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título: sereia
data de publicação: 04/03/2024
quadro: luz acesa
hashtag: #sereia
personagens: ícaro

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei para um Luz Acesa. — Esse é um Luz Acesa que não é assustador, mas é o tipo de Luz Acesa que mais me impressiona. — E hoje eu vou contar para vocês a história do Ícaro. Então vamos lá, vamos de história.


[trilha]


Essa história aconteceu quando o Ícaro era uma criança e até a parte que não é assustadora, eu fiquei em pânico. O Ícaro criança — um menino aí dos seus nove anos —, sabe criança muito arteira, danada? Então, o Ícaro era assim, gostava de subir nas coisas… Ele… [risos] A mãe tinha que ficar sempre esperta para o Ícaro não subir em guarda-roupa e pular achando que ele ia voar… A família do Ícaro sempre ia pra praia nas férias — naquele mesmo esquema que a minha família, sei lá, 20 pessoas numa micro casa —, e aí eu vou dizer aqui uma praia que não é a praia que ele ia, então, digamos que Ícaro fosse com a família todo ano pra Itanhaém. Era uma casa de 3 quartos pra 20 pessoas. Então, assim, tinha gente dormindo na sala, nos quartos, na varanda, enfim, aquela coisa… E o Ícaro muito danado, gostava de sair escondido à noite, — A casa ficava mais ou menos há uns dois quarteirões da praia — pra ir ver o mar à noite, escutar o barulho do mar e ver ali as ondas. [efeito sonoro de barulhos das ondas do mar quebrando]

Desde que ele tinha sete anos — ele estava com nove quando aconteceu essa história —, ele fugia e ninguém via, porque assim, você ficou o dia inteiro na praia, aí você fica cansado e, depois quando você está em casa e tal, você dorme, você capota. E o Ícaro aproveitava que os adultos e até as outras crianças estavam dormindo pra sair de fininho e ir pra praia à noite. Pensa que perigo… De alguém pegar o Ícaro ou ele entrar no mar, enfim, qualquer coisa… Até que um dia, o Ícaro esperou todo mundo dormir… Ele acha que era de madrugada já, e a lua estava muito grande, assim, estava muito bonita… Então ele queria ir seguindo a lua e chegando lá na praia… E aí na praia ele andava, ele chutava umas conchas… E, detalhe: Ele chegava na beira da água. E aí esse dia ele foi seguindo a lua e foi até a praia, assim, e acompanhando ali, olhando a lua enorme… E o Ícaro não sabe o que aconteceu, mas nesse dia, o Ícaro tava com muita vontade de entrar na água… — A noite, gente… — Só que a lua tava muito grande assim, devia ser, sei lá, lua cheia ou lua nova e tava muito iluminado, assim… E ele falou: “Poxa, dá pra entrar na água… Tá tão claro, né?”. 


E aí o Ícaro que tava ali com seu pijaminha, tirou o pijaminha, ficou só de cueca e entrou na água. — Gente, de madrugada… Quem que entra no mar assim à noite, sozinho? Uma criança… Pra mim essa é a parte mais aterrorizante da história. — O Ícaro começou a pular as ondas ali, a brincar… Ícaro sabia nadar, o pai dele tinha ensinado, mas assim, uma coisa é você saber nadar, outra coisa é você estar no mar à noite, sozinho, criança, né? E aí o Ícaro começou a pular as ondas ali, brincar um pouco sozinho… Só que ele foi pulando onda e uma hora não deu mais pé… [efeito sonoro de tensão] E aí o Ícaro falou: “Eu acho que eu me apavorei, porque estava muito claro, mas de repente eu não sei se ficou escuro ou se eu, criança, fiquei apavorado e não sabia mais discernir nada… Eu não sabia para que lado nadar. Pra que lado era a praia”. E aí o Ícaro nadou pra lá, nadou pra lá, não achava, não via, não conseguia ver a praia… Ele não sabia o que estava acontecendo, parecia que ele estava no meio do oceano. E aí ele nadou, nadou — e criança — e ele começou a engolir a água… Ele começou a se apavorar e o Ícaro começou a afundar. Então, ele afundava e ganhava uma força, subia, respirava um pouco, afundava de novo…


