título: imigração
data de publicação: 19/02/2024
quadro: picolé de limão
hashtag: #imigracao
personagens: giovanna e um cara
TRANSCRIÇÃO
[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei para mais um Picolé de Limão. — E hoje eu não tô sozinha, meu publiii… — [efeito sonoro de crianças contentes] Quem tá aqui comigo hoje é Sesc São Paulo e o podcast “O Curso da Vida”. Envelhecer é uma preocupação para muitas pessoas e questões como “Como vai ser o amanhã?”, “Quando vou me aposentar?” Ou ainda “quem vai estar comigo na velhice?” rondam sempre a cabeça de muita gente… Se pensar nessas questões faz parte aí do seu interesse, ouça o podcast “O Curso da Vida”, um podcast do Sesc São Paulo já disponível no site sessp.org.br e em todas as plataformas de áudio. Todos os episódios de O Curso da Vida já estão disponíveis e ele é apresentado por Renan Sukevicius e Juliana Dantas.
O podcast é muito legal, a gente tem um público muito grande aqui de pessoas na terceira idade, na melhor idade, idosinhos que eu amo e eu vou deixar o link certinho aqui na descrição do episódio. Vale muito a pena ouvir esse podcast. E hoje eu vou contar para vocês a história da Giovana. — Pode ter aí alguma zona cinza, [risos] mas tudo que eu digo que a zona cinza vocês acham que é normal, então pode ser que não tenha zona cinza. —
Só um adendo aqui: Essa história é específica destas pessoas, tá? Da moça que me mandou e do cara. Essa história não é sobre outras pessoas que não sejam as pessoas da história, tá? Isso é muito importante a gente deixar aqui bem certinho, tá? Então vamos ouvir a história só como uma história, tá bom? Então vamos lá, vamos de história.
[trilha]A Giovanna ela trabalha no ramo farmacêutico, numa grande, grande, grande indústria… E ano passado o gerente dela falou: “Que você ocupasse uma vaga lá no estado X dos Estados Unidos”. Giovanna que nunca tinha pensado nessa possibilidade, falou: “Ô, acho que é bom, hein?”, e aí foi ver tudo da vaga, o inglês dela é excelente… Ela falou: “Bom, acho que eu quero sim…”, e aí conversou com a mãe dela, a mãe dela falou: “Olha, também acho que é uma boa oportunidade, né? Você já está bem aí avançada na sua área de trabalho, eu acho importante sim que você vá e que você faça essa experiência. Se não der certo, você volta”. — A empresa deixou isso aberto pra Giovanna, né? — E ela falou lá pra empresa que queria, né? Acontece que Giovana tem um namorado e depois ela comunicou o namorado.
Muita gente pode achar que ela tá errada, mas ela ia falar com o cara, o cara provavelmente ia falar: “Ah, não sei…”, você vai pedir pro seu namorado se você pode trabalhar em outro lugar? Acho muito estranho isso. É 2023, né? E ele ficou em choque. E aí tinham dois caminhos: Namoro a distância, o que provavelmente não daria certo, porque se desse certo lá a vaga pra Giovana era uma coisa que ela ia ficar por lá ou depois de um tempo, se o cara quisesse, ele podia tentar ir pra lá, mas é aquela coisa: A Giovanna estava indo com um emprego que ela já tinha aqui, então ela só ia ser transferida para a filial de lá e com um apartamento da empresa pra ela morar… Um apartamento pequeno, mas só pra ela. — Quem paga o aluguel é a empresa, então é outro cenário… Do que você largar seu emprego aqui e ir pra lá, né? — [efeito sonoro de avião decolando]
