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título: parquinho
data de publicação: 30/12/2020
quadro: picolé de limão
hashtag: #parquinho
personagens: lívia, cadu, nélia e irmã de nélia

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta] 

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei pra mais um Picolé de Limão. O Picolé de Limão de hoje é a história da Lívia e do Cadu. A Lívia que me escreveu e… — Bom, eu fiquei revoltada, vamos ver vocês. — Então vamos de história. 

[trilha]

A Lívia é casada com o Cadu já tem oito anos e eles tem um filhinho de seis anos. E o Cadu sempre foi um pai preguiçoso assim, ele não gostava de levar, por exemplo, o menininho na escolinha de futebol, se ele estava em casa com a criança ele preferia ficar no celular ou vendo alguma coisa na TV, e sempre sobrava pra Lívia. A Lívia é que cuidava mais do menino. E aí, gente, a gente tá falando de um ano antes da pandemia, esse cara mudou… — Cadu mudou — De repente, ele ficou num apego com essa criança que toda semana ele levava essa criança no parquinho do shopping. Então como que era o parquinho do shopping? O parquinho do shopping funcionava da seguinte forma, por exemplo, você vai ao cinema — São duas horas, né? — você podia pagar lá no parquinho do shopping, tinha vários brinquedos eletrônicos, várias coisas e muitos monitores, as pessoas contratadas lá pra brincar com as crianças, e aí você deixava seu filho lá, deixa seu RG, deixa tudo e ninguém consegue tirar a criança de lá, só você, e aí você vai para o cinema sossegado e a sua criança fica no parquinho. 

Era um shopping classe A assim, um shopping legal e ele começou a querer fazer isso toda semana, tinha dia que até dia da semana assim se ele não estava trabalhando, porque o Cadu tinha a própria empresa, né? Se ele não precisava ir pra empresa, ele falava: “Vamos lá, garotinho, vamos lá brincar”, e o menino, né? — Óbvio, né? — com um monte de brinquedo eletrônico e piscina de bolinha, escorregador, e brinquedo que voa e desce, e rapel e não sei o quê, caríssimo, não era barato, mas, né? Poxa, o pai estava dando tudo pra criança e a Lívia voltou a ficar apaixonada por este homem. — Tipo mais apaixonada, sabe quando você tá casado, tá meio acostumada ali com seu marido e aí o cara começa a fazer várias coisas incríveis e você fala: “Nossa, que homem maravilhoso, que homem encantador”. — E a Lívia é personal trainer e trabalha num lugar aí de CrossFit, então as unhas dela, a mão dela sempre foi assim meio calejada, não cuidava, não fazia a unha e tal, e ele sempre gostou de unha vermelha e aí ela voltou a fazer a unha, né? A ir numa manicure e a fazer a unha vermelha lá, porque ele gostava tal, como ele estava fazendo esse agrado — Que nem seria um agrado, né? Obrigação dele, vamos combinar. — de levar a criança no parquinho e passar um tempo com a criança e tomar sorvete, isso e aquilo, ela falou: “Ah, vou agradar ele também”, começou a fazer a unha ali toda semana, e era uma manicure que vinha em casa… — O nome da manicure e Nélia. —

E aí a Nélia ia na casa dela, fazia a unha, e às vezes ele estava lá e falava: “Oi”, e tudo certo. E a Nélia, assim, a Nélia não morava no mesmo bairro que eles… A Lívia e o Cadu tem um padrão de vida elevado assim, né? Eles não frequentavam os mesmos lugares nunca, até que um dia a Lívia estava voltando de um lugar, estava ela, o Cadu e a criança no carro e eles viram tipo um hortifruti grande assim, um sacolão grande, umas coisas que tinham umas promoções, ela falou: “Ai, gente, fruta é sempre bom, né?” e aí eles pararam, e aí os três desceram porque estava Sol, não dava pra ficar no carro esperando, mesmo com ar-condicionado, “Bom, vamos lá, né? A gente vê um monte de fruta”, e aí tinha aquelas frutas — Tipo um mercadão, mas não é um mercadão — umas frutas diferentes, aí eles compraram várias frutas, várias coisas. E aí quando ela estava quase já indo para o caixa, quem que ela encontra lá? — No sacolão — A Nélia. 

