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título: dores
data de publicação: 20/07/2023
quadro: picolé de limão
hashtag: #dores
personagens: betina

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei pra mais um Picolé de Limão. — E hoje eu não tô sozinha, meu publiii… — [efeito sonoro de crianças contentes] Quem está aqui comigo é Buscofem e a campanha #NãoPuleNossasDores. — Eu vou deixar a hashtag da campanha aqui na descrição do episódio. — Buscofem vai muito além da cólica, é um analgésico da mulher para o alívio das dores físicas, como dor de cabeça e dor no corpo, que traz um alívio prolongado e rápido. E Buscofem também quer dar voz aí as dores sociais femininas. — Praticando a escuta ativa? — A campanha #NãoPuleNossasDores quer incentivar a mulher a falar sobre as dores emocionais do dia a dia, como a desigualdade salarial, dupla jornada, o medo de andar sozinha nas ruas, ser julgada por não querer engravidar e até mesmo o fato de ser mãe solo aí por conta de um pai ausente. — E é o que a gente faz aqui, né? Na maioria das histórias aí do Picolé de Limão. — 

E, assim como a gente, Buscofem entende que o ato de falar aumenta a discussão, gera espaços de debate e de acolhimento e aponta a importância de uma rede de apoio. — O que pode fazer com que você se sinta menos sozinha com essas dores. — Eu vou deixar o link aqui na descrição do episódio e você pode compartilhar aí as suas dores emocionais fazendo parte desse movimento usando a hashtag Não Pule Nossas Dores. — Eu vou deixar o link e a hashtag aqui na descrição do episódio. — E hoje: História de mãe cansada. Eu vou contar para vocês a história da Betina. Então vamos lá, vamos de história. 

[trilha]

A Betina hoje tem 27 anos, é uma mulher super independente e mora com seu filho Ravi, que tem oito anos. Há alguns anos a Betina conheceu um cara e eles tiveram um relacionamento péssimo — conturbado, abusivo —, mas que durou alguns anos, pra você ver… Ela começou novinha a namorar e ela ficou presa alguns anos nesse relacionamento, sempre acreditando que o cara ia mudar, “ah, não, vou tentar mais uma vez” e nã nã nã e assim o tempo foi passando. Até que finalmente a Betina percebeu que aquilo ali não era amor, que ela estava num relacionamento péssimo, abusivo e resolveu deixar o cara. Finalmente… Betina se livrou do cara. Acontece que naquele mês, ela começou a sentir uns enjoos, umas dores estranhas e, de repente, Betina descobriu que estava grávida. Ela estava com 19 anos, grávida do cara que não era mais o seu namorado. 

E aí lá foi Betina contar pro cara e o cara fez um escândalo, falou que não ia assumir que era pra ela interromper a gravidez e falou: “Não é meu filho, eu já não estou com você… Você saiu com outros caras, você é uma vadia”… — Aquela coisa, né? — E ele disse aí que não ia sumir. Por outro lado, os pais da Betina também entraram nessa mesma pilha de falar: “Mas nossa, está solteira e grávida? Não é de respeito mesmo, que isso, aquilo…” e até alguns amigos tomaram essa atitude aí de julgar a Betina. E a Betina resolveu que ela teria o filho, mesmo que fosse sozinha, sem o apoio de ninguém. Betina seria uma mãe solo. E quando a Betina tomou essa decisão de ter a criança, ela também tomou a decisão que ela não ia mendigar o afeto de ninguém, já que ela estava sendo hostilizada pela família toda, por ele e pela família dele, a mãe dele também sempre xingando ela de vagabunda pra baixo e alguns amigos também assim, falando que: “Nossa, você acabou com a sua vida, você vai ser mãe solteira…”, “Nossa, você sempre foi tão inteligente, por que fez isso e nã nã nã”. 

Enfim, com esse monte de gente falando um monte para ela, ela resolveu que ela não ia ficar mendigando apoio, não, que ela ia ter esse filho sozinha. Então, foram aí nove meses sozinha, pensando no filho: “Ah, eu tenho meu filho e nã nã nã” e encarando coisas nesses nove meses que ela jamais imaginou que ela fosse encarar sozinha. A família da Betina falava tanto e falava tão mal, que ela resolveu que ela ia entrar em casa — ela trabalhava, mas ela só voltava para casa — quando todo mundo já tinha ido dormir — para não ser julgada — e ela acordava cedinho para sair de casa para ir trabalhar antes do pessoal acordar, para também não ter que encarar a própria família. Betina perdeu as contas do quanto ela foi humilhada pela própria família, o quanto ela teve que ouvir de algumas pessoas, da família do cara, do cara, enfim, escorraçada de todos os lados e isso era só o começo, assim… 