Giovanna foi, chegou lá e curtiu, o ambiente de trabalho super bacana, assim, gente do mundo todo… — Então não ficava aquela coisa meio que de americano enchendo o saco, sabe? — Ela trabalhava ali com gente do mundo todo, tinha muita coisa para trocar de experiência. O apartamento que ela estava era bem gostosinho, num lugar bem bom e: “Bom, agora é isso… Minha mãe eu pago pra ela vir me visitar, pelo menos, sei lá, a cada seis meses, né?”. — Importante a visita da mãe, e aí o namorado vê o que faz, né, gente? Porque é isso, a vida é isso também, né? Porque você vai deixar de ascender ali na sua carreira por um namoro que “ah, o cara ficou chateado”, não tem como, né? — Giovanna continuou aí com esse namoro meio à distância… Paralelo a isso, ele começou a fazer um movimento para sair do seu emprego. — Em nenhum momento a Giovanna falou: “Olha, saia do seu emprego e venha para cá”, mesmo porque a realidade de um brasileiro chegando nos Estados Unidos para trabalhar, você vai fazer o que? Você vai trabalhar na pintura, você vai limpar banheiro, você vai limpar casa… É isso aí, gente… A não ser que você vá como a Giovanna foi, transferida da sua empresa de cá, é outra coisa, é outro cenário, né? —
Então ele largou o emprego… — Do mesmo jeito que ela fez o que ela queria, ele também pode fazer o que ele quer. Não acho que ele errou. — Ele largou o emprego e falou: “Olha, eu vou visitar você aí, que eu estou com saudade”. Giovanna ficou feliz, que seria uma visita. Ele falou: “Eu vou, fico um mês e volto”. E esse namorado dela ele ia ter que aplicar pra um visto de turista e uma coisa que a Giovanna pediu pra ele: “Quando você for preencher o seu formulário pra aplicar lá para o visto, não coloque que você me conhece e nem coloque que você vai ficar na minha casa, porque eu não posso confirmar essas informações para você, porque estou aqui muito cedo e, se der algum problema para você, pode dar para mim”. — Eu não sabia disso, gente… — Então ele teria que falar ali que ele não conhece ninguém dos Estados Unidos e que ele ia ficar num hotel. Giovanna não queria esse vínculo no visto. E aí assim foi… Ele conseguiu o visto de turista pra ir pros Estados Unidos a passeio… Ele pegou um voo mais barato, então foi pra um outro estado e de lá ele ficou realmente quatro dias num hotel para depois pegar um voo interno lá para o estado que estava a Giovana. — Como eu disse pra vocês, Giovanna morando aí sozinha. —
Assim que ele chegou, ele já colocou mil defeitos no apartamento. [risos] — Já odeio… — É um prédio de cinco andares, só que sem elevador e ela mora no quarto andar e ele já reclamou disso, que ele teve que subir com as malas… — Ele podia não subir, né? E ficar num hotel… [risos] Opção ele tinha… — Ela saía para trabalhar cedo e voltava final da tarde e: “Nossa, por que você não conseguiu sair mais cedo para me levar para ver tal coisa?”, “Ah, porque eu queria passear”, “Ah, porque eu fico aqui”. — E gente, isso vale para o Brasil também, tá? Quando você vai passear na casa de alguém, você tem que ser aquele hóspede que faça com que a vida da pessoa que está te hospedando não vire um inferno, que não saia tanto da rotina. A pessoa durante a semana ela está trabalhando, ela tem a rotina dela, então o mínimo que você pode fazer, já que você está enfiado na casa dessa pessoa, é não atrapalhar a rotina. — Aí a Giovanna falou pra ele: “Escuta, a porta está trancada?”, “Não entendi”, “A porta está aberta, você pode sair e passear a hora que você quiser”.
