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título: marmanjo esperança
data de publicação: 15/10/2021
quadro: picolé de limão
hashtag: #marmanjo
personagens: valéria e jair

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei pra mais um Picolé de Limão, e hoje vou contar para vocês a história da Valéria. — Ê, Valéria… [risos] — Então vamos, lá vamos de história. 

[trilha] 

A Valéria conheceu um cara aí e se apaixonou. E eles começaram a namorar… — E eu não queria dar um nome pra esse cara, mas a história vai ser meio longa, então eu vou dar um nome pra ele aí, que vai ser Jair. — Aí a nossa amiga Valéria começou a namorar aí o Jair e tudo correu muito bem, eles estavam muito apaixonados e Jair morava sozinho, só que nunca tinha levado Valéria no apartamento dele. Então eles ficavam ou na casa da Valéria — Valéria dividia a casa com uma moça. — ou iam para um motel, enfim… E aí como deu ali quatro meses de namoro, o Jair apaixonado falou: “Olha, Valéria, eu estou muito apaixonado e eu queria te convidar para morar comigo”. E Valéria: “Meu Deus, né?” — Meu Deus, o amor da minha vida, Jair… [risos] — 

“Vou, aceito”. — Só que assim, Valéria nunca tinha ido na casa de Jair, como que você aceita morar na casa de uma pessoa que você nunca foi na casa? Com quatro meses você nunca foi na casa de um cara que mora sozinho? Estranho, né? — E Jair falava que o apartamento era dele. — Dele… Apartamento próprio. — Então, né? Não ia ter aluguel e nã nã nã. Só que ela dividia a casa com uma moça, aí ela falou: “bom, eu preciso de um tempo até arrumar uma outra pessoa para ficar no meu lugar porque a minha colega não consegue pagar o aluguel sozinha e nã nã nã, mas eu queria visitar sua casa também, nunca fui lá… Como que eu vou morar com você?” — Aí Jair falou: “Ah, então eu vou fazer um jantarzinho aí pra gente e você vai conhecer minha casa”. 

Aí tá, chegou o dia do jantar… Valéria se arrumou toda, falou: “ai meu Deus, vou conhecer a casa do Jair, que futuramente vai ser a minha casa”. Chega lá na casa de Jair… — E, assim, gente, eu acho que tudo é um sinal. Tudo é um sinal. — Chegou lá no apartamento de Jair, aqueles prédinhos sem porteiro, né? Então ela tocou o interfone lá, Jair destravou o portão, Valéria subiu… — Prédinhos daqueles de três andares, né? — Então foi lá, subiu a escada, é no terceiro andar, chegou arfando lá em cima. — [risos] Sem ar… É tu todinha a Valéria. — E aí quando ele abriu a porta do apartamento, que Valéria entrou, [risos] o apartamento estava praticamente vazio. — E, assim, tudo bem um apartamento vazio, rústico, com poucos móveis, acontece… A pessoa pode estar começando, mas não era o caso desse cara, entende? Ele tinha ali um carro bom, ele aparentava estar num outro patamar de vida assim… Então é estranho esse apartamento desse jeito, com este cara… O que tinha no apartamento? — 

Você entrava, seria uma sala ali integrada com uma sala de jantar, então tinha… Sabe aquelas mesinhas de marca de cerveja? É uma mesa que… — Eu até tenho aqui… — É uma mesa quadradinha de lata que vem com quatro… — De ferro, né? — Com quatro cadeirinhas de lata. E pode ser branquinha… Dependendo da marca de cerveja pode ser amarelinha, né? E a dele era a amarelinha, da PôneiKol. [risos] — E aí ela entrou tinha uma mesa dessa, onde seria o lugar ali da mesa de jantar, não tinha TV e tinha ali na sala, onde seria o lugar que você põe no sofá, essas coisas, tinham alguns caixotes e um cavalete que seria a mesa dele. Um cavalete com uma tábua e uma cadeira que seria — [risos] Bem rústico, né? — a mesa dele de escritório. 