E ele foi vendo que, assim, não ia dar pra ele mesmo… E depois de umas quatro tentativas dessa que ele afundou, ele foi largando o corpo, tipo aceitando que não dava mais. Nessa hora, o Ícaro sentiu uma mão no braço dele… Ele tava no fundo, puxando ele pra cima… Na hora ele não pensou em nada e ele pensou que, sei lá, alguém viu uma criança se afogando e foi resgatar, enfim, não passou nada pela cabeça dele. Quando ele subiu, essa mão levou o Ícaro até a superfície, essa mão ficou segurando ele… E era, assim, era uma mão que não estava apertando o braço dele para machucar, mas ele percebia que tinha muita força para deixar ele sobre a água, como se ele estivesse boiando, como se o Ícaro tivesse numa bandeja e essas mãos por baixo. Aí foi a hora que ele virou para ver de quem eram as mãos… [efeito sonoro de tensão] O que o Ícaro viu? Era um cabelo, assim, escuro, que ele não sabe dizer se era um cabelo muito parecido com a gente, porque parecia um cabelo mais grosso… Ele percebia que eram feições de mulher, mas era quase um peixe mesmo, mas era uma mulher. E no rosto dela a expressão que o Ícaro via era uma coisa, assim, ao mesmo tempo que ela parecia calma, que eu não ia devorar ele — porque ela tinha dentes afiados —, ela parecia brava. 

E aí ele percebeu que os braços… Porque a mão ele não conseguia ver, que a mão estava nas costas dele, as duas mãos, para segurar ele ali flutuando. Ele percebeu que os braços, que pareciam mais assim, humanos assim… E aí ela foi nadando, até uma parte que não era areia ainda, mas assim, sei lá, que ela não atolasse? — Será isso? — E aí, dali, ela arremessou o Ícaro na areia. E ficou ali, olhando ainda pra ele, pra ele não voltar pra água. Mas o Ícaro não ia voltar pra água, né? E ele estava ali molhado, assustado, mas vivo e vendo essa mulher, que o Ícaro acha sim que era uma sereia. Só que quando ele olhou em volta, ele não sabia mais onde ele estava e onde estava o pijaminha dele? Então, ele ficava por ali e ela não ia embora. — Porque, na minha cabeça, eu acho que ela estava ali para ele não voltar para a água, tipo dando bronca. — E aí o Ícaro foi andando pra esquerda, viu que não era o lado e ela ia pela água pra esquerda. — Só que ele não tava querendo entrar, ele tava procurando o pijama dele. — Aí ele voltou pra direita e falou: “Bom, eu acho que é por aqui” e achou o pijama dele, pegou o pijama… E o chinelinho estava um pouco mais pra frente, tipo mais perto da água, quando ele fez um movimento pra pegar o chinelinho, ela — que acho que pensou que realmente ele fosse voltar para a água — ela abriu… 


Pensa assim: A lateral do rosto dela abriu como a gente vê naquele filme do Jurassic Park que tem um bicho que abre assim, que vira, tipo, sei lá, parece um guarda—chuva… Ela abriu aquilo e fez um barulho, assim, tipo [grunhido], que era pra ele não voltar para a água. — Eu acho, né? Tipo: “Se você entrar que eu vou te devorar vivo, porque não é possível, né? Tava lá fazendo minhas coisinhas no meio do oceano, já te salvei e você quer voltar?”. Essa sou eu, sereia… Falava: “Entra aqui que eu vou arrancar sua cabeça agora”. — E aí ele assustou e não pegou o chinelinho e correu com o pijama na mão e chegou de mansinho… — Danado é assim, né? Aprontou, aprontou, aprontou… — Chegou de mansinho, deitou todo sujo de areia mesmo… E de manhã muita gente e tal, ninguém nem percebeu… E aí ele falou que ele perdeu o chinelinho dele, não sabia onde estava, não sabia onde estava e precisaram ir no mercado comprar um outro chinelinho para o Ícaro. Então, o Ícaro tem certeza que era uma sereia e que ela salvou ele do afogamento e depois ficou ali dentro d’água pra ele não voltar. 