Muitas noites a Betina, grávida, foi dormir aos prantos e ela ia sozinha nos exames… Ninguém viu a primeira roupinha do bebê junto com ela, sabe? O primeiro chute… Só ela que sentiu ali, ninguém botou a mão na barriga dela, enfim, foi uma gravidez muito solitária e muito difícil para Betina. E o cara tratou a Betina tão mal, mas tão mal, que ela tomou uma decisão… — Que eu não tomaria, mas a Betina… Cada um sabe das suas dores, né? Mas ela tomou. — Ela não ia querer vínculo nenhum com o pai do filho dela. Nada. Não ia pedir DNA, não ia pedir pensão e, enfim, não ia querer convivência, nada… — E aqui eu acho que tem sim que pedir pensão, enfim, tem que chamar o cara para responsabilidade, mesmo que ele não queira se envolver afetivamente. Mas a Betina ela pensa assim: Se o cara não quer dar o afeto pro filho, por que eu vou ficar atrás desse cara? —

Até essa decisão que ela teve de não querer botar o cara na justiça e pedir DNA levou a galera a pensar que ela estava mentindo, que ele não era o pai, que ela tinha saído com alguém e que ela não sabia quem era o pai, por isso que ela não estava querendo fazer o DNA, esse tipo de coisa… A Betina passou uma gravidez com muito enjoo, muito incômodo e não conseguia fazer uma refeição legal, assim, completa e tal e, paralelo a essa questão toda, física, tinha o emocional que, poxa, ela não tinha carinho de ninguém, se sentia sozinha… Muito julgada, muito mesmo. Ainda mais depois que ela tomou a decisão de que ela rompeu com o cara de vez, que ela não ia pedir DNA, nada, nossa, aí a vida dela piorou ainda mais. [efeito sonoro de bebê chorando] Bom, Ravi nasceu e ali ela teve a certeza que seria só ela e o filho dela e que ela daria o amor que o filho dela merece e não mendigaria realmente o amor do pai da criança. 

Quando o Ravi bebê nasceu os parentes do cara eles queriam ver a cara do Ravi, para ver se era a cara do cara. E a Betina com bronca também andava com a criança na rua com o rostinho coberto, para que nenhum parente do cara visse aí o bebezinho. — O duro é isso, morava todo mundo perto, né? — Betina realmente cumpriu a promessa de não procurar o cara para nada e, quando as pessoas questionavam, ela contava todos os abusos que ela tinha passado com esse cara, né? Mas as pessoas falavam: “Mas você vai deixar seu filho sem pai? Ele é o pai e nã nã nã”, então não importava o que a Betina falasse, nem como ela estava se sentindo, nem a dor que ela tinha de lembrar de tudo o que ela passou, não importava, ninguém estava nem ai pra ela e só ficava falando que o filho dela não tinha um pai por culpa dela, porque ela podia muito bem pedir a justiça o DNA e dar um pai para essa criança. 

E, algumas vezes, ela esbarrou com esse cara na rua, mas ela fingia ali que ele nem existia, e aí sempre que ele encontrava com ela na rua — olha a cara de pau —, ele procurava ela nas redes sociais pra se oferecer como pau amigo, para sair com ela de novo. — Gente, a cara de pau desse homem… — Seis anos e meio depois, a Betina recebeu uma mensagem [efeito sonoro de notificação] aí pelas redes sociais da mãe do cara e ela estranhou porque a mãe do cara vivia chamando ela de vagabunda até quando encontrava na rua. — Sabe esse tipo de mulher? — E aí quando ela foi ver, era uma mensagem do cara usando as redes da mãe ali para tentar falar com a Betina e falando: “Sou eu, o fulano, o pai do seu filho”. — Quer dizer, ele passou quase sete anos longe da criança e, assim, gente, a gente pode falar, “mas a Betina proibiu”, mas se o cara realmente quisesse, ele botava a Betina na justiça e assumia a paternidade, se ele quisesse. Mas ele nunca se mexeu pra nada. Então não me venham aqui falar que a Betina proibiu. Tudo bem, ela pelo lado dela ela não quis, mas se ele quisesse ser pai, se ele quisesse desde bebezinho estar do lado do filho dele, judicialmente ele tinha como e ele não fez. Então aqui, entendeu? Não me venham falar “foi culpa da Betina”. —

