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título: apartamento
data de publicação: 12/05/2021
quadro: luz acesa
hashtag: #apartamento
personagens: valentina e bruno

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente, cheguei. Cheguei pra mais uma história, e hoje Luz Acesa. [efeito sonoro de criança rindo] Se você é uma pessoa que tem muito medo das histórias do quadro Luz Acesa, eu tenho uma novidade pra você, eu tô contando as histórias sem trilha sonora e sem efeitos assim de medinho lá para os assinantes, então eu acho que fica mais tranquilo pra quem tem medo, né? Ouvir a história sem efeito nenhum e é uma maneira aí se você tem medo de poder acompanhar mais algumas histórias do canal, então fica aí a dica, né? Assina, tem um monte de história exclusiva lá pra você, tem desfechos… E vamos lá, [risos] vamos de história. 

[trilha]

Hoje eu vou contar pra vocês a história da Valentina e do Bruno, e é a Valentina que me escreve, essa história é uma história antiga, é uma história ali de dois mil e dezessete, dois mil e dezoito, que eu acompanhei pelo Twitter e foi interessante, porque foi uma história que a gente foi acompanhando assim meio que em tempo real, a gente acompanhou até certo ponto, então eu tenho a história até certo ponto e depois infelizmente já não tive mais notícias. Então vamos lá, vamos contar a história da Valentina e do Bruno. 

[trilha]

A Valentina e o Bruno, eles não têm uma religião, nenhum tipo de crença e eles resolveram se casar. Casar só no civil, a mãe da Valentina, Dona Ivete, queria que ela casasse no religioso com vestido de noiva, nã nã nã, mas esse nunca foi o sonho da Valentina, então não ia rolar mesmo. E eles resolveram se casar e morar na casa, no apartamento do Bruno, no apartamento que o Bruno alugava, eles casaram em maio e esse apartamento, ali por agosto, vencia o contrato, e o dono do apartamento não queria renovar, então eles tinham tempo aí, né? Depois de casados, um tempinho pequeno pra procurar um novo apartamento e eles queriam alguma coisa perto do metrô e tal, e começaram a buscar, só que estava difícil assim, quando eles gostavam do bairro ou do apartamento, era muito caro, estava fora da faixa deles. 

E aí o tempo foi passando, eles foram procurando apartamento… Até que a Valentina viu um anúncio de um apartamento que era muito bom e que tinha um preço muito barato, assim, mais barato até do que eles pagavam no apartamento do Bruno. O apartamento teria que ter dois quartos porque a Valentina é designer, ela tem uma mesa própria pra fazer as coisinhas dela e ela queria pôr lá uma poltrona que ela tem, queria fazer uma sala pra ela e precisava desse quarto extra. Então eles marcaram de conhecer esse apartamento, eles estavam empolgados com esse apartamento novo, né? Mas aquela coisa… Eles tinham visto só por fotos, a Valentina tinha mandado as fotos ali, né? Pros dois conhecerem o apartamento, mas e se, de repente, fosse, sei lá, um apartamento que fica grudado num viaduto, sabe? Que tem muito barulho, porque estava bom demais pra ser verdade. — Essa é a real. —

Aí o Bruno falou: “Bom, vamos lá, vamos marcar, vamos ver”, aí eles marcaram com o corretor, o nome do corretor Michel Denis. — E eu lembro que na época eu coloquei esse nome porque o corretor realmente tem um nome duplo esquisito assim, tipo um Michel Denis, [risos] e aí ficou Michel Denis. — E aí eles marcaram ali, né? Com o Michel Denis e foram conhecer o apartamento. Chegou lá, o apartamento estava cheio de pedreiro, estava em obras, mas assim, já dava pra perceber que era um apartamento bacana, bacana real assim. E os caras ali trabalhando, o Michel Denis foi mostrando tudo… E eles ainda meio sem acreditar no preço, tipo, estava muito bom… — Mesmo… — Daí eles curtiram e o Michel Denis disse que tinha mais dois casais interessados, mas que ele tinha gostado mais da Valentina e do Bruno, nã nã nã, — Aquele papo de corretor — e ele falou: “Eu aguardo aí até amanhã uma oferta de vocês”. 

