, assim, já tá fazendo terapia, né? Ainda toma medicação, mas não consegue entender. Vai ser uma questão aí que ela vai ter que trabalhar ainda por um bom tempo na terapia, pra tentar entender por que que esse cara, num casamento de dez anos, um casamento tão legal, fez isso com ela. 

[trilha]

Assinante 1: Oi, gente… Eu sou a Nina do Rio de Janeiro. E, olha só, Talita, eu sou grisalha como você há muitos anos, então, Déia, sobre seus cabelos grisalhos, eu não sei se pode ter sido ou não causa de estresse, mas eu também sou grisalha desde a adolescência. Na verdade, eu tenho uma mecha que nem aquela vampira do X—Men? Então, eu tenho essa mecha no cabelo e a vida inteira me falaram pra pintar o cabelo e eu falava: “Ah, por enquanto eu não quero”. Até que eu parei para pensar: por que eu sou errada em não pintar o cabelo se, na verdade, meu cabelo é assim? Não que seja errado quem queira pintar o cabelo, como disse a Déia, cada um faz o que quiser com o seu próprio cabelo. Mas por que eu sou errada em não querer pintar o meu e de gostar dele do jeito que ele é? Então vamos nos liberar. Sou grisalha, amo meu cabelo grisalho. Amiga, Talita, eu te admiro demais. Já doei meu cabelo assim como você, estou doando novamente… Vamos fazer alguém feliz? E o cabelo cresce. Terapia. Terapia é bom pra mim, pra você, pra todos nós… E o seu ex é um babaca, minha filha, que livramento… Free cabelos grisalhos. 

Assinante 2: Oi, galera do Não Inviabilize, Déia, eu sou Larissa e estou falando da Argentina. Sou cabeleireira de cabelos cacheados, ondulados e crespos e a coisa que eu mais escuto no meu salão meus são mulheres com medo da transição, porque os maridos conheceram elas de cabelo liso e elas têm medo deles não gostarem da aparência delas de cabelo natural, ou têm medo de passar pela transição, cortar curto e o marido não gostar da aparência delas de cabelo curto. Isso é muito, muito corriqueiro lá no salão… Então, assim, Talita, eu espero que você supere isso, sei que está doendo, foram dez anos, mas saiba que você não se resume a um cabelo. Você não é seu cabelo, mas o seu cabelo é parte de você e essa parte sua ele não soube amar. O problema estava nele e não em você, espero que você fique bem. Eu te deixo um abraço muito, muito, muito, muito forte. E você vai conseguir se amar e encontrar alguém também que te ama com o seu grisalho. 

[trilha] 

Déia Freitas: Ó, então vai lá assistir o clipe “AMEIANOITE” da Pabllo em parceria com a Gloria Groove, tá sensacional. O link está aqui na descrição do episódio. — E, gente, deixa eu contar uma coisa pra vocês… — Eu estava, assim, lá na minha, tranquila, [risos] fazendo nada… [efeito sonoro de notificação] De repente, eu recebo um vídeo da Pabllo… Ela mandou um vídeo dizendo que é ouvinte do podcast e falou até no vídeo “meu publi…”. [risos] — Eu quase morri de amor. — Eu botei em todas as minhas redes sociais, então procurem. Um beijo pra vocês. Um beijo, Pabllo, um beijo, Glória Groove. Eu volto em breve. 

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]

E pra quem ficou aqui depois da vinheta, uma coisa que a Talita ficou muito chocada é que, quando ela ofereceu a opção da peruca, esse cara falou a seguinte coisa pra ela, falou: “Você tá louca? Você de peruca vai ficar igual a uma paciente oncológica, você acha que eu casaria com uma paciente oncológica?”. Gente? E se a Talita ficasse doente? Esse cara ia deixar ela, ia abandonar ela do mesmo jeito, não ia? Olha essa fala… Que monstro. Bom, enfim, eu acho que esse é o verdadeiro eu desse cara, né? Ele é assim, sempre foi assim… Ele só mascarou as coisas porque em dez anos a Talita disse que nunca aconteceu, assim, uma situação de adversidade, doença ou algum perrengue, porque se tivesse acontecido, a gente ia ver esse cara abandonando o barco mais cedo. Eu acho que, no final, esse cabelo aí foi um livramento, né? Pra sair dessa relação com esse falso. Então é isso, gente, agora eu vou mesmo. Um beijo. Essa história me deixou muito aborrecida.

Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.