Aí Ia para a cozinha, tinha uma geladeira, um fogão e só… E, tipo, sei lá, quatro pratos, alguns talheres… — Assim, a casa pelada. — Aí tinha o tanque ali, não tinha máquina de lavar e, no quarto dele, a cama dele era dois paletes daqueles maiores e o colchão. E mais nada no quarto, nada. E aí as roupas dele — Que também parece que… A Valéria falou que não tinha muita roupa. — Estavam assim, tipo, sabe quando você pega… — Sabe como chama aquilo, gente, não é um caixote… — Eu não sei o nome, mas é um negócio de madeira lá, rústica também e botou roupa dele. Então era assim a casa dele. Tinha um quarto só, quartos, sala e cozinha ali. — E, gente, assim, muito, muito, muito rústico tudo, né? — 

E aí a Valéria ficou assustada, porque, né? Não tinha condição dela morar ali. E aí o banheiro também normalzinho, simplesinho, mas também onde você coloca, sei lá… Onde você teria um armarinho ali para pôr as coisas era um caixote também. — Casa cheia de caixote. — Daqueles de feira, sabe? De madeira. Não tinha a menor condição da Valéria morar ali, né? Ela não ia sair do conforto do apartamento que ela estava dividindo com a amiga dela para morar ali com o Jair, mas ela já estava ali, né? Jair todo felizinho… Jair tinha falado que ia fazer um jantar. — Não tinha falado, gente? — Sabe qual era o jantar do Jair? Cerveja e macarrão instantâneo, Pôneiojo. —Ô, gente… Sabe, vou sair da minha casa para comer Pôneiojo com cerveja? Então, pra mim, já era um sinal… Tipo: “corre, Valéria, corre”. 

Mas Valéria achou que ele era assim, um cara muito desprendido, sabe? Mas o apartamento dele era próprio ali então ele estava bem, né? E aí Valéria comeu ali o seu Pôneiojo de tomate, — [risos] Com sua cerveja. — e ficou por lá. — Passou a noite com ele lá. — No dia seguinte ela voltou para casa e, assim, era uma coisa a se pensar, né? Não tinha como ela morar ali. Aí ela falou pra ele, falou: “Olha, eu preciso de um pouco mais de estrutura pra gente morar junto, do jeito que tá não dá e nã nã nã”. A frase de Jair foi: “Você pode mudar tudo aqui, tudo o que você quiser colocar você pode colocar”. 

E Valéria ficou feliz com isso, né? — Só que Jair não completou a frase… — Mas ali estava implícito que ele não ia pagar por nada. Tudo o que ela quisesse colocar no apartamento, ela teria que bancar. E aí, assim, Valéria… Ela até achou estranho… — Não estranho, mas você sente aquela pontinha… Lá no fundo do seu estômago assim… Você sente que é uma roubada, todo mundo sente. Mas você pensa: “não, não, não, bobagem… Imagina.” Então o que Valéria começou a fazer? Valéria começou a mobiliar o apartamento. Então nós temos aí a nossa amiga Valéria ONG, ela virou tipo um Criança Esperança do Jair… Que já era um marmanjo. Marmanjo esperança. [risos] — Ô, Valéria… — 

Aí lá foi Valéria na sua função de Marmanjo Esperança. Primeiro comprou uma mesinha e quatro cadeiras, depois comprou um sofá… — Vão fazendo a lista aí. — A TV ela tinha, a TV do quarto dela, então ela não ia precisar comprar. Ela tinha um rack também… Então ela comprou a mesinhas, as quatro cadeiras e o sofá, levou o rack dela, a TV dela, o micro-ondas dela e a máquina de lavar dela. E para o quarto, ela comprou um guarda—roupa, pra tirar as roupas de Jair do caixote. — Eu deixava, botava só as minhas no guarda—roupa. [risos] — Então veja a lista… — A lista de coisas, né? — E aí ela foi botando as coisinhas lá e se mudou para viver com Jair. 