E aí eles começaram a fazer as contas, porque eles ainda pagavam o apartamento do Bruno, tinha mais dois meses pra pagar ainda e eles teriam que pagar caução e mais um mês de depósito desse apartamento novo, aí se apertaram, pegaram uma graninha também com a Dona Ivete, inclusive Dona Ivete foi, tipo, a afiadora desse novo aluguel, né? Foram pras cabeças… Vamos alugar, porque era uma coisa muito boa e não tinha um condomínio caro, porque o prédio não tinha piscina, nada, era um prédio bom, mas não tinha lazer, né? Então também tinha um condomínio com um valor ok e estava, gente, tudo perfeito, um aluguel baixinho, um apartamento bom, um condomínio baixo, era bom demais pra ser verdade, né? Mas até aí o casal ali colocou essa coisa boa no quesito sorte, “tivermos sorte”. 

E aí pagaram, deu tudo certo e, a ideia era: Começar a levar as coisas aos poucos para o apartamento novo, então como a Valentina tinha um horário flexível ali, era design e o Bruno é um sushiman, então ele trabalhava mais a noite e chegava de madrugada, ela ia levando as coisinhas, então a primeira coisa que ela resolveu fazer foi ir lá no apartamento medir o quarto, que seria o quarto extra que ela ia fazer o cantinho de trabalho dela ali, ver se cabia a mesa que ela tinha, onde ela ia botar a poltrona, ela estava super empolgada. A Valentina passou na corretora pra pegar a chave, Michel Denis apresentou pra ela o proprietário do apartamento que era o Seu Gilmar, — Um senhorzinho careca assim, atarracado — e ela ficou pensando, falou: “Bom, eu tenho que fazer amizade com esse Seu Gilmar porque apartamentão, reformado, lindão, no precinho, tem que ser a melhor amiga do Seu Gilmar”. 

Aí pegou a chave, já foi super simpática ali, nã nã nã, e seguiu pro apartamento, chegando lá pra entrar ela encontrou o Sirlei… — Quem é o Sirlei? — Sirlei é o porteiro do prédio. — A gente sabe que porteiro é o cara que sabe de tudo. — Aí ela chegou lá, ela falou: “Ah, eu sou a nova moradora do noventa e dois, né?”, aí o Sirlei falou pra ela: “Ah, o Seu Gilmar já me falou, né? Seja bem-vinda aí no prédio e eu tô por aqui, se você precisar de qualquer coisa é só interfonar que eu corro pra te socorrer”. — E, assim, o uso das palavras, porque o socorrer do Sirlei foi um socorrer meio grave assim, do jeito que ele falou, sabe? “É só me chamar que eu corro lá pra te socorrer [efeito sonoro de eco no “socorrer”]. — E aí Valentina ouviu aquilo, falou: “Bom, deve ser o jeito dele, né? Mas, sei lá, jeitão ali de Sirlei…”. — Por que, né, gente? Socorrer? — E a Valentina falou: “Bom, tá bom, vou lá” — Fiquei preocupada, mas vou lá, né? [risinho] —

E aí no final ela falou: “Bom, que legal que o pessoal do prédio é assim prestativo, né? Tô bem”, gente, era só o paraíso. [efeito sonoro de elevador] Aí assim que a Valentina desceu do elevador, que ela entrou no corredor, ela percebeu que a luz ali era muito forte assim, tinham quatro apartamentos, era quatro apartamentos por andar, e não era uma luz que quando você entra ela acende, era uma luz fixa, muito forte mesmo e acesa o tempo todo ali no corredor. Na hora a Valentina pensou: “Puts, essa luz com certeza vai vazar por debaixo da porta, vai clarear a minha sala, então já tenho que comprar uma cobrinha, um negocinho pra pôr aqui pra isolar aí essa luz pra não entrar no apartamento”. Que ela entrou no apartamento, a primeira coisa, ela percebeu que ali na porta tinha alguma coisa emperrando e era um taco, que estava solto, e ela deu risada falou: “Bom, temos aí um primeiro problema”, mas assim, brincando, né, gente? Porque assim, estava tudo perfeito, um taco solto? O que era um taco solto, né? 

