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título: sônia
data de publicação: 14/10/2020
quadro: luz acesa – especial halloween
hashtag: #sonia
personagens: joão

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei pra mais uma história, Luz Acesa, e o nome da história é “Sônia”. Essa história eu contei lá no Twitter tem bastante tempo já, foi uma seguidora que me mandou, e é a história do pai dela. Então nós vamos chamar o pai dela de João. Então vamos lá, vamos de história.

[trilha]

O João, ele morava no subúrbio do Rio e, assim, acordava muito cedo pra ir trabalhar, pegava ônibus no ponto final perto da casa dele, pra ir para [som de trânsito] o centro do Rio e todo dia que ele chegava lá no ponto tinha uma moça também lá esperando o ônibus e eles se paqueravam, rolava assim olhares, um risinho ou outro, e essa coisa assim durava… Todo dia eles estavam se paquerando, se olhando, mas nem o João chegava nela, nem ela chegava no João, ficava só nessa lenga-lenga assim da paquerinha. E eles só se viam de manhã, né? Então o João nunca encontrava essa moça quando ele voltava, nem lá pelo centro do Rio, nada, só de manhã no bairro dele quando ele ia pegar o ônibus. Então ele já [som de pessoa caminhando] ia mais ou menos esperando encontrar essa moça, né? Dar uma paquerada e, quem sabe futuramente, sei lá, chegar nela, falar um “oi”, mas eles estavam há bastante tempo já, há meses nessa paquera que não evoluía.

Aí um belo dia, logo cedo e, assim, eles saíam muito cedo, tanto a moça da casa dela quanto o João. Então sabe quando [som de galo cacarejando] ainda não nasceu bem o Sol assim? Então ainda estava meio escuro, ele estava lá no ponto e a moça chegou e ela estava toda molhada, gente, toda molhada, ela estava de saia, blusa assim, um sapato de salto e ela pingava, pingava água. E, assim, o João tinha zero intimidade pra falar qualquer coisa pra ela, né? Mas assim o que era esquisito é que não tinha chovido, não tinha uma gota de água no chão, nada, tipo, não choveu de madrugada, não estava chovendo, não estava garoando, nada… E parecia que tinham jogado um balde d’água nela. E ele ficou assim olhando meio constrangido, sem saber o que fazer, né? Se falava alguma coisa, se não falava… Quando o João tomou coragem pra chegar nela e perguntar, principalmente, se ela estava precisando de alguma ajuda, ela veio na direção dele… [som de pessoa caminhando] Ela veio andando na direção dele, e ele, assim, era uma moça que ele paquerava, por mais que a situação fosse inusitada ali, ela toda molhada, ele ficou assim com o coração batendo mais forte, né?

E aí ela chegou perto dele e falou pra ele assim: “Oi, hoje eu não vou no mesmo ônibus que você”, [som de trânsito] e aí o João ficou olhando pra ela, ela estava toda molhada, estava maquiada, mas a pele dela, ele falou que tinha um tom assim meio acinzentado, sabe? E o olho dela, a parte branca do olho dela estava bem opaca assim, então, não aparecia que “Ah, era uma assombração”, nada… Parecia que ela estava muito, muito doente, e ela repetiu isso, “Hoje eu não vou com você”, e ele ficou assim tão chocado que ele não conseguiu falar nada, e ele subiu no ônibus porque o ônibus já estava pra sair, né? E ele ficou olhando pela janela lá no ponto e ela estava, sabe, quando você tá com frio e tá meio que se abraçando assim? Você põe os braços assim, em volta do peito e encolhe? Ela estava desse jeito, como se ela tivesse com muito frio e ela ficou olhando, ele ficou olhando e o ônibus foi embora e passou. E o João nunca mais viu essa moça no ponto, e ele paquerava ela demais assim, se ele tivesse oportunidade ele tinha chamado ela pra sair e tudo. 

[trilha sonora de suspense] 

E aí, gente, passou ali uns três meses e nada da moça aparecer, ele acabou meio que esquecendo, e ele arrumou uma namorada. O João arrumou uma namorada, aquela moça nunca mais tinha aparecido no ponto, né? Então ele achou que ela tivesse ou mudado de horário, de emprego, ou até de casa, né? E aí nunca mais pensou nela e seguiu a vida. E aí um dia ele foi com a namorada no cinema, normal e, quando ele voltou do cinema, ele tomou um banho e deitou na cama dele, dormia sozinho num quarto, um rapaz solteiro e ele se deitou assim na cama, já pra dormir e, no outro dia acordar e trabalhar. Era uma noite de muito calor, e ele estava dormindo ali de barriga pra cima, ele com os pés assim, pra fora da cama na lateral, um de cada lado da cama e ele sentiu um dos pés dele molhar, [som de água] ele falou: “Gente?”, aí você tá naquele dorme, não dorme, né? E ele sentiu o pé dele muito, muito molhado. 