E a vida estava boa tava boa, tava bom… Mais três meses ali de Jair, tudo perfeito, maravilhoso. Um dia ela está ali botando uma roupinha pra bater… Porque tem essa, Jair trabalhava de final de semana também, porque ele trabalhava num restaurante, então no final de semana ela não trabalhava, então ela fazia as coisas de casa ali. E ela estava batendo uma roupinha ali na máquina, quando ela ouve a chave na porta. “Eita, Jair voltou cedo, né?”. Quando ela olha, que ela tá lá na área de serviço, que ela anda pela cozinha pra falar “E aí, Jair, o que aconteceu? Voltou?” Ela dá de cara com uma mulher. — Imagina o susto, gente, de você abrir a porta… Quer dizer, você olhar pra porta e ter uma mulher entrando. — 

No que ela assustou, [efeito sonoro de mulher gritando] a mulher que abriu a porta também assustou… Porque além dela estar vendo uma mulher lá dentro, ela estava vendo uma casa mobiliado. E aí, gente… Olha o que o Jair fez. O Jair, casado com essa moça que entrou no apartamento, eles tinham mudado desse apartamento para um outro apartamento, numa outra cidade… E aquele apartamento é da moça, ou melhor, do pai da moça… E estava vazio. E não bastasse a moça estar entrando, quando Valéria olha, atrás da moça tinha um casal… Que a esposa de Jair… — Que nós vamos chamar aí de Michelle. — Que Michele estava trazendo para conhecer o apartamento. 

E aí a Michelle começou a gritar: “quem é você? O que você está fazendo aqui no meu apartamento? Não sei o que lá”. Aos berros… A Valéria em choque, completamente em choque, falou pra ela: “eu moro aqui com o Jair”. Aí, gente, vocês não vão acreditar… A Michelle largou os talõezinhos de cheque que ele estava na mão, jogou no chão ali e foi para cima… — Foi pra cima de Valéria. — E aí Valéria até tentou correr, mas foi agarrada… E aí aquela briga, e aí o cara que estava com a moça que foi ver o apartamento separou elas… E a Michelle falou pra ela assim, falou: “Olha, você vai ter uma hora pra tirar essas coisas daqui e ir embora se não eu vou chamar a polícia”, e ali a Valéria viu que era um negócio sério assim, a moça estava transtornada. — Transtornada. — 

E ela tentava ligar pro Jair e só caía na caixa postal. Ela não sabe se a hora que a moça saiu do apartamento a moça conseguiu falar primeiro com o Jair… Só sei que Valéria começou a ligar ali pros amigos e contar nos grupos das amigas o que estava acontecendo… Aos prantos, né? As amigas se mobilizaram, foi todo mundo para lá, uma conseguiu um carreto e conseguiram tirar tudo… Só não conseguiram tirar o guarda—roupa, porque precisava desmontar, né? A máquina cheia d’água… — Ela ainda teve que botar para centrifugar com a roupa suja mesmo. — Para poder tirar. Teve que sair com roupa molhada, que era a roupa que estava na máquina e pegar tudo… — Gente, foi uma loucura. — E ela pegou tudo, menos o guarda roupa que não dava para tirar, mas tirou tudo o que tinha ali dentro do guarda roupa. 

E o Jair não atendia mais ela… — Porque provavelmente ele sabia que já tinha dado esse B.O., né? E ele não atendia mais ela. E ela só queria uma explicação, né, gente? Pelo amor de Deus… E também o guarda roupa. Mentira, essa parte é minha. Porque ela falou: Ai, Andréia, desencanei do guarda roupa. Porque eu… Você sabe… Eu ia jogar ele lá de cima. Nem ele e nem eu com o meu guarda roupa, vai voltar com as roupas no caixote. — Mas ela deixou o guarda roupa lá pra ele e levou tudo… Ela devia ter levado o colchão então… Nem se fosse para jogar na rua e pôr fogo e ele ficava com o guarda roupa, para compensar. 