O apartamento estava vazio, então fazia muito eco, conforme a Valentina andava os passos dela ali com o sapatinho que ela estava, fazia eco. Então ela foi até o quarto, mediu e resolveu medir também uma parede da cozinha, que é aonde o Bruno ia com o amigo dele depois instalar os armários. Conforme ela foi pra cozinha medir a parede, ela mediu, foi se afastando meio pra sala, e sabe quando você percebe pelo canto do olho assim que tem uma pessoa no seu campo de visão? E ela teve essa impressão, que tinha uma pessoa, quando ela passou, que ela viu uma pessoa abaixada atrás do balcão da cozinha, a cozinha tinha tipo uma ilhazinha assim, e ela teve a impressão que ela viu uma pessoa abaixada atrás do balcão… Então ela tinha medido a parede que era em frente, quando ela passou para o outro lado, que ela viu, primeira coisa, né? Você fala: “Gente?”, e aí ela deu a volta correndo na ilha assim, tipo, se tivesse alguém ela ia pegar… — Eu já tinha saído correndo. — Que ela deu a volta, ela viu que não tinha nada e ela riu alto, tipo, “Nossa, tô louca, né?”, que ela riu alto, gente, ela escutou um sussurro no ouvido dela, só que não deu pra entender o que a pessoa falava, mas alguém sussurrou no ouvido dela e ela virou com tudo assim, cismada, e viu que não tinha ninguém, e aí ela riu mais alto ainda, e aquela risada que ecoava no apartamento, né? — Tipo, “Nossa, eu tô viajando”. —

E Valentina colocou tudo isso na conta da empolgação, falou: “Nossa, tô empolgada, tô aqui sozinha, tô vendo coisa. Eu vou embora, já medi o que eu tinha que medir e volto outro dia”, quando ela chegou em casa ela comentou com o Bruno, que ela tinha tido a impressão que tinha uma pessoa com ela no apartamento, e aí o Bruno falou pra ela: “Nossa, você tá viajando, tá vendo muita série, deve ter sido a sombra de uma árvore”, e a Valentina ficou quieta, mas ela pensou: “No nono andar não tem árvore, não dá pra você ver árvore do lado de fora”, e a Valentina estava fazendo assim, de tudo, pra achar que era coisa da cabeça dela, só que tinha um detalhe: Quando ela saiu do apartamento que ela trancou a porta, que ela entrou naquele corredor de luz muito forte e fixa, ela sentiu um desconforto enorme, porque parecia que tinha alguém com ela no corredor encostado nela, sabe quando alguém encosta em você assim e fica do teu lado e encosta em você? E te dá uma má impressão, você não quer nenhuma pessoa desconhecida encostada em você, e a sua reação é tipo afastar, então ela foi afastando pra chegar ali no elevador e a pessoa encostada nela. Então essa foi uma impressão maior do que achar que ela tinha visto alguém dentro do apartamento e que tinha rolado assim que ela saiu do apartamento ainda ali no corredor. 

Então ela ficou realmente cismada, mas querendo achar que “Nossa, foi coisa da minha cabeça”, Valentina e Bruno totalmente sem crenças assim, então não ia rolar dar uma rezada, nada. E ela ficou com essa cisma, chegou final de semana, o Bruno queria levar mais algumas coisas para o apartamento, mas a Valentina estava com um bode, ela não estava com medo, ela estava com bode de voltar lá, porque ela tinha tido essas sensações assim, né? E ela não queria muito ir, então ela enrolou, falou que não ia, e aí como o Bruno queria colocar os armários na cozinha e precisava de alguém pra segurar, ele chamou um amigo dele, o Luizão, pro Luizão dar essa força ali e ajudar ele a colocar os armários na cozinha, e isso era um sábado, já finalzinho de tarde assim, pra noite. Quando eles chegaram no andar o Luizão comentou que no corredor ali, que aquela luz parecia luz de centro cirúrgico, que era assim, uma luz muito forte e muito fria. 