Aí ele já achou que a Giovanna foi grossa. [risos] — Eu achei que ela foi, olha… Simpática. — E aí começaram essas pequenas coisinhas, dele enchendo o saco porque ela chegava às vezes 18h e ele queria sair pra jantar e ela tava cansada… — Então, em vez de ele ter ido pra lá para ficar com ela, que era esse o objetivo, ele foi pra turistar. Acho que ele tá certo em turistar? Acho, mas ele podia turistar a hora que ela tá trabalhando e ficar com ela a noite, sei lá, né? — Passou um mês e este cara não foi embora… E aí a Giovanna perguntou, né? Falou: “E aí, eu sei que você saiu do emprego lá e tal, mas como é que vai ser? Que dia você vai embora e tal? Só para me organizar”. [risos] Giovanna já tava querendo que ele desse área. [risos] E aí o bonito virou para Giovanna e falou assim: “Olha, eu não vou embora, eu vou tentar um emprego aqui”. — E aí, gente, dá uma complicada… Porque, assim, você tá com visto de turista, você não pode trabalhar. Muita gente trabalha? Muita gente trabalha, mas o ideal, se você quiser mudar o seu visto então, é você tentar um curso, alguma coisa… E ainda, assim, dependendo do visto de estudante que você conseguir, você só pode trabalhar se for dentro da escola ou da faculdade que você for estudar e, tipo, tem um X de horas. É isso… —
E aí a Giovanna já falou: “Mas como assim, você vai trabalhar ilegal?” e ele: “É, ué, depois eu me viro”. — Gente, não existe isso de “depois eu me viro”, entendeu? [risos] Existe a deportação, é isso que existe… — E aquilo já preocupou a Giovanna, porque assim, ela tá hospedando um cara que vai trabalhar ilegalmente e o dela tudo certinho ali… E aí o cara ficou e ele conseguiu lá por um grupo de brasileiros um emprego desses, assim, de pintor de parede, pequenos consertos, essas coisas… E ganhava muito pouco e trabalhava muito. Então ele chegava muito cansado, e aí ele começou a fazer uma bagunça… Tinha dia que a Giovanna chegava e estava tudo sujo as coisas, ele trabalhando com tinta, não tinha cuidado, às vezes sentava na poltrona dela com a roupa suja de tinta, enfim, a casa tava imundice já… E ela tinha que chegar, tinha que arrumar tudo, enfim… Dois meses desse inferno.
Até que um dia, a Giovanna ligou para ele desesperada que a polícia de imigração tinha baixado no apartamento. — Porque ele saía antes que ela pra trabalhar, né? — Que ela ia juntar as coisas dele e ia deixar lá na casa de não sei quem do grupo, que o pessoal do grupo também estava super assustado e que era melhor, enquanto ele não tinha sido localizado, ele sair pelo México, porque aí ele saía legalmente ainda e comprar uma passagem do México para o Brasil. E aí o namorado dela ficou desesperado e fez isso, né? Saiu dos Estados Unidos pelo México, pela fronteira normal, com seu passaporte com tudo… — Ele estava dentro do prazo de turismo, só que ele não estava fazendo turismo, né? Ele estava trabalhando. — E comprou um voo do México para o Brasil e voltou para o Brasil. E tem uma questão que, assim, se você fica com uma anotação lá — eu acho que em qualquer país é assim —, para você entrar de novo, é complicado, né? A Giovana ainda está levando esse namoro a distância, mas ela acho que tende a acabar. Ela já veio pro Brasil duas vezes e ficou com ele e tal, mas ele está com medo de voltar para lá e, de repente, nem conseguir entrar… — E aí depois ele não consegue entrar nunca mais. —
Essa é a história da Giovanna e agora aqui a gente precisa fazer [risos] um parêntese. [risos] Os policiais de imigração que entraram em contato com a Giovanna não existem, [risos] não existem. A Giovanna inventou toda essa história para o namorado dela ir embora e nunca mais voltar pros Estados Unidos. [risos] — Ai, desculpa… É horrível? Eu acho horrível, gente… Porque ele ficou muito assustado e até o grupo lá de brasileiros trabalhando nos Estados Unidos também… O grupo também ficou assustado. [risos] — Ia dar os seis meses, ele ia ficar ilegal, então foi melhor assim… Porque ele ficou um tempinho e vazou, né? Ficou aí, sei lá, três meses e foi embora. [risos] E o susto que ele ficou assim, né? Ele nem pensa em voltar… — Porque acha que ele vai chegar lá para entrar nos Estados Unidos e não vão deixar. —
