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título: andarilho
data de publicação: 12/12/2022
quadro: luz acesa
hashtag: #andarilho
personagens: roberto

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Hoje eu cheguei pra um Luz Acesa, hoje eu vou contar para vocês a história do Roberto. Então vamos lá, vamos de história.


[trilha]


O Roberto ele trabalha viajando, ele é representante comercial e ele trabalha viajando dentro do Estado de São Paulo. — Então, dentro do Estado ele vai para várias cidades e tal, atendendo aí a firma que que ele presta serviço. — Há mais ou menos uns quatro anos, ele estava voltando — de uma dessas visitas de venda que ele foi fazer em outra cidade — e ele resolveu parar pra abastecer, porque ele viu um posto ali com um preço de combustível melhor e ele falou: “Bom, vou parar aqui, vou encher o tanque”. [efeito sonoro de freio de mão de carro sendo puxado] E aí abasteceu e resolveu comer alguma coisinha ali no posto e, quando ele estava voltando — dessa mini lanchonete que tinha no posto para ir até o carro dele, que ele já tinha abastecido e estava estacionado — ele encontrou um rapaz… Era um rapaz que estava com as roupas sujas, rasgadas, tal, e o rapaz perguntou pra ele se o Roberto podia dar uma carona. — E o Roberto na hora ali ficou com medo, né? — Falou: “Poxa, será? Tô sozinho e tal” e começou a conversar com o rapaz. 


E o rapaz ele tinha um semblante, assim, de muito sofrimento, mas ele não olhava diretamente para o Roberto, ele ficava de cabeça baixa. E aí ele falou que ele há vários anos ele ficava perambulando pela estrada e que ele não conseguia ajuda, que ele queria muito uma ajuda pra sair dali e tal e o Roberto foi escutando esse cara e foi se sentindo tocado e falou: “Poxa, o que eu posso fazer por ele?”. E aí o Roberto falou: “Olha, pra onde você quer ir? Eu te levo, né? Se for no meu caminho e tal, né?”. E aí o rapaz falou pra ele assim: “Eu não sei pra onde eu quero ir, mas eu agradeço de você querer me levar”. E aí o Roberto falou: “Bom…”. Pensou, né? “O cara ele não sabe pra onde ele quer ir, eu não vou botar no meu carro, né? Pra onde ele vai?”. E aí o Roberto fez menção de botar a mão no bolso de trás, deu aquela viradinha para trás assim pra pegar um dinheiro para dar para o cara… E, quando ele virou pra frente de novo… [efeito sonoro de tensão] Esse cara tinha desaparecido e não tinha como desaparecer. 


Pensa: É um posto de gasolina, é tudo meio longe, assim, uma coisa da outra e o cara estava de frente para o Roberto e não tinha nada, assim… Por mais que ele virasse, — foi questão de um segundo — ele ia ver o cara andando pra algum lado, sabe? E o cara desapareceu. E aí o Roberto já ficou cismado… Como o cara desapareceu e igual fumaça? O Roberto não viu, não tinha como… Ele falou: “Bom, que coisa doida, né? Sei lá o que aconteceu”, mas resolveu não pensar muito nisso e entrou no carro dele [efeito sonoro de porta sendo batida e carro dando partida] e foi embora. Foi para casa… Chegou em casa, jantou ali com a esposa dele, né? — Roberto ainda não tem filhos. — E conversaram… E ele contou que ele encontrou esse andarilho, mas que o cara sumiu do nada. A esposa dele, que a gente pode chamar aqui de Beth, a Beth falou: “Nossa, que estranho, né? Como assim, do nada? Não tinha pra onde ir?”, ele falou: “Não, não tinha. Ele realmente desapareceu na minha frente, assim… Eu dei uma viradinha de um segundo pra pegar um dinheiro pra ele e ele sumiu”. 


O tempo foi passando, Roberto continuou trabalhando, fazendo as viagens dele, né? Só que agora o Roberto tinha reparado que ele estava cansado… Ele estava cansado… Por muitas vezes ele se sentia triste, do nada… — Ficava mal, sabe? — E o Roberto não conseguia entender de onde vinha isso, sabe? De onde que estava vindo essa tristeza, essa coisa ruim. Ele sentia uma coisa ruim assim… E ele continuando ali no trabalho e tal, chegava em casa, já não tinha vontade de falar com a esposa… E tinha hora que mesmo almoçando, ele sentia muita fome, assim, uma dor no estômago, mas ao mesmo tempo uma fome. E tinha hora aquele que estava calor e ele sentia muito frio… — E aí ele não tinha febre, nada, né? — E o tempo foi passando, assim, os meses passando e o Roberto se sentindo muito, muito, muito mal. 


