título: cospe água
data de publicação: 03/04/2025
quadro: luz acesa
hashtag: #cospe
personagens: jamile e dona januza
TRANSCRIÇÃO
[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei para um Luz Acesa. E hoje vou contar para vocês a história da Jamile. — Essa história se passa em 2001, quando Jamile tinha ali seus vinte e poucos anos e estava no finalzinho da faculdade. — Então vamos lá, vamos de história.
[trilha]A galera se formou e, em vez de fazer uma festa, participar de formatura, eles alugaram uma casa na praia. — Era uma turma de umas vintes pessoas e a maioria foi, mas não foram os 20. — Tinha pelo menos aí uns 14, 15 pessoas na casa e era uma casa realmente muito grande, mas eles tinham que revezar os quartos, alguns dormiam na sala, enfim, era festa e todo mundo estava muito animado, era final de ano, então eles aproveitaram para passar ali as festas na praia. Eles foram ali lá pelo dia 20 de dezembro para ficar na praia até 20 de janeiro, um mês assim, numa casa realmente muito boa, muito grande. — Uma mansãozinha, né? — Com piscina e tal, então se você não quisesse ir pra praia todo dia, você não ia, enfim, uma festa, bebida… Todo mundo pagou, todo mundo se ajudou, aí se tinha algum rateio a mais na hora todo mundo fazia na hora, tudo perfeito e a casa realmente muito boa. Jamile, como não era muito de muvuca, ela ia para praia cedo, as vezes alguém do grupo ia com ela, uma galerinha, às vezes ela ia sozinha, ela fazia a caminhada dela na praia e depois voltava ali em torno de dez horas, ela voltava para casa que era a hora que a galera ali estava acordando.
Nesse finalzinho de viagem, lá pelo dia 17, as praias lotadas… Umas 08h30, Jamile avistou de longe uma muvuca e era alguém se afogando… Jamile, muito curiosa, foi chegando perto ali… Ela foi até aquela beiradinha da água e viu quando eles tiraram um senhor meio calvo, cabelo branco assim, de bermuda e camiseta de dentro da água. Foram levando o senhor até a areia seca, colocaram ele no chão ali e começaram a tentar fazer esse senhor voltar. E aí, faz e faz e faz e nada… Esse senhor não voltava e a Jamile ficou olhando ali, tinha bastante, gente… Fez uma roda ali em volta mesmo umas pessoas falando pra galera afastar — o pessoal não afasta, fica olhando — e Jamile entre os curiosos ali ficou também olhando aquele senhor… Chegou num determinado ponto que alguém ali de alguma barraca trouxe um pedaço de lona e cobriu aquele senhor… Enquanto aqueles rapazes se revezavam ali na manobra de ressuscitação do cara, sei lá, de afogamento, não sei como falam o nome, mas para tentar trazer aquele senhor de volta, meio que torcendo baixinho.
Por que o que que ela esperava? Que aquele senhor em algum momento fosse virar de lado ali e cuspir a água, né? Quando colocaram aquela lona em cima dele, foi um impacto muito grande para a Jamile, porque ela realmente não achou que aquele senhor fosse falecer ali, mas eles passaram meia hora tentando e não conseguiram. Então ali era esperar o SAMU… Quem sabe o SAMU chegando conseguiria, mas muito difícil, né? A Jamile tomou aquele susto assim e começou a voltar pra ir pra casa, né? E quando ela chegou lá na casa, ela contou para todo mundo e ela estava tão impressionada que ela teve uma crise de choro. E aí algumas pessoas ficaram preocupados, trouxeram água para ela e aquele dia passou, ela não quis mais voltar pra praia naquele dia e ficou por ali, naquela casa, na beira da piscina… E quando deu umas 16h da tarde ela falou: “Ah, vou entrar, ler um livro ali e, sei lá, ver se eu esfrio a cabeça”, porque realmente ela estava pensando muito naquele senhor.
A Jamile entrou na casa, foi até um dos quartos onde estavam as coisas dela, ela já tinha revezado, tinha dormido na sala e agora ela estava num dos quartos, pegou o livro e desceu… Uma mansão, tinha, sei lá, umas três salas e aí lá do outro lado tinha a cozinha, enfim… Quando ela desceu, ela viu um sofá ali e “vou sentar aqui, vou dar uma lida”, o pessoal estava lá para fora, estava na praia, tinha uma outra pessoa circulando na casa, mas sabe aquele entra e sai? Você entra pra pegar alguma coisa e sai… Na casa ali sentado, sem fazer nada, só estava Jamile. Jamile sentou, abriu o livro e, de repente, ela ouviu um barulho e era um barulho como se fosse de alguém assim, sabe, engasgando? Um barulho de engasgo? Jamile, que estava olhando o livro, assim, sentada no sofá, levantou a cabeça… Quando Jamile levantou a cabeça, aquele senhor com a mesma roupa que ele estava na praia, estava em pé a uma distância dela de uns cinco, seis metros, chorando e saindo água pela boca dele.