Nélia estava lá no sacolão, por quê? Porque o marido dela trabalha lá e ela tinha passado lá junto com a irmã dela pra pegar um dinheiro do marido que elas iam comprar não sei o quê e precisavam passar lá pra pegar o dinheiro. E estava Nélia e a irmã, quando o Cadu viu a irmã da Nélia, ele ficou roxo, azul, amarelo, de toda cor, quase caiu… — E aí isso a Lívia só ficou sabendo depois, porque na hora ela nem reparou que o Cadu tinha ficado passado. E aí a Lívia conversou com a Nélia, a Nélia até foi olhar a unha dela pra ver se ainda estava boa, ficaram conversando as duas e, tipo, ficou as duas ali né no tête-à-tête, conversando e meio que esqueceram o Cadu e irmã de Nélia. E aí passou, “Ah, tchau, tchau, quarta-feira você tá lá pra fazer minha unha?”, “tô”, “Beijo”, “beijo” e “tchau”, cada um tomou seu rumo, foi embora. 

Chegou na quarta-feira que era o dia de unha, a Nélia ligou de manhã pra Lívia e falou: “Olha, Lívia, acho que eu não vou mais conseguir atender aí nesse bairro, né? Tá meio puxado pra mim, não sei o quê”, a Lívia falou: “Pelo amor de Deus, Nélia, eu te ponho num Uber, eu pago o Uber, você vem de Uber, você volta de Uber, eu mando você pra qualquer lugar. Você precisa vir fazer minha unha, eu quero que você faça minha unha, que isso, que aquilo”, e aí a Nélia “Ai, não, porque hoje eu já preenchi os horários”, “Não, Nélia, pelo amor de Deus, amanhã que hora que você pode? Qualquer horário, que eu te boto no Uber, te pago o dobro, eu confio em você, vem aqui na minha casa, não sei o quê. A gente já tem um vínculo, não sei o quê”, e a Nélia não teve como falar não. A Lívia insistiu tanto, tanto, tanto, que a Nélia não teve como falar não. 

E aí no dia seguinte que era quinta, né? Porque o dia de fazer a unha dela era quarta, na quinta a Nélia foi lá, com uma cara desse tamanho assim redonda, sabe quando você tá chateada assim, sem graça? A Nélia falou pra ela assim: “Olha, eu pensei muito, provavelmente você não vai mais querer fazer a unha comigo, mas eu tenho que te contar”. — Eu tenho que te contar… — “Porque eu sou uma pessoa honesta e eu não gosto desse tipo de coisa… Você conheceu a minha irmã aquele dia, não conheceu? Ela não é bonita? Ela não é nova? Então, a minha irmã ela resolveu tomar um caminho na vida que a gente não interfere, a gente cresceu sem pai, sem mãe e se virou sempre do jeito que deu, eu faço unha, minha vida inteira eu fiz unha e a minha irmã não queria ter uma vida como a vida que eu tenho, então ela estuda, ela faz faculdade, mas pra isso ela trabalha num lugar muito chique, mas que é um lugar de garota de programa. A minha irmã é garota de programa e eu não tenho vergonha de falar isso, eu tenho muito orgulho da minha irmã, ela ajuda todo mundo, isso e aquilo”, e falou bem da irmã dela e tal. 