E aí é óbvio que ela não deve ter visto o chinelinho dele, mas quando viu ele fazendo um movimento mais pra frente, aí ela ficou p da vida, porque, francamente, vai entrar de novo? Quase morreu… E aí, depois desse dia, o Ícaro nunca mais foi à noite para a praia. E até hoje, ele já é um cara de 40 anos, toda vez que ele vai para a praia, ele fica olhando, assim… O que ele falou para mim: “Andréia, parece que eu tenho uma saudade… De alguém que eu não sei quem é, que eu não conheço e que eu não sei que criatura que é, mas eu tenho uma saudade… Além de muita gratidão, eu tenho uma saudade, assim. Parece que sempre que eu chego no mar eu quero encontrar com ela, eu quero vê—la, eu quero, sei lá… De repente, agora que eu sou adulto, se ela aparecesse no meio do mar, eu ia atrás dela”. Louco isso, né? Então, ao mesmo tempo que ela era assustadora na aparência, sei lá, meio um peixe com os dentes afiados e tal, ela era muito encantadora. E meio brava… — Achei ela ótima. Achei a sereia, excelente, ótima… Ótima. — E me lembrou muito a história que eu já contei aqui, daquele cara no barco também, que viu uma criatura que eu não sei… Eu achei meio parecida. Eu acho, gente… Estou começando a acreditar que tem sereia. Será que tem sereia? Jamais irei ver, porque assim, tenho horror ao mar, tenho muito medo… Mas se tiver, eu espero que elas estejam seguras aí. 


E se precisar matar, gente, vamos matar gente, né? Porque elas precisam sobreviver e precisam fazer as coisinhas dela, então, né? Se tiver que matar, gente… O que a gente vai fazer, né? Eu sou Time Sereia, estou gostando demais dessa história e da outra história de sereia, que eu vou até reouvir, que eu não lembro muito bem, mas eu lembro que eu contei que era num barco e tal e que também essa sereia apareceu.


[trilha] 

Assinante 1: Olá, Não Inviabilizers, aqui é a Paula de São Paulo. Ícaro, acabei de ouvir sua história junto com a minha mãe, que é umbandista e, antes de terminar a história, ela já falou que foi Iemanjá que te salvou. Iemanjá aí, quando você já tinha perdido suas forças, Iemanjá salvou você… Iemanjá para minha mãe que é umbandista é a guardiã dos mares, a deusa do mar. Para ela, Iemanjá ficou lá de guardiã mesmo para você não voltar pro mar, mesmo não sendo essa a sua vontade, né? [risos] Óbvio, você tinha acabado de passar por esse afogamento… Eu acredito também que foi Iemanjá que te salvou. É isso, Ícaro, um grande beijo para você. 

Assinante 2: Oi, Déia, oi, Não Inviabilizers, aqui é Carolina, sou de São Paulo. Eu nunca tinha ouvido uma história assim sobre sereias, mas eu acredito totalmente, né? Dizem que 70% do planeta Terra é água e que 80% desses nossos oceanos ainda está totalmente inexplorado, então vai saber o que tem lá, né? Com certeza devem ter criaturas que a gente não faz a menor ideia e possivelmente sereias. E eu acredito também que essas criaturas não têm o instinto de fazer mal, né? Pelo contrário, eles têm o instinto de fazer o bem para outras espécies. Infelizmente parece que só o ser humano faz mal gratuitamente para outros. [risos] Então, Ícaro, muito legal, que privilégio você ter conhecido esse ser. É isso, boa sorte aí. 

[trilha]

Déia Freitas: Então é isso, gente, essa é a história do Ícaro. E depois disso também ele parou com a coisa de querer voar [risos] e já tinha quebrado o braço… Sabe criança danada? O Ícaro. Comentem lá no nosso grupo de Telegram, sejam gentis com o Ícaro. Eu amei a sereia, amei a sereia… Achei ela ótima, achei ela praticamente mãe do Ícaro, né? “Ó, menino, se você voltar aqui eu vou te dar uma coça”. É isso, [riso] então um beijo, gente, e eu volto em breve.

[vinheta] Quer sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.