E a Jamile na hora pensou: “Meu Deus, conseguiram salvar ele”, ela nem tinha essa dimensão, esse pensamento, de que aquele senhor que estava ali na frente dela não era um homem real… Por mais que fosse final da tarde, na cabeça dela conseguiram salvar… — Gente, não tinha nem nexo, né? O cara estava ali… — Ela largou o livro e correu na direção dele… Quando Jamile correu na direção desse senhor para falar: “Meu Deus, que bom”, que ela pôs a mão no braço dele, a mão da Jamile atravessou esse senhor, era como se não fosse nada, mais que fumaça… — Ela me deu a dimensão de um algodão doce, mas que ela pudesse enfiar a mão… Eu que já sou lúdica, já amei [risos] que me estragou um pouco a experiência, mas ela falou: “Era uma coisa meio densa, mas que minha mão atravessava e, conforme minha mão atravessou, eu estava muito perto dele… Eu vi que os olhos dele estavam totalmente brancos, sem a bolinha”, não sei como se chama essa bolinha… É íris a bolinha? Sem a bolinha, só a parte branca, e ele botava água pela boca e chorava, chorava e chorava… —
Jamile deu um pulo para trás e caiu sentada no chão, e aí esse senhor abaixou e foi meio que, assim, em cima dela, mas assim, não parecia que ele estava atacando, ele estava querendo falar com ela e aí a Jamile começou a gritar, outras pessoas apareceram ali e não tinha nada, não tinha ninguém e o tanto de água que ele botava pela boca, era pra ter água no chão, alguma coisa… Não tinha absolutamente nada. A Jamile contou o que ela tinha visto, o que tinha acontecido ali e muita gente falou: “Olha, você ficou impressionada, você ficou mal com essa história… Provavelmente você adormeceu com o livro ali e sonhou”. E eu achei uma explicação muito plausível, assim. Bom, chegou a noite e a galera ia fazer ali tipo um luau, mas na grama ali daquela casa… — Era praticamente uma despedida, porque dali dois dias todo mundo já ia embora. — E aí, Jamile, que nem gostava, ficou ali onde tava todo mundo, porque ela falou: “Se eu for dormir cedo, eu vou dormir sozinha, então eu vou ficar aqui” e ficou com a galera ali até de madrugada, e aí todo mundo foi entrando e ela foi entrando também quando ela viu que as duas meninas que iam dormir no mesmo quarto que ela, uma tava dormindo no colchão no chão e tinha uma beliche… — Um quarto bem pequeno mesmo. —
Ela deitou ali na cama, na beliche, a outra amiga em cima e Jamile rapidamente pegou no sono. Ela não sabe dizer quanto tempo que ela dormiu, mas Jamile sentiu uma mão no rosto dela, uma mão muito molhada e ela acordou… E o cabelo da Jamile e a parte do rosto que ela sentiu a mão, estavam molhados. Era suor? Era água do mar? Jamile jura que era água do mar. Para não gritar e assustar as amigas, ela abriu o olho naquele escuro e começou a secar o rosto com o lençol que ela estava, que estava muito calor também, né? E quando ela olhou ali no pé da cama dela, estava esse senhor em pé, chorando e com uma água saindo pela boca dele. Então aquele: “cospe água, cospe água” voltou na cabeça da Jamile porque era como se ele estivesse cuspindo água mesmo, tentando se livrar daquela água, só que agora ele estava chorando, mas ele já estava com uma cara para ela de raiva… Então, acho que ele estava tentando se comunicar e não conseguia e ele estava ficando frustrado, sei lá, com raiva.