Até que um dia, ele chegou numa firma que ele foi fazer representação, eram produtos que ele já tinha vendido, então ele tinha ido lá para fazer uma visita… — Ele fez a venda por telefone, né? Ele foi fazer uma visita cortesia, explicar, levar umas amostras e tal. — E, quando ele chegou lá, ele foi atendido e a moça falou: “Olha, o seu Fulano, que é o gerente, vai te atender e tal, o senhor pode esperar aqui”, e a moça, que era a moça ali da recepção, ficava encarando muito o Roberto. E o Roberto falou: “Puta merda… Será que já tá… Essa moça aqui está implicando comigo?”, porque ela não olhava, assim… Não era um olhar bom, sabe? E a moça ficou encarando ele demais. E aí o gerente chamou, ele foi lá, apresentou os produtos e tal, o gerente falou: “Você não quer dar uma volta aí pela firma? Dar uma olhada? Fica à vontade e tal”. — Porque o cara tinha uma reunião, então não podia ficar fazendo sala ali muito tempo. —


E aí o Roberto agradeceu, mas ele falou: “Não vou fazer um tour aqui pela empresa sozinho. Estranho e tal, né?”, e aí ele saiu, agradeceu a moça ali da recepção e foi saindo… — Tinha duas portarias pra ele passar pra ele chegar até o carro e ir embora. — Quando ele estava chegando no carro, a moça que estava olhando feio para ele na recepção, chamou pelo Roberto. E aí a moça falou assim pra ele: “Olha, você não me conhece, eu não te conheço, mas eu vou te falar uma coisa aqui que você pode acreditar ou não. Tem um rapaz agarrado nas suas costas”. E aí o Roberto, na hora, ele não estava nem entendendo esse papo… Ele até olhou para as costas, [risos] tipo: “que rapaz, né?”. E aí, essa moça, — que a gente pode chamar aqui de Lucimara — a Lucimara falou pra ele: “Olha, o senhor pode não acreditar em mim, mas eu estou vendo. Eu estou falando com você e tem um rapaz pendurado nas suas costas, te abraçando e ele está todo maltrapilho. Eu consigo sentir o cheiro dele e ele vai te prejudicar muito se ele continuar aí.”


E aí o Roberto não se atentou ao fato daquela conversa que teve com aquele andarilho que sumiu na frente dele. — E aí essa moça continuou falando… — Ela falou: “Olha, eu não sou espírita, não sou nada… Eu sou… Eu venho de uma família evangélica, mas também a religião não me coube ali, eu não frequento nenhuma religião, mas eu vejo as coisas… E eu posso falar para o senhor que tem alguém segurando o senhor e que isso vai piorar muito se não tirar esse homem das suas costas”. E aí o Roberto, mesmo sem entender, ele falou: “Mas e aí, o que eu faço então? Eu nem acredito nessas coisas, mas como é que eu vou tirar esse homem das minhas costas?”. E aí essa moça falou para ele assim: “Olha, procura qualquer religioso que você conhece da sua família, na sua família… Eu sei que tem alguém religioso que vai te ajudar”. E aí a moça virou as costas e foi embora.

E o Roberto voltou para casa e falou para a mulher dele, falou: “Beth, eu estive na Pôneis Metalúrgica e, saindo de lá, a moça que me atendeu, que era secretária do gerente lá disse que tem que eu estou com um encosto, que tem um rapaz segurando nas minhas costas e que ele cheira mal e que ele está maltrapilho e que ele precisa de ajuda… Mas ao mesmo tempo ele quer ficar comigo e vai acabar me prejudicando”. 


E aí a Beth lembrou do andarilho e falou: “Meu Deus, é o cara que conversou com você lá naquele posto de gasolina”. [efeito sonoro de tensão] E aí já deu um gelo no Roberto, e aí o Roberto acreditou… Alguma coisa ali fez com que ele acreditasse. — Ele realmente estava se sentindo muito mal e, além de fisicamente mal, muito triste e com pensamentos estranhos, enfim… — Quando ele falou para Beth, falou: “Olha, a minha avó ela era benzedeira, mas ela já morreu, né? Então eu não sei de ninguém da minha família que que possa me ajudar nisso”. E aí eles lembraram de uma tia do Roberto… — uma tia já idosa que, assim, é muito, muito, muito religiosa, muito fervorosa, assim, mas ninguém nunca teve essa conversa com ela de espírito, nada, né? — E aí a Beth ligou para essa tia do Roberto e eles marcaram uma visita, que seria uma visita, tipo, você visitando um familiar, né? 


