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título: dentuça
data de publicação: 20/08/2021
quadro: picolé de limão
hashtag: #dentuça
personagens: mônica

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta] 

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei pra mais um Picolé de limão, e hoje eu vou contar pra vocês a história da Mônica. — Foi ela, inclusive, que escolheu o nome que a gente ia usar aqui nessa história. — Essa história já tem um tempo, a Mônica já tá formada tem uns anos e a gente vai contar a história de um romance que ela teve na faculdade. Então vamos lá, vamos de história. 

[trilha]

Então ela conheceu ali um cara que era super engajado em várias causas, um cara que apoiava aí a luta feminista, um cara super desconstruído, super zen, ele tinha um grupo de meditação… — Guardem esse detalhe. — Ele tinha um grupo de meditação só de caras, que ele usava ali também o grupo pra desconstruir aí algumas ideias, alguns temas em relação ao machismo. — E, gente, a Mônica disse que o cara era perfeito. — Além de tudo era bonito, era muito meigo com ela, muito fofinho e eles começaram ali um namoro, e a coisa foi fluindo super bem. Eles passavam muito tempo assim juntos, né? Porque eles faziam faculdade juntos, aí eles tinham ali um tempo de estudo, um grupo de estudo na biblioteca, que eles ficavam juntos, eles estudavam de manhã, à noite às vezes ele saíam pra comer juntos, então eles passavam muito tempo juntos, e aí eles foram ficando mais íntimos, né? Mais assim parceiros nas coisas. 

E a Mônica achava esse cara um máximo, inclusive ela foi apresentada para o grupo dele de meditação, que eram mais cinco caras. — Então ao total, seis caras aí do grupo. — E ela foi apresentada no grupo. E todo mundo tratou ela super bem. — Ela não foi acrescentado no grupo de WhatsApp, não, nem participou das meditações ao vivo também não. — Ela foi apresentada tipo, ah, eles foram tomar uma cerveja e ela conheceu o grupo ali. E aí o tempo foi passando, né? Intimidade aumentando, eles parceiros em tudo, a Mônica colocava a mão no fogo por esse cara. — Esse cara é a pessoa mais íntegra, bom caráter, que ela já tinha conhecido. — Ele tinha vindo de outra cidade, então ele morava num dormitório de estudantes e a Mônica tinha nascido naquela cidade, então ela morava com os pais, só que de final de semana os pais da Mônica eles iam para um sítio da avó da Mônica, então ela ficava sozinha em casa, e esse cara ia pra lá, e meio que passava o final de semana assim, sábado e domingo ali com a Mônica, só os dois. 

E sempre que esse cara estava lá na casa da Mônica, ele ficava muito ativo nesse grupo aí de WhatsApp. — Eles conversavam bastante, davam bastante risada. — E a Mônica achava isso super saudável assim, né? Que ele tivesse esse grupo aí de caras, né? Esses amigos, que eles desconstruíam ali algumas questões machistas, nã nã nã, e no final de semana X aí, esse cara foi pra casa da Mônica e o tema que surgiu ali — Que eles conversaram sobre bastante coisas — era “confiança”. E aí a Mônica falou que confiava 100%, né? Nesse cara, ele também falou que confiava 100% na Mônica, nossa, foi lindo. — Foi lindo. — Romântico, “Porque eu confio em você, você confia em mim, nã nã nã”, beijocas, tudo lindo. Isso no sábado durante o dia. No sábado à noite, eles começaram a tomar ali, umas cervejas e tal, e esse cara bebeu um pouco além da conta, isso já tinha acontecido antes, mas nesse dia ele pegou no sono ali no sofá e ele estava um pouco antes deles começarem a beber, muito ativo nesse grupo aí. — Do WhatsApp. —

E em determinada hora, um cara desse grupo, começou a telefonar, tipo ligar mesmo, fazer ligação pra esse cara, só que a Mônica não conseguia acordar ele, pra ele atender, e ela, viu que sabe quando você vê na tela bloqueada, tem um monte de mensagem? — Só que ela não conseguia ler as mensagens, né? — e ela ficou muito preocupada, ela falou: “Meu, sábado à noite, será que aconteceu alguma coisa?”, ele bêbado, eles nessa coisa de confiança aí, um sabia a senha do outro celular, e aí ela resolveu acessar o grupo, pra ver o quê que tinha acontecido, ela estava super preocupada. Quando ela abriu esse grupo, — O que a Mônica encontrou? — a Mônica encontrou várias montagens com foto dela, várias coisas que esse cara contava da vida dela pra esses caras, e no grupo, ela era chamada de “dentuça”. Assim, ela começou a ler, e ela meio que não acreditou, mas era tudo muito real, e ela de tão chocada, ela começou a tremer, mas ela falou: “Bom, não, calma”. — O que ela fez? — Fez vários prints, muito, muito, muito, muito, muitos prints… Subiu esses prints pela nuvem, para o celular dela. — Isso era sábado à noite. — Apagou qualquer rastro aí, dos prints, do celular dele e ficou quieta. 