A Jamile cobriu a cabeça com o lençol, mas ela escutava ele chorando e aquele barulho dele cuspindo água e, na cabeça da Jamile, a frase dela mesmo: “Cospe água, cospe água, cospe água”. Jamile não sabe bem que horas que ela acordou, mas tinha mais aquele dia e o próximo pra galera subir e a Jamile que ia subir de ônibus, foi até a rodoviária tentar trocar a passagem, conseguiu e foi embora… Ela tava umas duas horas da casa dela — de ônibus, da praia pra casa dela — e chegou em casa tremendo, com medo de encontrar esse senhor, enfim, de ter trazido o espírito junto, né? Ela falou pra mim: “Andréia, nem cochilei no ônibus, fiquei acordada”… No dia que a galera ia embora, um dos caras que estavam lá casa, amigos da Jamile, viu esse senhor, e aí viu ele no portão da casa… Era um portão grande, assim, e chegou perto porque achou que era, sei lá, uma pessoa em situação de rua e tal, né? E quando chegou perto viu que ele tava com os olhos só a parte branca e pondo água pela boca, assim… ——Só que agora ele não tava mais chorando, ele tava fazendo uma respiração forte assim, meio de bravo mesmo… — E aí o cara entrou correndo, achou que, sei lá, foi as drogas que ele tinha usado, enfim… — Mas a descrição era a mesma, a roupa, né? A bermuda que senhor e tal, cabelo branco, enfim… —
E ele ficou lá, não se sabe se ficou na casa, se ficou por ali na praia, mas sim, ele veio com a Jamile para aquela casa. — Porque, pensa, ela estava muito longe… Ela fazia uma caminhada enorme de manhã, então se ela andou das sete às oito até a outra ponta da praia e isso aconteceu voltando, este senhor foi com ela para aquela casa e estava preso por ali. — Então não se sabe se ficou na casa… Com o amigo não voltou, porque depois ela falou com o amigo, o amigo falou que não viu mais nada também na casa dele, nem nada… E a mãe da Jamile acha que ele deve ter ficado por ali, pela praia, por aquele entorno, até liberarem o corpo dele. — Isso a mãe da Jamile falando, gente… A gente pode chamar ela aqui de “Dona Januza”. — Dona Januza diz que pelo menos uma hora de velório precisa ter, porque quando existe um velório, os espíritos daquelas pessoas vivas que estão velando aquele corpo e, consequentemente, aquela alma que ainda não foi totalmente desligada daquele corpo, elas vibram de uma maneira que chamam o espírito para perto… Então, mesmo que ele já tenha sido socorrido, enfim, para uma esfera superior, enfim, qualquer coisa, ele volta um pouco ali, porque aquela vibração das pessoas que estão no velório elas atraem aquele espírito.
Então, a Dona Januza acha que quando o corpo fosse liberado e tivesse o velório onde ele estivesse naquela casa, enfim, ele voltaria pra perto do corpo dele por causa da vibração daquelas pessoas vivas que estão ali presencialmente por aquela alma, né? E aí pode acontecer o que? Às vezes a pessoa morreu e tá que nem esse senhor, por aí, ela vai ali, ali ela arranja socorro espiritual e já não volta a ser errante mais, mas pode acontecer dela chegar ali naquele velório, ver que tem uma ajuda para ela e ela recusar essa ajuda e continuar vagando. Então, Dona Januza acha que por ele estar ali e por ter sido muito recente, provavelmente aquele corpo, como foi afogamento e tal, não tinha sido liberado ainda e que ele tinha uma chance sim de ser socorrido. — Jamais saberemos, né? — O importante é que nem Jamile e nem o amigo dela da praia viram de novo esse senhor. Depois de muito tempo, ela sonhou com esse senhor, mas ela só sonhava com a parte que ele estava sendo ali socorrido e ela estava torcendo, falando: “cospe água, cospe água, cospe água” e, de repente, ela acha que foi a força mental que ela estava fazendo ali para que ele tivesse vida de novo, pra que ele voltasse, que ele grudou nela. Então será que foi o “cospe água”, gente? O que vocês acham?
[trilha]Assinante 1: Oi, nãoinviabilizers, aqui é a Paula de São Paulo. Oi, Jamile, história bastante tensa, mas eu acredito que esse espírito apareceu para você porque no meio de todos os curiosos, talvez você tenha sido a única que pediu aí com fé mesmo, com bastante vontade, para que ele sobrevivesse. Não foi o que aconteceu e eu acredito que por isso ele acabou aparecendo para você. Acredito que ele não queria te fazer mal, porém, eu imagino que não tenha sido agradável para você. Mas que bom que não apareceu mais no final e que tudo deu certo para todos. Um beijo.
Assinante 2: Oi, nãoinviabilizers, aqui é a Kelly de Itabirito, Minas. Se tem uma coisa que o Luz Acesa me ensinou é: Se tem acidente, tem algum trem acontecendo com possibilidade de alguém morrer, corra, corra para o lado oposto. Por que como assim, gente? Sem qualquer laço o espírito vem assombrar. Cruz credo… Eu ainda tenho até hoje a história da Pisadeira na cabeça, vez ou outra eu tô andando na rua a noite e aí eu lembro e não olho pro telhado. Não sei porque que eu continuo ouvindo Luz Acesa… Na verdade, eu sei, né? É uma delícia, mesmo a gente sentindo medo. Ai, que bom que deu tudo certo no final e é isso, gente, vamos tomar cuidado.
[trilha]Déia Freitas: Comentem lá no nosso grupo do Telegram, sejam gentis com a Jamile. — Essa coisa do olho só a parte branca me pega muito. Me pega demais… — É isso — Deus me livre — e eu volto em breve.
[vinheta] Quer sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]