Ele tinha um, tipo, uma luminária do lado da cama que ele até usava pra estudar e, quando ele acendeu [som de interruptor] a luminária, que ele olhou onde estava o pé dele assim e onde estava molhado, [efeito sonoro assustador] quem estava em pé do lado da cama dele? A moça do ponto de ônibus. A moça do ponto de ônibus estava dentro do quarto dele em pé, toda molhada, com a mesma roupa que ela estava naquele dia, só que a roupa agora já estava bem assim apodrecida, sabe, puída? E ela tinha um cheiro tão forte que ele mal conseguia respirar, e essa moça chorava, chorava, chorava e perguntava pra ele por que que ele não gostava mais dela, e aquela água assim pingando no chão, não só do choro, porque ela estava toda molhada. E ela perguntava pra ele: “Por que que você não gosta mais de mim? Por  que você não gosta mais de mim?”. 

O João falou que era uma visão tão aterradora assim, tão assustadora, que ele desmaiou sentado, porque na hora ele sentou na cama e ele ficou muito perto dela, então ele ficou sentado e ela em pé, um pouco mais alta que ele, e ele desmaiava e voltava, desmaiava e voltava, e ela lá chorando e perguntando pra ele porque que ele não gostava mais dela. Até uma hora que ele conseguiu gritar e a mãe dele veio no quarto, acordou e veio no quarto, quando ela entrou no quarto, a moça sumiu, ela acendeu a luz e o pé dele, a coberta assim, tudo molhado, como se fosse uma água podre, embaixo da cama dele tinha uma poça de água parada de água podre, como se ela tivesse ficado deitada embaixo da cama dele. Então, de repente, a hora que ele chegou e foi tomar banho antes dele deitar ali, ela já estava deitada embaixo da cama dele. [trilha sonora assustadora] 

A coisa foi tão séria que o João teve um colapso nervoso, e ele ficou quatorze dias internado numa casa de saúde. Sério, gente, quatorze dias. Quando ele saiu ele não queria mais dormir naquele quarto, né? Ele estava ainda traumatizado, já estava um pouco melhor, mas ainda estava mal. E nesse meio tempo, nesses quatorze dias que ele passou internado, ele conseguiu contar para a mãe dele o que tinha acontecido, que era a moça do ponto de ônibus, e a mãe dele foi atrás no bairro pra ver se achava essa moça, se achava alguma informação do que tinha acontecido com essa moça, né? E aí o que ela descobriu? Que o nome dessa moça era Sônia e, que a Sônia tinha morrido afogada [efeito sonoro assustador] em Copacabana um dia antes daquele dia que ela apareceu toda molhada no ponto de ônibus. Então, quando ela apareceu lá, vai, digamos que foi numa segunda, no domingo ela tinha morrido afogada e ela apareceu pra avisar pra ele que ela não ia no ônibus com ele aquele dia. Então, quer dizer, era importante pra ela, né? O João era importante pra ela.

Não sei explicar isso, vocês que me expliquem, quando ela viu que o João estava com uma namorada, ela se manifestou, apareceu. não sei se estava vagando por aí, pra ele. E aí a mãe do João mandou rezar missa, benzeu, né? Aí fizeram o João ir no cemitério levar flores pra Sônia, no túmulo da Sônia, [trilha sonora ficando mais grave] e ele ficou ainda mais assustado, porque a foto da lápide da Sônia, na foto ela estava com a mesma blusa, que era uma blusa assim de tecido levinho como se fosse uma seda, assim de gola alta com babadinho, meio estampada, e ela estava com essa mesma blusa na foto da lápide do cemitério. Então pro João foi pior ter ido lá, né? E, gente, como que explica isso? O cheiro, a água, porque não foi assim, que ele imaginou água, estava tudo molhado no quarto dele, com uma água podre, um cheiro ruim, como que explica isso, gente? Eu não sei explicar e, assim, o que mais me apavora é pensar na Sônia deitada, assim, sabe? Esticada embaixo da cama dele esperando ele chegar. Então, gente, me explica porque eu não sei.

[vinheta] Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta] 

Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.