E aí eles entraram, os armários eram meio pesados e tal, colocaram os armários pra dentro e, enquanto o Bruno organizava ali, media onde ia pôr o que, o Luizão estava fazendo selfies pelo apartamento e vendo tudo assim, dando uma geral ali, olhando. Aí eles começaram a instalar os armários e, assim, o Luizão segurava ali posicionado o armário e o Bruno parafusava, estava com a furadeira, a parafusadeira, sei lá, essas coisas. E em um determinado ponto que o Luizão estava segurando um armário mais pesado, de repente, do nada, ele soltou o armário, o armário se espatifou no chão, o Bruno quase se machucou com a furadeira que ele estava na mão e o Bruno ficou puto, começou a gritar com o Luizão, quando ele olhou pro Luizão, o Luizão estava pálido, pálido. E o Luizão começou a falar: “Cara, eu acabei de ver uma sombra, um vulto cinza atravessar a parede”, e o Luizão tremia, ele falava: “Mano, essa casa tem coisa, eu não quero mais ficar aqui”. 

E o Bruno estava tão puto porque ele estava olhando o armário dele onde tinha rachado e tal, onde estava danificado, que ele nem prestou atenção no que o Luizão estava falando, ele só ficava gritando: “Caralho, mano, olha o que você fez, puta que pariu, não sei o quê”, puto assim, por causa do armário, enquanto o Luizão desesperado, tremendo e falando do vulto que ele tinha visto atravessar a parede. Enquanto os dois saíam apressados dali do prédio, o porteiro Sirlei estava olhando os dois de longe assim e não falou nada. O Bruno viu que o Sirlei estava ali, né? O Luizão estava apavorado, apavorado, teve que… O Bruno teve que largar tudo lá e levar o Luizão embora, porque nada fazia o Luizão ficar naquele apartamento. E aí quando o Bruno chegou em casa, foi contar pra Valentina, né? Valentina já super cismada resolveu falar com a mãe dela, com a Dona Ivete. 

Nessa hora que o Bruno estava puto falando do que tinha acontecido com o Luizão, a Valentina chegou a falar pra ele que tipo: “A gente nem mudou ainda, eu não quero mais voltar lá”, e aí o Bruno puto já, acusou o Luizão e a Valentina de estar fazendo teatrinho, que não tinha porcaria de vulto nenhum, que não tinha nada de sussurro, de nada, não tinha nada, que era tudo teatro dos dois, que onde já se viu, que o apartamento era maravilhoso, nã nã nã… Estava puto o Bruno. Aí o Bruno foi levando as coisas sozinho para o apartamento e a Valentina quando ela ia, ela ia com a mãe, e nada mais aconteceu, gente, eles mobiliaram, levaram as coisas, fizeram a mudança e, quando foi em setembro, eles entraram no apartamento novo. E tudo certo assim, nada acontecendo.

Primeira noite, o Bruno como eu disse é sushiman, então ele trabalhava à noite e chegava de madrugada, a Valentina estava no sofá assistindo TV ali, assistindo um filme e o sofá ficava de costas pra porta de entrada, e ela ouviu nitidamente a porta destrancar, abrir, fechar e alguém entrar no apartamento, o que ela pensou? “Bruno chegou mais cedo, que bom, vai dar tempo dele assistir o filme comigo” e ela ficou esperando no sofá sem virar, porque ela estava ali, assim, acomodadinha, né? Pra ele chegar, dar um beijo nela, que era o que ele fazia e tal, e aí nada. Depois que a porta se fechou e a pessoa entrou no apartamento, o silêncio, e aí ela olhou pra trás não tinha ninguém, gente, não tinha ninguém. Ela já ficou cismada porque ela estava no escuro ali assistindo filme, levantou, acendeu a luz da casa toda e, antes, quando ela levantou, que ela foi acender a luz da sala, ela percebeu que no corredor aquela luz fixa e forte estava piscando, sabe quando a luz fica tremendo um pouco antes de queimar? Estava assim, ela percebia por debaixo da porta que a luz estava assim, trêmula. 