E aí falou: “Então… Seu marido é um frequentador assíduo lá do lugar que ela trabalha, ele vai lá toda semana e ele fica com as garotas lá, inclusive, já ficou com a minha irmã, minha irmã não quis entrar em detalhes, mas falou que ele pede umas coisas esquisitas, umas coisas diferentes, mas aí ele paga muito bem e ele vai lá toda semana. E eu queria te avisar, porque assim, lá tem uma regra de usar preservativo, mas os caras oferecem mil, dois mil a mais pra elas pra fazer sem e elas aceitam. Então você é mulher, eu sou mulher, a gente sabe das doenças e eu vim te contar tudo, eu sei que você não vai mais querer fazer unha comigo e é isso”, e já foi levantando, aí a Lívia falou: “Não, não, pelo amor de Deus”, já chorando, e aí quis saber mais detalhes, quis saber de que dia que ele ia, que horário que ele ia… — E, gente, bateu… — Os dias e horários do parquinho dele. — 

Ele largava a criança no parquinho pra ir sair com garota de programa. — Gente, não é sórdido demais um negócio desse? Envolver a criança, uma criança que ele nunca ligou, nunca ligou e, de repente, ele passou a amar, sair com a criança pra tudo quanto é lado e deixava a criança nesses parques, nessas coisas onde tem monitoria, onde tem gente que ele sabia que ninguém ia roubar a criança dele, eu estou chocada… —Chocada… E a Lívia ficou também chocada, falou: “Nélia, você não tem culpa de nada, mas agora minha cabeça tá girando. Eu vou te pôr num Uber, você vai embora, eu vou ver o que eu vou fazer”. — E aí óbvio que ela não aguentou, né? — Confrontou ele e tal e aí ele falou que era verdade, que ele gostava de ir lá e que ela nunca ia satisfazer o Cadu como ele tinha encontrado lá e, detalhe, ele falou pra ela: “Olha, se você for esperta, você continua comigo, a gente leva uma vida boa e é isso, e eu vou continuar indo”, falou isso pra ela, na cara dela que ele ia continuar indo, e aí ela ficou em choque, mas não conseguia… Ficou anestesiada. 

E na semana seguinte na hora que ele deveria levar o menino para o parquinho, o quê que ele fez? Como agora a Lívia já sabia, ele não levou mais a criança no parquinho, ele ia e… — Foda-se. — Além de tudo largou a criança, aí Lívia falou: “Ai, não vai dar mais, não vai dar mais, eu quero o divórcio, eu quero o divórcio”, ele não queria divorciar, porque para ele estava cômodo, e aí divorciou. Não foi litigioso, mas assim, foi muito trabalhoso, muito difícil, divorciou, ela continuou fazendo unha com a Nélia, elas combinaram de não tocar mais nesse assunto. A vida passou, veio a pandemia, ela tinha manicure toda semana com a Nélia, ela continuou pagando a Nélia e elas continuaram conversando, às vezes na hora que a Nélia devia estar lá, mas não estava por causa da pandemia elas faziam vídeo chamada e a Lívia mostrava a cutícula, tipo, “Ai, como eu faço? Empurro?” — Foi aprendendo a se virar pra fazer a unha ali toscamente porque não ia ficar num nível que a Nélia fazia — Foi fazendo, né? 

E comentando, até um dia que assim, do nada, a Nélia chamou ela em chamada de vídeo e aí falou pra ela assim, falou: “Você tá ainda conversando com o Cadu, né? Como é que tá as coisas? Vocês não voltaram não, né?”, ela falou: “Não, não, não vou voltar com esse homem de jeito nenhum, né? Não volto nem a pau”. — E aí, olha só, gente… — Ela tinha descoberto pela irmã que ele estava proibido de entrar lá porque ele tinha batido numa garota lá dentro, tinha espancado uma garota lá dentro, porque era uma garota que não era a irmã da Nélia, né? Que tinha falado que estava grávida dele. — Olha a treta… — Aí a Nélia falou que ele parece que estava respondendo processo, que a menina fez B.O., tudo, né? E agora no meio da pandemia a Lívia descobriu, porque ele não estava pegando o menino e ele não fazia questão, gente, ele pagava tudo direitinho, a pensão e aí agora no meio da pandemia a Lívia descobriu que ele tinha sido preso e falou: “Pronto, né? Agora, sei lá, matou, né? A menina… Sei lá o que aconteceu”. 