Como a Betina, ficou muito p da vida e não respondeu ele, nada, ele procurou a família da Betina… — Que tinha contato com o Ravi, né? O Ravi foi crescendo… É aquela coisa, né? Criança não tem culpa, então a família tinha bastante contato com o Ravi. — E ele foi recebido pela família da Betina de braços abertos, como se nada tivesse acontecido, assim… Família da Betina fazia churrasco, chamava ele e aí ela não ia… E o pai da Betina entrou numas de criticar a Betina junto com o cara. Então, se ele fosse na casa da Betina e tivesse uma coisa fora do lugar, ele fotografava e mandava pro cara para falar: “Aí ó, tá vendo como ela é desleixada?”, o próprio pai da Betina, o avô do Ravi… E aí o auge das críticas foi que Betina começou a namorar uma garota… — E aí, pronto, né? — Aí pronto… Se ela já era mal vista ali como mãe solteira, largada, enfim, de índole duvidosa, por que quem é o pai? E aí depois quando o cara falou: “Eu sou pai”, aí todo mundo falou: “Então tá bom, então você é o pai”, quer dizer, a palavra dele vale, né? E aí, como ela começou a namorar uma mulher, aí que ela não tinha mais moral nenhuma mesmo. — Olha… Sei nem o que dizer, viu? —

Bom, a família, obviamente, proibiu que ela levasse a namorada na casa da família. — Então, se tinha uma confraternização, alguma coisa, a Bettna podia ir com o Ravi, mas não podia levar a namorada. — Por outro lado, o cara era convidado e levava a namorada… Ele podia levar a namorada, podia fazer churrasco, podia fazer tudo que pra ele estava tudo certo, mas a Betina não podia aí introduzir a namorada dela na família de jeito nenhum. — Eu fico muito revoltada… — A galera, a família da Betina — principalmente o pai da Betina, o avô do Ravi — estava sempre falando nas redes sociais o quanto o cara era bacana e bom pai. Que bom pai? Ele continuava nem aí pro Ravi… — E tudo isso doía muito na Betina, poxa, o cara tá ali, está sendo acolhido pela própria família dela e por alguns amigos também… — E ainda assim nem aí com o Ravi, tentando uma aproximação estranha, nada a ver, nem ligando muito para o filho, sabe? E a Betina perdeu o emprego e ele começou a falar que ela ia ser despejada, ia morar na rua… Esse cara, tipo: “Se você tivesse comigo, você não ia está passando por isso e nã nã nã”, pensa… 

Ele tinha contato de pai, entre aspas, uma vez num mês com Ravi, de tentar fazer alguma coisa, mas o Ravi já estava ali com seus sete anos, não queria mais saber também do cara ali por perto, era tudo muito estranho… E aí chegamos a Sexta—Feira Santa… — Que tem comidas específicas para quem come animais, tem bacalhau, enfim… — E como a Betina não sabia fazer essas comidas, ela combinou com a família que ela pagaria pela metade das coisas da ceia ali, da refeição da Semana Santa pra poder comer na casa da família com o filho. E aí foi combinado, né? Que ela iria passar a Semana Santa ali, a refeição com eles… E aí todo mundo sabia que no ambiente que — aquela criatura — aquele cara estava, a Betina não ficava — todo mundo sabia — e isso foi, foi dito ali naquela ocasião da Semana Santa. “Olha, ele não vem, vocês não chamaram, né? Eu quero ter paz e nã nã nã”. Chega lá e quem que está no almoço da Sexta—Feira Santa?”, o bonito… Convidado aí pela família da Betina para o almoço de família. — Afinal: “Ele era o pai do Ravi, ele era família”. —

E mesmo todo mundo sabendo que ela se recusava a dividir o mesmo ambiente que ele, imagine na mesma mesa, ele foi chamado… E aí a Betina foi embora, com fome, sem comer nada e a família ficou ligando… Tipo, ela se tornou para eles a pessoa difícil, tipo, “o cara tá aqui, tá super de boa, por que ela faz isso”, sabe? E aí ela se recusou a ir e aí eles fizeram uma marmita — afinal de contas ela que tinha dado o dinheiro da metade da comida —, ela nem quis a marmita, nem quis comer e ficou muito, mas muito p da vida de ter aí usado o dinheiro dela para alimentar esse cara. Porque ele foi, ficou de boa, não tava nem aí, não… Tipo: “Ah, ele viu que tinha um climão, qual seria o certo se você tem um pingo de caráter? Você ir embora, falar: “Não, Betina fica aí, você pagou pela ceia, fica aí”, não, ele ficou. O bonito… Betina foi embora, porque na cabeça dele é tipo: “Ela que não quer conviver comigo”. 