E aí ela acendeu a luz da casa toda e ficou esperando ali o Bruno chegar, nem conseguiu mais ver filme, ver nada, mas resolveu não contar pra ele, pra tipo o Bruno não ficar aborrecido, né? Porque era um negócio que ele ficava aborrecido. E a Valentina tinha certeza gente, que ela tinha ouvido sim o trinco da porta, tinha ouvido tudo, mas ela pensou: “Eu vou contar pro Bruno ele não vai acreditar e a gente vai acabar brigando”, enfim, passou mais um tempo, a Dona Ivete indo lá ver a filha e vendo que a Valentina estava estranha, arredia, ela dormia pouco, e o que a Dona Ivete pensou? “Meu Deus, Valentina tá usando droga”. — Isso é tóxico. [risos] — E aí ela ficou mais preocupada ainda quando a Valentina — Porque Dona Ivete é católica — pediu pra ir na missa com a mãe… — Valentina que nunca acreditou em nada pediu pra ir na missa… — então Dona Ivete ali teve certeza que era droga. 

E aí mais algumas noites se passaram, na quarta à noite o casal estava dormindo, Bruno dormia bem pesado, então ele estava dormindo de lado, virado pra parede e Valentina estava dormindo de bruços, do nada, Valentina dormindo, ela sentiu um soco nas costas, mas um soco muito forte. E aí ela acordou zonza, o que você imagina? Ela pensou: “Meu Deus, Bruno tá me batendo”, e aquela dor nas costas do soco, tudo escuro, e aí ela meio que virou, pôs a mão, e viu que o Bruno estava dormindo, tipo dormindo muito. E aí ela começou a chacoalhar ele, começou a chorar porque não tinha sido sonho, ela tinha levado um murro nas costas e ela começou a chacoalhar o Bruno pra ele acordar, né? Tipo, “Acorda, acorda, acorda”, a Valentina queria que o Bruno acordasse pra ele ir acender a luz, porque ela não tinha coragem de levantar pra ver quem que estava lá dentro, né? Quem estava batendo nela. 

Só que o Bruno não acordou, gente, não acordou, ela chacoalhou ele muito, ele não acordou e aí ela ficou ali agarrada nele assim, tremendo e acabou pegando no sono, mas ela tinha certeza desse soco nas costas, do soco que ela tinha levado nas costas. No dia seguinte a Valentina tinha um mega hematoma nas costas e ela foi contar para o Bruno o que tinha acontecido, ele não acreditou nela, falou: “Com certeza você rolou, bateu aí no chão, bateu em algum lugar e sonhou que era um soco, isso não aconteceu”, e ele riu. Ela super magoada, — Porque ele não estava acreditando nela, real assim, né? — e a mãe dela achando que ela estava usando droga, quer dizer, ela estava sozinha… — Passando por essas coisas no apartamento e se sentindo sozinha porque ninguém acreditava nela. — Provavelmente a única pessoa que acreditaria nela seria o Luizão, né? 

Nas noites seguintes assim, a Valentina levou empurrões, beliscões, socos, ela não via ninguém no apartamento, ela só sentia e apanhava e sempre quando ela estava sozinha. E aí um dia que ela estava na mesa de trabalho dela rascunhando ali umas coisas, ela viu um vulto e não era um vulto meio transparente, meio cinza, meio esfumaçado assim, como o Luizão tinha visto, a Valentina viu uma massa, um vulto que era denso, sabe? Ela não sabe explicar, mas era uma forma humana, era denso assim, era um corpo como a gente, só que era todo desfigurado, assim, ela não sabe explicar, mas aquela coisa olhava pra ela com ódio, com um ódio tão grande, gente que a Valentina sentada na mesa dela de trabalho ali na cadeira, ela se mijou inteira, tamanho o pavor. E aí ela não sabe explicar, né? O que era aquela massa, o que era aquela coisa que estava olhando pra ela com ódio e essa massa estava meio dentro da parede, meio fora, sabe assim? Uma coisa surreal. A Valentina não sabia explicar assim, parecia humano, mas não era humano, tinha boca, tinha dentes, mas não tinha olhos e mesmo assim ela percebia aquela criatura olhando com ódio pra ela, ela ficou paralisada olhando pra essa coisa na parede e se mijando. 