Giovanna não vai desmentir… Giovanna ela falou: “Eu tenho um apego emocional com ele que eu estou trabalhando isso em terapia e eu vou largar ele e é isso… Porque não teve a menor condição. Esse tempo que a gente passou juntos, sei lá, três meses, ele fez da minha vida um inferno. Ele é folgado, ele não ajuda, ele não trouxe dinheiro, sendo que ele fez um acordo na firma e recebeu uma indenização… Ele não trouxe nada de dinheiro, eu que bancava tudo, ele deixava a casa toda suja. E aí arrumou esse trabalho ilegal, que poderia me prejudicar… Ele não pensou em mim. Então aí eu pensei e bolei na minha cabeça que eu ia inventar que a polícia da imigração veio aqui atrás dele e é isso”… [risos]
É errado? É errado… Giovanna se arrepende? Não se arrepende. E ela tá fazendo tudo pra terminar com ele, assim, que seja ameno para ele também, né? Então eu acho que a distância também vai acabar separando os dois de vez. Mas a Giovanna escreveu para a gente para saber se foi muito errado. — Foi errado, Giovanna. [risos] — Mas ela quer saber do grupo se foi muito errado ela ter aí inventado uma polícia da imigração [risos] atrás do cara. E é isso, assim, ele morre de pânico agora, não quer voltar, não. Aí fica também pressionando a Giovanna para ela voltar… — Ela está com a vida ótima lá, gente, ela não vai voltar… Tem isso. — É um relacionamento que meio que vai acabar, eu acho. Por mim é: Termina, já devia ter terminado a hora que ele falou que ia trabalhar ilegal, que podia te prejudicar… E eu não sabia disso, que podia prejudicar mesmo. — Inclusive, Giovanna podia até ser demitida. –
Assinante 1: Oi, Déia, oi, Não Inviabilizers, aqui é Aline Maria, eu falo de Ilhabela, no litoral de São Paulo. Essa história da Giovana me faz muito pensar sobre a comunicação entre casais, enfim, em qualquer tipo de relacionamento, né? Para além de dizer aqui se eu acho que a Giovanna fez certo ou fez errado, eu acho que de uma maneira geral, a gente tem muita dificuldade de comunicar os nossos limites, porque é difícil para as pessoas ouvirem que sua parceira ou seu parceiro não vai topar algo que para você está tudo bem… Mas se para outra pessoa não está tudo bem, essa pessoa precisa ter espaço para falar e para ser ouvida, para se colocar. Eu acho que a Giovanna teve que partir para uma medida extrema porque ela não sentiu que o companheiro dela ali ia ouvir os motivos pelos quais ela não topava aquela situação. Mas acho que fica aí a reflexão para que a gente consiga cultivar relações de boa comunicação e sinceridade. Um beijo, gente.
Assinante 2: Oi, Não Inviabilizers, meu nome é Elise, sou de São Bernardo do Campo mesmo, mas moro em Oakland, Califórnia. Giovanna, que situação complicada, mas o que eu queria te dizer é: Passou da hora já de transformar esse namorado em ex, né? Eu sei que é um processo, mas assim, não é legal, não foi legal… Acho que o cara tá enganado aí, né? Por mais que ele estivesse errado aí de estar encostado na sua, bagunça na sua casa, invadindo seu espaço, ele merece saber a verdade. Eu já tive, mesmo tendo com visto tudo certinho, tive uma ameaça desse tipo assim no começo de imigração, foi muito traumático, não é legal, acaba afetando as pessoas ao redor também. As pessoas que estavam trabalhando com ele, se ficaram sabendo, também ficaram provavelmente muito assustadas. Então, assim, não crie esse tipo de de fic aí mais não e termine esse namoro, viu? Deixa esse moço viver a vida dele e você viver a sua aí com muito sucesso, tá bom? Um beijo.
[trilha]Déia Freitas: A tendência brasileira é de uma vida cada vez mais longeva e o podcast “O Curso da Vida” debate temas da vida pela ótica do envelhecimento. Os programas são baseados nos conteúdos da revista “Mais 60”, do Sesc São Paulo — destinada a estudos sobre o envelhecer — e já abordou temas como: Com que roupa eu vou envelhecer? O que é gerontecnologia? Quem cuida de quem cuida? E diversos outros temas… Ouça o podcast O Curso da Vida no site sescsp.org.br ou na sua plataforma de áudio preferida. Todos os episódios da temporada já estão aí disponíveis. — Valeu, Sesc São Paulo…. Eu amo o Sesc. Tudo que o Sesc faz é maravilhoso. Tudo, absolutamente tudo… Desde um almoço, um show, um podcast, o Sesc é o Sesc. — Um beijo, gente, e eu volto em breve.
[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]