A Betina é totalmente incompreendida pela sua própria família, pela família do cara nem se fala, né? Porque ela é xingada e tal… E ela conseguiu acolhimento em poucos amigos ali, mas só ela sabe as dores dela. Ela não se arrepende de ter rompido definitivamente com esse cara, inclusive na criação do Ravi, porque ele realmente é um cara péssimo. Eu não vou detalhar muito aqui, mas ele é um cara péssimo… Péssimo com ela, péssimo com o filho quando mínimo minimamente ele tenta fazer alguma coisa. — Só que ainda assim eu respeito a opinião da Betina, porque é a vida dela, é ela que tem que saber como conduzir a vida dela e do filho, mas eu ainda acho que ela devia botar esse sujeito no pau… No pau, torando assim… Pra pedir pensão mesmo, é isso, ela faz DNA, esfrega na cara de todo mundo… Eu sou essa pessoa. Betina já é mais elevada espiritualmente, acredito eu, conduz de outra forma, mas eu iria… Eu acho que ele está saindo só na vantagem… A família toda dela ama ele, todo mundo vê ele como um cara que está tentando ser pai, sendo que não está fazendo nada e está só atrasando a vida da Betina… Não paga uma pensão, não tem um nome do cara no registro do Ravi, nada, sabe? Eu, sinceramente, Betina, eu ia rever essa parte, assim… Eu entendo que é muito difícil, eu respeito a sua opinião, só você sabe o quanto doeu e onde doeu, só você sabe das suas dores, mas eu acho que o cara tá muito suave pra ele, tá muito suave… Eu tô com ódio, tá muito suave. —

Fica aqui esse espaço pra gente acolher a Betina… E não acho que ela errou nas decisões dela, eu só acho que nessa questão da pensão tem que sim exigir, tem que entrar na justiça, eu acho. 

[trilha]

Assinante 1: Oi, Déia, oi, Não Inviabilizers, aqui é Bruna de Belo Horizonte. Betina, eu queria te dar um abraço muito apertado. Eu sinto muito a sua dor, eu sinto muito pelo que você passou, eu quero que você se sinta acolhida, abraçada… A revolta fica, eu concordo plenamente com a Déia, eu acho que independente do tempo que passou, é difícil, eu te admiro demais por ter passado pelo que você passou, sem abaixar a cabeça, sem ficar recorrendo à sua família, sem ficar recorrendo ao cara. Eu sei o quanto é difícil, eu sou mãe também, mas esse cara ele precisa ir pro pau, entendeu? Um dinheiro que é de direito seu e de seu filho… Já que ele quer participar, ele quer pagar de bom pai em todo lugar, né? Ele pague na justiça também. Um abraço, fique com Deus. 

Assinante 2: Meu nome é Alexandre, eu moro aqui no Canadá. Não consigo imaginar o que Bettina passou, concordo com o que a Déia falou… Acho que ela devia procurar na justiça pelo menos os direitos. A decisão dela de não fazer o teste de DNA e cortar qualquer tipo de contato com esse cara, querendo ou não, o Ravi vai crescer, ele vai começar a perguntar, a família dela pode influenciar ele também e, sem nenhuma evidência, sem nenhum tipo de suporte, eles podem fazer a cabeça dele e ele, no futuro, também começar a questionar a mãe… Pensando no longo prazo, esse seria o melhor pro filho dela e melhor pra ela, principalmente, a questão de pensão, que é um absurdo. Ele não é pai em nenhum momento, exceto nos momentos que ele decide ser. Eu espero que seu filho esteja bem, vocês estejam bem e boa sorte. 

[trilha] 

Déia Freitas: Como vocês viram, a Betina tá cansada de ter aí suas dores diminuídas e de ser silenciada também pela própria família. Ela só queria ser respeitada na decisão de ter o Ravi e ser reconhecida no seu esforço, na criação dele, como mãe solo, enfim, né? E mesmo sem o apoio da família, a Betina achou esse lugar de acolhimento nos amigos, que são aí a família que ela escolheu. Buscofem sabe que as mulheres não sofrem apenas com dores físicas e com a campanha #NãoPuleNossasDores, Buscofem quer fazer com que a voz das mulheres ecoe e, assim, incentivar que elas se juntem aí numa grande rede de escuta, apoio e construção de um futuro com muito mais igualdade. — Um futuro menos injusto pra gente. — O link da campanha, hashtag e todas as infos eu vou deixar aqui na descrição do episódio. Lembrando que Buscofem é um medicamento, né? E se persistirem os sintomas, um médico deverá ser consultado. Valeu, Buscofem pela parceria. Um beijo, gente, e eu volto em breve.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.