Só que nesse dia, gente, o Bruno estava em casa e quando ele entrou ali no escritório da Valentina ele viu a esposa toda mijada, em transe, olhando pra parede, e ela não saía desse transe, e aí ele pegou a Valentina e levou para o PS, ela estava assim paralisada, estava em choque. E aí o médico disse ali que ela teve um uma crise nervosa, né? Desencadeada por um stress, no meio do caminho o Bruno chamou a Dona Ivete, a Dona Ivete questionou o médico ali se não podia ser drogas, enfim, e a Valentina resolveu passar uns dias na casa da mãe pra dar uma melhorada, sair daquele ambiente, mas pra ela passar uns dias na casa da mãe ela precisava pegar roupa, tudo, então foram os três para o apartamento, Valentina não queria voltar, mas voltou. 

E quando o Bruno saiu apavorado levando a Valentina para o PS, a Dona Eva, que era uma senhorinha do apartamento noventa e quatro, na frente do apartamento deles, viu tudo, e quando eles voltaram a Dona Eva resolveu bater lá no apartamento deles pra conversar. Foi a Dona Ivete que abriu a porta ali do apartamento e falou: “Ah, pode entrar, né?”, e aí Dona Eva não quis entrar e puxou a mãe da Valentina pra fora, ali para o corredor. E aí, gente, ela contou uma história tensa. A Dona Eva contou que o apartamento ali que eles estavam, o apartamento noventa e dois, que ele era assombrado há muitos anos assim, que ninguém parava lá e que ela mesma, Dona Eva, já tinha levado socos ali no corredor e que por isso que aquele corredor tinha aquela luz forte, que o Sirlei que era o zelador e porteiro lá do prédio também já tinha sido agredido e que ninguém parava ali porque o que tinha ali era muito agressivo e muito do mal. 

E aí a Dona Ivete começou a chorar e esse choro da Dona Ivete era ela aliviada, — Porque a Valentina não estava usando drogas, [risos] ô, gente… — E aí que ela começou a prestar atenção mais no que a Dona Eva estava contando, né? E tudo bem, passou. Valentina foi ficar uns dias na mãe, ela estava meio grogue, com remédios e tal, o Bruno continuava sem acreditar em nada, mas aí começou a saga da família, porque a Dona Ivete agora já sabia do que estava rolando, né? E ela levou pastor, levou mãe de santo, levou pai de santo, levou monge, levou espíritas, levou tudo no apartamento e, conforme ela levava, a coisa melhorava uns dias e depois a Valentina voltava a ser agredida. Só que uma coisa, gente, depois de uns dias o Bruno também passou a ser agredido, ele também passou a levar socos, a levar chutes… Um dia ele estava no chuveiro e alguém bateu a cabeça do Bruno no vidro do box e ele ficou com um galo na testa e o box ficou todo trincado, e aí a partir desse dia ele passou a ser mais agredido do que a Valentina. 

E aí além do Bruno ser agredido, porque assim, a Valentina não escutava nada, ele passou a ouvir vozes dentro do apartamento, vozes que falavam com ele e, sem saber lidar com aquilo, ele começou a beber, gente, o Bruno começou a beber, e aí a Valentina falou: “Aqui eu não fico mais, não fico mais”, e foi morar na casa da mãe dela, o Bruno insistiu mais uns dias ali no apartamento, mas não aguentou também porque ele apanhava muito e ele foi dormir nos fundos do restaurante que ele era sushiman. E como que eu soube dessa história? Porque a Valentina me procurou no Twitter, porque ela queria que eu pedisse ali um auxílio jurídico pra ver se eles conseguiram reaver esse dinheiro, sei lá, e aí o pessoal ajudou ali no Twitter, deu uma orientação pra ela, né? E aí agora eles separados, o Bruno bebendo e morando nos fundos do restaurante, Valentina morando na mãe. 

