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título: rim
data de publicação: 20/10/2021
quadro: picolé de limão
hashtag: #rim
personagens: alberto e cíntia

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei pra mais um Picolé de Limão. A história que eu vou contar para vocês hoje é a história do Alberto e da Cíntia, quem me escreve é o Alberto. — Essa história é antes da pandemia. — Então vamos lá, gente, vamos de história. 

[trilha]

O Alberto e a Cíntia eles se conheceram na faculdade, eles namoraram por dois anos e depois disso eles se casaram. A Cíntia ela sempre foi assim uma pessoa mais tranquila, mais caseira… Porque ela sempre teve um problema nos rins e que estava controlada, ela tomava remédio, mas ela não podia fazer assim muita extravagância e tal. Então ela e o Alberto eles tinham uma vida bem caseira. E super de boa assim, eles passeavam, se divertiam, mas tudo ali os dois, né? E aí a Cíntia foi cuidando, — Desse problema que ela tinha nos rins. — só que a coisa foi se agravando… E depois de quatro anos de casamento a Cíntia precisou entrar — Naquela questão de filtrar o sangue, né? E nem sei se eu estou falando direito, mas… — Ela começou a fazer hemodiálise. 

Aí a coisa foi piorando, e o Alberto ali desesperado. E a única solução para Cintia era fazer um transplante. — Ela precisava de um rim novo. — Aí testa irmãs, testa mãe, testa pai, testa Alberto… Alberto compatível. Nossa, felicidade total do Alberto, né? “Vou doar o rim pra minha esposa, ela vai ficar boa e tudo certo”. E aí assim foi feito. O Alberto doou o rim pra Cintia, ela se recuperou muito bem. — Ficou ótima. — E a vida foi caminhando, ela tinha que fazer ali uns exames a mais até ver se deu certo o transplante e tal, tinha aquela tensão no começo, mas eles foram lidando com isso juntos e tudo certo. 

— E aí aqui eu tenho que dar uma pausa nessa história, porque o Alberto quando ele me escreveu, ele escreveu até aqui e terminou o e—mail assim: “E aí tudo mudou e o pior aconteceu”… O que a gente pensa, gente? Eu recebo um e—mail desse, até esse ponto, onde tem uma moça doente que recebeu um rim e o Alberto termina um e-mail dizendo que o pior aconteceu. Óbvio que eu pensei que a moça tinha falecido, né? Que a Cíntia tinha falecido. E aí escrevi para ele assim apavorada, super preocupada e tal, e ele me respondeu assim: “Não, Andréia, ela não faleceu, ela me largou”. [risos] Primeiro um alivio, né? Porque a Cintia não morreu, já é muito bom, né? Segundo que, como assim, Alberta, “o pior aconteceu”? O pior seria ela morrer… Tipo, ela te largar não é o pior que pode acontecer. [risos] Na lista de prioridades do que seria pior, te largar ta tipo bem mais para baixo assim. —

E, assim, não teve traição, não teve nada… O que aconteceu com a Cintia? [trilha sono triste ao fundo] Ela sempre foi uma criança doentinha, uma adolescente doentinha, uma jovem doentinha… — Eu estou falando do jeito que ela explicou para o Alberto, né? Usando essa palavra, “doentinha”. — E foi uma noiva doentinha, uma esposa doentinha e agora ela estava se sentindo muito bem, e ela queria fazer coisas novas, conhecer novos horizontes… E ela achou que no casamento… O casamento tinha acabado assim. Já era há quase dois anos ali — Pós transplante, né? — e ela queria viver. Agora ela podia tomar líquido do jeito que ela queria, ela tomava cerveja… 

E o Alberto ficou em choque, porque primeiro ele não esperava que ela fosse pedir o divórcio. Aí eu falei: “Mas por que, Alberto, você não esperava que ela fosse pedir o divórcio? Porque assim, quando a gente está em um relacionamento isso pode acontecer, né? Não é assim uma coisa de “ah, não, a pessoa vai ficar com a gente para sempre”, a gente sabe que pode acontecer de o amor acabar”. — E aí ele me respondeu que achou que ela ficaria com ele a vida toda porque ele deu o rim para ela. [risos] Ô, Alberto, como assim? Que isso? Esse rim virou uma tornozeleira eletrônica? Uma corrente? Como assim ela tem que ficar para sempre com você porque você deu um rim pra ela? Você deu o rim para ela para ela poder viver assim, né? É um ato maior, um ato de desprendimento. Não é assim “eu te dou o meu rim e você fica comigo para sempre”, né? Se você tivesse falado isso pra ela talvez ela nem aceitasse o seu rim. Tem isso, né? –