Aí foi ver atrás, ligou lá pro irmão dele, o irmão dele não queria muito comentar, mas acabou falando que realmente ele tinha batido na menina de novo e a menina estava internada. — Olha que coisa maluca… — E aí que ele estava preso, mas que parece que não ia ficar muito tempo preso porque ele não tinha passagem e foi como agressão, não foi como… — Tinha sido tentativa de homicídio, né? Feminicídio? Sei lá. — A menina topou parece que fazer um acordo lá com ele e falar que não foi bem assim. — Essas coisas, né? — E aí agora o bonito, olha que coisa boa, tem mais ou menos um mês e pouco, entrou pra igreja. — Owwwn, entrou pra igreja, virou santo agora. — E aí agora que ele entrou pra igreja o que ele quer? Ele quer retomar o casamento. — Ele quer retomar o casamento… — E como a Lívia não aceita, ele tá fazendo um inferno da vida dela, agora em relação a criança, porque assim, quando eles se separaram eles passaram o apartamento para o nome do menino e ela ficou como — Usufruto? É assim que fala, né? — usufruto lá do apartamento. 

Agora ele tá enchendo o saco, ameaçando que, se ela não voltar com ele, ele vai fazer alguma coisa pra ver se tira ela do apartamento, até falou assim: “Ah, então quer dizer que se você tá usando então o apartamento que é do nosso filho, eu tenho direito a metade de aluguel”. — Tá inventando coisa, sabe, enchendo o saco? — Porque ele quer voltar, porque perante lá a igreja que ele tá, o casamento é pra sempre… — Agora você acha que ela vai voltar com esse cara que largava a criança no parquinho lá, quase matou a moça, batendo na moça que estava grávida, a moça perdeu realmente a criança, sério? — É lógico que a Lívia não vai voltar, né? Mas ele tá fazendo da vida dela um inferno, ela já tá com advogado, tudo, mas ela queria contar a história dela que jamais, jamais, jamais, ela pensou que ele levasse a criança no parquinho pra poder sair de lá, deixar a criança lá e… — Sério, eu, no passado, uns dois anos atrás, eu recebi uma história, depois a moça resolveu não contar os detalhes porque ela acabou voltando com o cara, mas ela teve um bebê com o cara, e aí o cara saiu pra levar o bebê, não sei se era pra mãe dele ver, não sei, alguma coisa assim. E o cara parou no estacionamento e era um bebê na cadeirinha, um bebê, e ficou com uma menina no estacionamento, transou no banco da frente com o bebezinho atrás no banco de trás na cadeirinha, mas era um bebezinho tipo de meses. E óbvio, né? O bebezinho estava ali e não estava sabendo de nada, estava até dormindo… Mas olha isso, então nada me surpreende. Jamais pensaria, né? “Ah, vai deixar no parquinho pra ir no puteiro”, mas falar que estou surpresa, não estou. — 

Então a Lívia queria compartilhar a história dela com a gente, né? Desse cretino, desse Cadu e ela, óbvio, não vai voltar, e ele está atormentado, mas ela tem bons advogados também. E é isso, gente, olha… E olha só que coisa, foi parar num lugar das frutas e que lá estava Nélia que é a manicure dela e a irmã da manicure… — Gente, doideira, né? — Mundo micro. Eu acho bem feito pra Cadu, eu não acredito que ele mudou, essa coisa de igreja aí, a gente tem uns exemplos aí agora na mídia que a gente sabe muito bem, né? Do que algumas pessoas que se dizem religiosas são capazes. Então… Fica esperta, Lívia. Um beijo, comentem lá no grupo e daqui a pouco eu volto, beijinho.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.