A Dona Ivete foi um dia buscar umas coisas lá no apartamento, nada tinha acontecido com ela ainda e ela levou empurrão, gente, que ela caiu de joelhos e se machucou, e ela ficou apavorada também. Aí eles perderam a caução, tiraram as coisas do apartamento, dividiram as coisas, eles se separaram, gente, o Bruno e a Valentina. E só que tem um detalhe, a Valentina na casa da mãe voltou a ver aquela massa, na casa da mãe dela, aquela massa foi com ela. E aí foi nesse ponto que ela me procurou, né? Que ela só queria ver se eles conseguiam reaver o dinheiro, mas eles já estavam separados. A Valentina super ressentida, ainda sem acreditar em nada, em Deus, em nada, sem saber explicar o que era aquela massa e eu sugeri que ela jogasse tudo fora, gente, tudo que ela dividiu e separou, porque ela não sabe se o Bruno também estava vendo coisas ainda, ela estava. 

Eu falei: “Meu, joga tudo fora, põe fogo nisso, tudo o que você trouxe do apartamento, não fica com nada”, mas, né? Também ninguém é rico pra se desfazer de tudo, né? E ela estava bem nesse auge assim de separação, e de estar mal, quando ela me procurou. E a última vez que essa coisa apareceu pra Valentina, apareceu ali do lado, saindo do movelzinho dela de cabeceira ali do lado da cama e ela começou a gritar e agora ela dormia no mesmo quarto que a Dona Ivete, duas camas de solteiro ali e um movelzinho no meio separando, e a Dona Ivete também viu essa massa, então não dá nem pra falar que “Ah, tipo, foi uma alucinação da Valentina”, porque a Dona Ivete também viu e agora Dona Ivete que é católica, ela estava frequentando um centro espírita pra ver o que se podia fazer, né? E, gente, a Valentina estava mal nessa época, né? Que ela me escreveu, e a pergunta que ela tinha, que ela estava fazendo ali no Twitter era como que, em tão pouco tempo ela e o marido, foi assim de um relacionamento maravilhoso, casal perfeito, pra isso… Pro Bruno bebendo, os dois infelizes, casa assombrada, tipo, tudo desandou, e aí a história terminou assim. 

Depois de um tempo a gente perdeu o contato e eu não sei o que aconteceu mais, nem com ela, nem com o Bruno. Eu torci na época pra eles voltarem, tomara que eles tenham voltado, tomara que ela veja essa história, não sei se no Twitter de novo, ou se ela me ouve, pra ela, quem sabe, voltar e contar pra gente o que aconteceu. 

[trilha]

Assinante 1: Oi, Valentina, aqui é a Jaqueline de Belo Horizonte, e eu espero que você esteja bem. Essa é uma história antiga, não sei se você tá lá no grupo, não sei se você ainda acompanha o trabalho da Déia, mas espero que você tenha conseguido reconstruir sua vida, conseguido superar esse trauma desse fantasma do apartamento, e eu super acredito em fantasmas, em almas penadas, super acredito. Não sei se você tem alguma fé, mas coloca aí também essa alma em oração, fica bem, viu? Beijo. 

Assinante 2: Poxa, Déia, que história tensa, eu vou confessar que eu ouvi mais de uma vez, porque eu, enquanto espírita, embora não seja muito praticante, eu entendo, eu acredito piamente em tudo isso que aconteceu e eu lamento muito a forma que tenha acabado, né? A separação da Valentina e do Bruno, o Bruno ter enveredado aí pro lado do alcoolismo e essa importunação ter continuado ainda depois disso com a Valentina. Eu acho que vale a pena ir em algum lugar, né? A uma igreja, um centro espírita, tomar um passe, enfim, fazer umas orações, porque esse espírito realmente pode ter aí ido atrás, porque um espírito apegado, eu não consigo entender o ódio que ele tem, né? Das pessoas que entram ali pra agredir e tal, mas enfim, é uma história muito tensa e eu espero sinceramente que Valentina e Bruno estejam bem. E um beijo, Déia. 

[trilha]

Déia Freitas: Então é isso, gente, essa é a história da Valentina e do Bruno. Tensa, tensa, tensa, tensa e que eu acompanhei ali em tempo real. Então um beijo e eu volto outro dia com mais histórias.

[vinheta] Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta] 

Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.