Mas enfim, ela não conseguiu falar com o maldito do Jair. — Nunca mais. — Ele só dava perdido, não atendia… Ela foi uma vez lá no restaurante e ele não saiu. — E aí é humilhação, né? Não precisa também. — Aí as amigas da Valéria falaram: “não vai mais atrás, pronto, acabou. — E, detalhe: ela teve que gastar ainda com guarda móveis porque ela não tinha onde pôr… Porque as amigas todas moravam, tipo, dividia apartamento e tal, então ela podia ficar num sofá por um tempo até achar um apartamento, mas não tinha onde botar as coisas. Então ela teve que correr atrás ainda de um guarda móveis que o próprio cara do frete conhecia… E ainda teve esse gasto. 

E aí eu te falo: gente, lá atrás, quando ele te levou para comer macarrão instantâneo na casa dele, com cerveja, o cara não… Sabe? Não pediu um delivery, sei lá… Já era um sinalzinho, né? O apartamento vazio também é um sinal, e a Valéria falou: “eu até questionei assim, mas eu estava muito apaixonada”. Então eu acho que a gente meio que sabe um pouco, sei lá, que vai rolar isso aí, ou alguma coisa está errada, né? Que vai rolar isso aí ninguém imaginava, que o cara ia ser tosco, enfim… — Maldito. — Jair maldito. Mas eu acho que no fundo a gente sabe que tem alguma coisa errada. A Valéria, a gente conversando, ela falou: “Eu sabia, no fundo eu sabia, mas queria viver aquele amor”. E DEU NO QUE DEU, né? Ainda bem que ela tem ótimas amigas e amigos também, que foi uma força tarefa. 

Talvez a outra ela nem fosse chamar a polícia, nada, mas ela falou: “eu não vou correr esse risco”, e ela estava toda unhada… — Não se machucou assim, mas foi aquele… — Aquele engalfinhamento ali das duas. E o covarde do Jair, o maldito do Jair nunca mais falou com ela. E ainda tem que… Você tem que elaborar aí esse luto e essa perda, porque ela, tipo, um dia de manhã estava dando beijoca no Jair e a tarde estava sendo expulsa do apartamento pela esposa de Jair. — Esposa… Né? — Então é isso, gente, essa é a história da Valéria, ela está bem já, por isso que ela veio contar pra gente a história. E só lamento também pelo guarda roupa que ficou lá, um guarda roupa robusto, bonito, enfim… É isso, gente, Valéria está bem, deixem seus recados, sejam gentis com a Valéria. 

[trilha] 

Assinante 1: Oi, gente, bom dia, aqui quem fala é Hanna do Rio de Janeiro. Cara, eu fico muito triste quando eu escuto essas histórias, e aí lembro também até de mim mesmo, porque eu me incluo nesse grupo, do quanto a sociedade nos cria para que a gente almeje um romance, um relacionamento, enfim… Porque é o que a Déia falou, a gente está vendo os sinais, que está tudo errado, o nossa sexto sentido está apitando, mas a gente está sempre buscando um amor, estar com alguém, que a gente ignora esse nosso sexto sentido e, pra mim, eu coloco muito a culpa disso nessa sociedade que projeta mulheres bem sucedidas estando num relacionamento, então a gente busca isso a qualquer preço. É uma pena, Valéria, mas que já foi tarde já, espero que você esteja bem, um beijo. 

Assinante 2: Oi, gente, oi, Déia, eu sou Ana Cristina, sou natural de Belo Horizonte e estou mandando essa mensagem para acalmar o coração de Valéria e de todas as mulheres que passam por esse tipo de situação horrível com esses caras lixos. Amada, pensa que você é a melhor pessoa dessa história e a pessoa que está na melhor situação. Explico: imagina você ser uma esposa que descobre uma traição quando entra no seu apartamento e tem uma outra mulher lá. Imagina você ser essa esposa e já culpar outra mulher… Imagina… Imagina você ser o sogro que empresta a chave da casa pro genro e ele faz uma cagada dessa. E o pior de tudo, imagina você ser um homem adulto que acha ok guardar as roupas em caixa e jantar Pôneiojo. [risos] Muito pior, né? A melhor coisa do mundo é ter história para contar. Segue sua história, segue sua vida e seja feliz, esquece essa gente. Beijos. 

Déia Freitas: Um beijo, gente. 

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.