E aí é que tá, o Alberto me escreveu porque ele não acha certo a Cíntia sair por aí beber e colocar… [risos] — Ai, olha… [risos] — Colocar o rim… — Ele se refere ao rim como rim dele, não é seu rim, é seu ex rim. O rim é seu ex, agora é o rim da Cíntia. — E aí o Alberto acha que ela está errada de beber e colocar o rim em risco. Quem disse que ela está botando o rim em risco? Ela está fazendo as coisinhas dela, está saindo de balada e está curtindo, porque agora ela se sente saudável e disposta. E o Alberto fica monitorando onde ela está e pensando, tipo, “ela está bebendo vodca no rim”. — [risos] Alberto, pelo amor de Deus, esse rim não é seu mais. —

Não é um empréstimo de rim, sabe? — Não é um leasing de rim. — Você não alugou o seu rim, você doou o seu rim, doação de órgão é uma coisa muito séria, muito importante para você ficar monitorando o Instagram da sua ex-esposa com ódio porque ela está usando o seu rim. E a gente sabe que, né? Não é o rim a motivação, você está puto porque ela está saindo, que ela está se divertindo porque ela está feliz… Você me falou que está super saudável também depois de doar o rim, então você pode também sair e se divertir, né? Por que não? Então assim, eu acho que você está errado, você virou a Polícia do Rim, né? — Virou a Polícia do Rim. —

Ela está levando a vida dela, o casamento não deu certo ou deu certo até aquele ponto, né? Eu não gosto de falar que não deu certo, tipo, deu certo até aquele ponto e ela foi viver outras coisas que ela nunca viveu, eu super entendo. Mas o que o Alberto gostaria de saber, é se vocês acham que também… Porque ele acha que a Cintia foi meio ingrata com ele, tipo, de pegar o rim e meter o pé, entendeu? [risos] Eu acho isso tão absurdo, Alberto, tão absurdo… Ela não ela foi ingrata, ela ficou com você. Ela gosta de você até hoje, você me falou isso. Tipo assim, na amizade, né? O que você quer que ela faça? Que ela te devolva o rim? Não vai te devolver, você doou. — Seu ex rim. Ex rim. — Então ele quer saber de vocês lá no nosso grupo do Telegram, que não tem o Telegram ainda, joga na busca lá “Não Inviabilize” que vai achar o nosso grupo. E é isso que o Alberto quer saber, se a Cintia foi ingrata, se ela tem direito de ir pra balada, de beber… — Como diz o Alberto, gastar o rim. [risos] É absurdo demais isso, gente. —

Eu acho que sim, ela tem o direito de fazer o que ela quiser com o rim que agora é dela. Eu não acho que ela esteja, vai, fazendo mau uso do rim, para usar as palavras do Alberto. Eu olhei o Instagram dela e está de boa, vai numa festa aqui e outra ali, às vezes posta ali que tá… — Essa história é antes da pandemia. — Então ela ia em festa, agora nem deve estar indo em festa porque ela é grupo de risco, né? Acho que transplantado é grupo de risco. Mas, Alberto, a questão é… — O que eu acho, tá? — Não é um problema seu. Eu acho que você tem que esquecer a Cíntia e é isso, sabe? Fica usando a desculpa do rim, “porque meu rim”, não é seu rim, é seu ex rim, tá? 

[trilha]

Assinante 1: Oi, aqui é a Paula de Marília, interior de São Paulo. E, pô, Alberto, eu te entendo muito, sabe? Eu também ficaria puta se eu doasse meu rim pro meu marido e ele me largasse porque ele quer viver sem mim, sabe? Mas assim, eu entendo você, só que é egoísmo nosso, né? O rim não é seu, como a Déia mesmo falou, é seu ex rim. Então, pô, bola pra frente aí, né, meu? Eu acho que divórcio é uma coisa traumática pra todo mundo, né? Não é só pra quem doou o rim pro outro, acho que pra você ficou um pouquinho mais traumático aí, né? Que você, pô, você doou o seu órgão, mas é difícil, né? Bola pra frente e vai pra uma terapia aí, vai pra outra pessoa, né? Felicidades, Alberto, mas olha, quero dizer que eu entendo você. 

Assinante 2: Oi, quem fala é a Bárbara, eu sou de Canoas, no Rio Grande do Sul. Alberto, em um término de relacionamento, a gente tende a se agarrar a coisas que a gente já deveria ter deixado ir, que nem o caso do seu rim, por isso que é uma doação. A Cíntia não tá sendo ingrata contigo, muito pelo contrário, ela preza pela relação que vocês tiveram, tem um carinho por ti, só que às vezes ela não pode mais te corresponder amorosamente com tu precisa. Então, tenta verificar se talvez essa pressão que tu faz com o rim, todo esse ressentimento que tu guarda não é porque ainda tem sentimentos, se sente triste da forma que acabou e procura tentar trabalhar com isso, porque as coisas não precisam ser assim, tá? Um abraço. 

Déia Freitas: E é isso gente, eu volto daqui a pouco, um beijo. 

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.