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título: café
data de publicação: 06/11/2020
quadro: picolé de limão
hashtag: #cafe
personagens: betina e carlos

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta] 

Déia Freitas: Oi, gente… Estou aqui pra mais um Picolé de Limão. Agora, eu vou contar pra vocês a história da Betina e do Carlos, e é mais uma história de quarentena. Eu espero que essa história depois eu possa dar continuidade, que ela vai até um ponto, aí a gente não sabe o quê que vai rolar ainda, vamos lá.

[trilha]

Então assim, a Betina ela trabalha numa multinacional e ela tá de home office, tá trabalhando de casa e ela trabalha muito, muito, muito, muito. A família dela mora no Sul e ela mora aqui em São Paulo já tem doze anos, então ela já tá acostumada, com aqui, mora sozinha, tem dois gatos e trabalha pra caramba. Ela mora num prédio moderno, num bairro que tem bastante prédio e os prédios são meio perto assim um do outro, né? Acho que tem uma distância limite, mas você consegue ver bem dentro do apartamento do seu vizinho do outro prédio, tipo, não é nem seu condomínio é o outro prédio, prédio vizinho mesmo. Ela tem um ritual, então, assim, ela acorda cedo, aí cuida das coisinhas dos gatos, fica um pouco ali vendo algumas coisas na internet enquanto faz um café, aí ela pega o café e ela vai pra varanda, os gatos gostam de ficar ali tomando Sol. — A primeira coisa que eu perguntei pra ela é: “Sua varanda é telada?” [risos], e ela falou: “Não, Andréia, tem tela em tudo”. Então ótimo, então é um ponto que já não me preocupa. —

E aí ela gosta de ficar ali na varanda dela tomando o café e depois ela pega ali firme no trabalho e vai até a hora que for, e tem conferência, essas coisas, inclusive, trabalha arrumada, ela não gosta de trabalhar de pijama e ela penteia o cabelo. [risos] — Eu sei lá quantos dias eu tô sem pentear o cabelo. [risos] — Ela penteia o cabelo, se arruma e trabalha, mesmo estando em casa. E aí ela tem esse ritual, de tomar o café todo dia ali na varanda e, mais ou menos um mês, ela percebeu no outro prédio um cara, mais ou menos no mesmo andar que ela tomando café também na varanda. E aí ela olhou, ele olhou, ele sorriu falou: “Bom dia”. — Isso, gente, de um prédio para o outro… — Ela também falou: “Bom dia”, deu um tchauzinho assim, mas uma coisa cordial, assim amigável, mas nada de paquera, e ficou nisso.

Aí no dia seguinte ela estava lá tomando café de novo e ela nunca tinha visto esse cara ali no outro prédio assim, mas também não era uma coisa que ela reparava, né? Porque ela quase não ficava em casa de dia. Aí o cara estava lá de novo, dessa vez ele não estava com café na mão, ele estava só na varanda, e aí ele falou: “Bom dia”, ela falou: “Bom dia”, de novo, e foi trabalhar. No terceiro dia ela lá tomando café na varanda, o cara lá de novo, dessa vez ele estava com uma garrafinha, tipo, parecia que ele tinha acabado de malhar, e aí estava tomando alguma coisa numa garrafinha e falou: “Bom dia”, “Bom dia”, e aí ela estava com um dos gatos assim, o gato estava em cima da mesinha ali da varanda, e aí ele fez assim um sinal tipo apontou para o gato e fez um gesto meio que “Ah, fofinho”, e ela pegou o gato e meio que levantou e mostrou pra ele.

E aí dali pra frente, gente, começou uma interação, só que é tudo meio de longe assim, ela escutava ele falando: “Bom dia”, dava pra escutar a voz, né? E aí as vezes ele falava: “Ah, esfriou”, “Ah, tá calor”, sabe assim, amenidades? Só que todo dia um ficava meio que esperando o outro ali na varanda e, durante o dia, ela sempre trabalhou muito assim concentrada e nem ia na varanda, nada, e ela começou a tipo na hora do almoço ir na varanda pra ver se ele estava lá, às vezes ele estava, às vezes não, e às vezes ela via que ele estava na varanda, tipo, procurando por ela e eles ficavam nisso. Aí a coisa foi evoluindo pra noite um procurar o outro na varanda e tudo isso assim, só “Oi”, “tchau”, “frio”, “calor” — Com a distância, né? Tipo, nem trocaram telefone, nada. —

E ela começou, Betina começou a ficar interessada mesmo nele e ela me falou que ela sempre foi muito fechada assim, muito com receio de se machucar, só que ela estava empolgada com ele, e tudo muito rápido assim… Tipo, em uma semana eles já estavam um procurando o outro ali. — Eu acho que contribuiu um pouco também pra essa questão do tédio, né? Porque a gente não tem nada pra fazer, se achar um paquerinha ali no prédio do lado é o canal, né? — E aí um dia, era uma noite assim, ela estava meio que espiando pra ver se ele estava lá, meio com tudo apagado? Ela viu que entrou uma moça no apartamento dele, aí, nossa, já ficou mal. E ela viu, viu ele olhando primeiro para o apartamento dela e vendo que estava tudo apagado, ele deve ter deduzido que ela tinha saído, e ela viu os dois se beijando mesmo, se beijando, ficando ali juntos e depois sumiram lá pra dentro, provavelmente foram para o quarto, que ela viu a luz do quarto acendendo depois apagando.