Chegando na casa dessa tia, [efeito sonoro de campainha tocando] que a gente pode chamar de dona Mariazinha, chegando na casa de dona Mariazinha, assim que ela viu o Roberto, que ela foi abrir o portão, ela falou: “Filho, você não vai poder entrar, você está acompanhado”. E aí a Beth já entrou com ela, ela já pegou um uma bacia d’água e, com a bacia d’agua, ela foi lá para a calçada e começou a rezar. E o Roberto falou: “Meu Deus do céu, eu aqui parado na calçada” e enfim… E aí ela rezou, rezou, rezou com essa bacia e rezou, rezou, rezou… Tipo, ele falou que parecia uma eternidade, mas que com certeza uma hora mais ou menos foi que ele ficou ali. E aí depois ela falou: “Bom, agora você pode entrar”. E ela pegou aquela água da bacia e jogou pela guia, assim, pra ir pelo esgoto. E aí, depois que ela entrou, ela falou: “Uma pena, eu não consegui direcionar o rapaz pra alguém, para um caminho certo, né? Mas ele voltou, pelo menos para onde ele estava, que é que andando aí pelo mundo”. E aí o Roberto ficou com medo de sair da casa dele e o rapaz grudar de novo nele, né?  [efeito sonoro de tensão] Só que isso não aconteceu, ele voltou a se sentir bem novamente e tal…


E até hoje ele tem dúvidas dessa história, mas ele falou: “Andréia, não tinha como… Pessoas que não me conhecem e a minha própria tia, idosa, que não me via há muito tempo, todo mundo falar a mesma coisa, né?”. — Surreal, né? — Então, o Roberto ficou andando aí por meses com este rapaz pendurado nas costas dele. E a moça falou, falou: “Pra onde você vai você está arrastando esse rapaz com você e vai chegar uma hora que quem vai arrastar você, é ele. Então você tem que se livrar disso o quanto antes”. — E olha essa moça, gente… Ela ali, sei lá… Ela teve um chamado, que ela passou por cima de qualquer coisa do trampo ali e foi lá… Porque ela podia chegar no Roberto e falar isso e o Roberto, sei lá, xingar ela, voltar lá, falar com o gerente, sei lá, né? Ela arriscou ali para fazer o bem, né? Eu, hein… Deus me livre. — Ai, não quero nem comentar muito dessa história, porque eu fiquei impressionada… Porque é uma coisa, assim, você não percebe que tem alguém pendurado nas suas costas.

[trilha]

Assinante 1: Oi, Déia, oi, Não Inviabilizers, aqui quem fala é a Isabella de Belo Horizonte. E, Roberto, pelo amor de Deus, depois de ouvir sua história agora eu estou com medo de falar com qualquer pessoa da rua com medo de ser um encosto. [risos] Mas, assim, eu estou rindo porque deu tudo certo no final. Graças a Deus aí pela sua tia e pela outra moça da empresa, né? Que te avisou sobre isso e a sua tia que conseguiu aí dar um destino, mesmo que incerto pra esse rapaz… Mas é isso aí, galera, fica o alerta pra gente tomar cuidado. [risos] 

Assinante 2: Oi, Déia, oi, Não Inviabilizers, aqui é a Amanda de Macaé. E, gente, eu estou indignada com essa história, é aquela indignação que a Déia sempre compartilha aqui com a gente… Como é que você pode viver num mundo em que você não sabe se a pessoa está viva ou se a pessoa está morta? E eu fiquei apavorada porque, pelo que eu entendi, o fato do Roberto ter aceitado dar carona foi meio que uma permissão pro encosto subir nas costas dele. Então, assim, a pessoa não pode nem fazer uma gentileza… Eu estou espalhando essa história pra todo mundo, já avisei até o meu namorado, que é aquele tipo de pessoa que gosta de fazer amizade com todo mundo, de conversar com todo mundo, falei: “Não faça, porque pode ser um encosto, isso é sério”. [risos] Tô chocada, gente… 

[trilha]

Déia Freitas: É isso, gente, comentem lá no nosso grupo do Telegram. Sejam gentis com o Roberto. — Ainda bem que você livrou, hein, Roberto? [risos] Deus me livre… Eu hein… — Tá vendo? Agora você não pode conversar na rua que você não sabe se a pessoa vai agarrar nas suas costas, não vai agarrar nas suas costas… É complicado. — É complicado… — Enfim, é isso, gente, um beijo e eu volto em breve.

[vinheta] Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.