No domingo de manhã, ela fingiu uma ressaca braba, falou que estava meio mal, que o pai dela tinha ligado pra ela ir para o sítio, ela passou o domingo sozinha chorando, mal e, na segunda-feira, ela faltou na faculdade, ela não atendeu mais ele. — Não bloqueou, mas não atendeu mais, então… — Ele, sei lá, achou que ela estava ainda passando mal, que ela estava no sítio, não tinha sinal. E na segunda ela foi numa gráfica, e mandou fazer cartaz — Cartaz, cartaz mesmo — de todos os prints, e aí ficava pronto dali dois dias, ela foi na segunda, quando foi na quarta, no final da tarde, ela pegou esses cartazes. Ela não tinha ido na faculdade esses dias, respondeu o cara assim, muito rápido, tipo, “Ah, tô me recuperando, tô aqui no sítio, tá sem sinal, nã nã nã”. Na quinta-feira, eles que estudavam na mesma classe, ela fez uma apresentação, ela falou: “Professora, eu preciso fazer uma breve apresentação aqui, posso?”, e aí ela botou os cartazes, gente. — Lógico que foi uma coisa super difícil pra ela — porque ali tinha muita coisa, né? Dela exposta. 

Só que esse grupo desse cara era super conhecido na faculdade, tipo “Ah, os caras legais”, e aí foi um auê. Foi um auê, porque esse cara levantou e rasgou alguns cartazes, mas aí a mulherada da turma ali foi pra cima dele, acabou saindo briga física, uma briga generalizada na sala, tiveram que chamar diretor, foi um auê. E aí ele e os caras do grupo dele foram afastados. — Tipo uma suspensão ali na faculdade. — Três deles desistiram do curso e os outros três, dois trancaram e ele, o princeso, depois da suspensão, voltou. Voltou querendo fazer um discurso de que ele tinha sido mal interpretado, que não sei que lá, mas aí as garotas ali fizeram, tipo um mini manifesto, né? Na faculdade. E ele também não aguentou a pressão e trancou também. E aí a Mônica, lógico, passou um tempo mal, mas terminou o curso dela e saiu da faculdade, só que a faculdade tem aquela coisa, né? De tempos em tempos você tem ali um encontro e esse cara que ela namorava nunca foi nos encontros, e os outros caras que eram de outras turmas também, ela não sabia se ia porque não era turma dela. 

Só que num desses encontros ela ficou sabendo que ele tentou voltar, né? — Reabrir o curso. — Só que uma galera… — Porque gente, essas coisas acabam parando na internet e tudo — uma galera descobriu o que ele tinha feito e muita gente tinha tirado foto também dos cartazes, e aí fizeram de novo uma exposição dele, e aí ele teve que sair definitivamente daquela faculdade, foi transferido, sei lá, ninguém sabe. — Foda-se ele. [riso] — E a Mônica queria contar essa história, porque assim, ele era um cara para a Mônica, acima de qualquer suspeita, eu se me fala que o cara tem um grupo só de caras pra debater machismo e fazer meditação meu pé já vai lá atrás. — Odeio. — [riso] Essa fórmula aí do esquerdomacho assim, tem algumas coisas que gritam, né? Então eu já ia ficar cabreira, dependendo discurso do cara eu já fico bem cabreira. Mas para Mônica ela jamais imaginou que esse cara ia ter um grupo pra falar dela, pra falar do corpo dela, pra falar da aparência dela, dando o apelido dela de dentuça. 

Ela que escolheu esse nome, porque ela falou: “Andréia, eu quero que marque, e uma dentuça que a gente conhece é a Mônica, né?”, ela que escolheu também o título dessa história, foi o título do e-mail dela: “dentuça” e, poxa, ela jamais imaginava que os caras podiam ser tão cruéis e fingindo que eles tinham grupo antimachismo aí, né? Pra desconstruir algumas coisas, enfim, uns cretinos, né? Ainda bem que a Mônica se recuperou e tá bem, mas eu imagino o baque, né? Como foi… A coragem que ela teve de expor isso na faculdade. — Sem ter dado uma cadeirada na cara dele, porque a primeira coisa que ela podia ter feito quando ela chegou em sala de aula, era ter pego uma cadeira e ter dado na cara dele, né? Não estou incentivando aqui a violência, é somente uma hipótese aí, né? Uma coisa que fica aí para o lúdico, pra gente imaginar a cara dessa criatura tomando uma cadeirada, tudo aí no campo da imaginação. —

[trilha]

Assinante 1: Oi, gente. Oi, Déia. Meu nome é Patrícia e eu sou da Bahia. Mônica, o que a gente mais vê, né? E principalmente nesse ambiente acadêmico, é essa galera, né? Esses caras esquerdomachos que fingem que se importam com as causas, mas no fundo eles são tão… Acho que até mais podres do que a galerinha que é preconceituosa assim explícita, né? O que eu mais vejo são os caras que fingem que são a favor do movimento feminista, mas estão sempre fazendo piadinha, não corrigem os amigos machistas, protegem amigos que cometem abusos, então assim, acho que você fez pouco, viu? Amei a revolta, amei você ter feito toda essa apresentação com os prints, mas eu acho que eu não aguentaria, eu partiria pra porrada. 

Assinante 2: Oi, Não Inviabilizers. Eu sou a Renata de Joinville, Santa Catarina. E queria te dizer, Mônica, que eu te venero mulher. Eu nunca teria tido essa ideia de expor ele na faculdade. Esse episódio só deixou uma moral pra gente, nunca acredite nesses homens que falam que são feministas, good vibes, meditação, zen… Eu seria igual a Déia, se fala que tem um grupo com caras pra discutir antimachismo, meu pé já estaria um quilômetro atrás. Enfim, espero que você seja feliz, Mônica, nunca mais encontre esse traste, e vou levar uma ideia de vingança pra vida. [risos] É isso, beijos, pessoal.

Déia Freitas: Então é isso, essa é a história da Mônica. Um beijo, Mônica, você é uma querida e foda-se esses caras aí, desse grupo, que ódio. Um beijo, gente. 

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.