E aí ela ficou no escuro, ela falou: “Não vou acender nada, vou ficar na minha”, e quando ele voltou pra sala com a moça, a moça estava arrumada, do jeito que estava antes, então ela não sabe o que rolou no quarto, ela acendeu as luzes, aí ele deve ter deduzido que a Betina chegou, né? E aí já deu uma apressada assim, parece que na moça, a moça foi embora e ele foi até a varanda e deu um tchau pra ela, ela não conseguiu dar tchau pra ele. No outro dia de manhã a Betina não foi pra varanda, ficou tomando café ali na cozinha e foi trabalhar, deu uma espiada, viu que ele estava lá. E aí assim ela fez, ela falou: “Puts, agora estragou meu momento de varanda”. — E ela meio que desencanou, mas não desencanou. —

Aí um belo dia, gente, ela não sabe como, esse cara foi até o prédio dela na portaria, conseguiu descobrir acho que meio que pelo andar, ele descrevendo ela para o porteiro, falando que ela tinha dois gatos e tal, e o porteiro falou: “Ah, deve ser a Betina ali do apartamento tal”, e ele deixou um CD pra ela do Chico Buarque e, tipo, um bilhetinho “Ah, tô com saudade de você, dos nossos cafés na janela”. — Eu sinceramente achei cafona, meio canastrão, sei lá, meio parece que não é, é uma coisa que ele faz sempre. Eu achei, me deu essa impressão… — E aí no dia seguinte ela foi pra janela e fez assim com a mão tchauzinho e agradeceu, fez um joinha. — Joinha é muito assim, dá gelo, né? — Tipo, “Ah, obrigada pelo presente”, e ele tinha escrito no bilhete “Carlos”, então ela ficou sabendo que o nome dele era Carlos.

Aí lá do outro lado, ele, do nada, depois que ela fez o joinha, ele falou pra ela: “ontem era minha irmã”, só que ele não sabe que ela viu, ela estava no escuro vendo e viu os dois se beijando. — Quer dizer, então foi incesto? Não, né? — O cara mentiu pra ela que era irmã. — Gente, como pode, né? Para quê mentir? Podia ter falado “Ah, só um caso”, sei lá, ou não fala nada, por que que precisa inventar que é irmã? — Aí assim, agora tá nisso, o cara tá muito atrás dela, deixa coisas pra ela lá no prédio, fica mais na varanda dele procurando por ela e ela tá amolecendo, acha que “Ai, ele falou que era irmã porque ele não sabia o que dizer” — Mas poxa, o cara podia falar mil coisas — E se, de repente, passa aí a quarentena e eles começam a ter alguma coisa? Como que ele vai sair dessa? Tipo, ela não é irmã dele, ele vai inventar uma irmã? Ele vai contar a verdade? Não sei, assim, eu tenho um feeling.

Ela me contou mais umas coisas, mas se eu contar meio que vai dar pra identificar o cara, mas ele faz essas coisinhas de deixar poema, de… Não sei, achei tudo muito canastrão assim, muito… Ah, não sei, parece que é o jeito que ele já faz com todas? Eu não sei explicar, mas assim, tem algo errado, não sei dizer, pode ser cisma minha que não gosto desse tipo de cara, não gosto mesmo. Pode ser cisma minha, então, né? Posso estar errada. Mas ela queria a opinião de vocês, tipo, se isso vai dar em algum lugar, se ela deve dar uma profunda… Ele deixou o telefone dele num dos bilhetes e falou: “Ah, me chama no WhatsApp”, mas ela não chamou, nem cadastrou o número dele, nada, o telefone tá lá. 

Então ela queria saber isso de vocês, né? Se, de repente, pode ter algum futuro nisso e se ela deve chamar ele pra conversar melhor. Aí eu não sei, ela também tá sem fazer nada, mas eu já tô achando a Betina meio amarradona, sabe? E aí depois se o cara for tranqueira? Porque já mentiu que era irmã e não é, ela viu, então eu falei pra ela: “Você devia ter feito o sinal assim ó, juntar as mãos um biquinho no outro assim, e falar “Eu vi, ó, vocês beijando”, porque aí já desmascarava logo, né? Pra saber qual que é a do cara, então não sei. E outra, o cara furou a quarentena, né? Com essa moça que foi lá, tem isso, então eu acho que se ela chamar ele no WhatsApp, ele vai querer furar a quarentena com ela, eu acho. 

Não sei, gente, eu tô achando… Não fui com a cara de Carlos, sabe? [risos] Não conheço, mas não fui com a cara de Carlos. Posso estar sendo chata, e não acreditando no amor aí, sei lá, em algo promissor, então deixem lá a opinião de vocês no nosso grupo do Telegram “Não Inviabilize”, dá um help aí pra Betina, se ela deve chamar o Carlos no WhatsApp, se ela deve dar sequência nisso, ou se ela desencana e começa a tratar ele de maneira cordial ali na varanda só e ponto. Eu não sei, eu não gosto do Carlos, a real é essa. Então, [risos] um beijo e até daqui a pouco.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.