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título: aparências
data de publicação: 04/04/2024
quadro: picolé de limão
hashtag: #aparencias
personagens: lucila e um cara

TRANSCRIÇÃO

Este episódio possui conteúdo sensível e deve ser ouvido com cautela.

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei pra mais um Picolé de Limão. Hoje eu vou contar para vocês a história da Lucila. Então vamos lá, vamos de história.


[trilha]


A Lucila é uma moça de 30 anos que sempre teve dinheiro, estudou em colégios particulares, desde criança fez viagens internacionais, os pais dela, são conhecidos e respeitados nas áreas que eles atuam. A Lucila tem um irmão dois anos mais velho que ela e que é casado e mora na Europa — ele tem uma esposa russa — e a Lucilava sempre teve uma vida de muitos privilégios, a não ser por uma questão: Lucila sempre foi uma moça gorda. O irmão dela também é um homem gordo, o pai é gordo e a mãe é magra. Lucila nunca sofreu pressão em relação a seu corpo por sua mãe, pelo contrário, assim… Tudo que ela aprendeu sobre empoderamento e sobre se aceitar. — O pai dela é um homem gordo que joga tênis, sabe? É saudável, gordo saudável… Porque geralmente quando a gente fala “a pessoa é gorda” sempre vai aparecer um para falar: “Mas é doente e tal”, não… Família da Lucila é nível, assim, eles podem ir no Sírio Libanês, no Einstein, aqui em São Paulo a hora que eles quiserem, fazer os exames que eles quiserem, que eles vão e estão com os exames ok. Então, assim, é este nível de família… Nem achei que eu tivesse ouvinte rico assim, mas tem. —


Lucila sempre lutou com essa questão do peso dela, as amigas ricas como ela são magras até hoje, só que Lucila também vem dessa família que, assim, sempre teve mesa farta, sempre viajaram muito pra comer bem… E quando ela quis, com 13 anos, fazer a sua primeira dieta — eu não tô dando nome aqui pros pais só pra gente não ter mais nomes, que eu quero focar na Lucila, mas os pais são ok, eles merecem nome, o irmão merece nome, a russa merece nome, enfim —, a mãe levou a Lucila no endócrino, e aí o endócrino fez um plano alimentar, a Lucila emagreceu, mas é aquela coisa, né? — É manutenção… E você ali com seus 13 anos, pô, você quer comer uma coisinha gostosa. — Então, quando ela tava com 15 ela estava gorda de novo… Então meio que ela falou: “Vou deixar rolar, né?”, só que tinha a questão dos meninos também, que ela não namorava, não ficava com ninguém, aí via as colegas ficando… — E isso é barra, né? —


Quando a Lucila fez 17 anos, ela foi fazer um intercâmbio nos Estados Unidos, e aí as coisas mudaram. — Porque nos Estados Unidos você sendo gorda, é mais fácil você ficar com alguém. — O primeiro beijo que ela deu foi num americano e a primeira transa dela foi com um americano, na faixa da idade dela… — As primeiras experiências da Lucila foram fora do país, aqui ela falou: “Não tinha nenhum garoto da minha idade, brasileiro, que queria me beijar ou transar comigo”. — Lucila sempre teve essa questão de querer namorar, de querer ter alguém e sempre teve essa dificuldade por ser gorda. E aí ela ficou seis anos nos Estados Unidos, fez faculdade lá, ficou mais um ano e meio aqui e voltou pra lá de novo, fez um mestrado lá e aí voltou pra cá. Quando ela voltou pra cá, já tinha começado esses aplicativos de relacionamento… [efeito sonoro de notificação de celular]

A Lucila resolveu se cadastrar e esses aplicativos já tinham nos Estados Unidos, então ela já tinha meio que os macetes, né? E qual foi a da Lucila? De cara já colocar foto de corpo todo e já botar lá “sou uma mulher gorda”. — Porque aí quem, quer, quem não quer já passa reto, né? — Dificuldade de dar match, dava match com um, com outro… — Quando ela via que o cara tinha fetiche, ela já dispensava. — Um dia um cara curtiu Lucila e Lucila curtiu de volta. No perfil desse cara ele tava tipo na frente de uma lancha, assim, ele era todo atlético, alto, loiro e Lucila falou: “Bom, me interessei, mas deve ser fake, porque esse cara é muito bonito pra se interessar por mim”. — Discordo, porque Lucila é uma mulher bonita. — E aí eles começaram a conversar, ele começou a fazer um monte de pergunta para Lucila, Lucila já muito esperta, respondendo o básico… Aí eles começaram a conversar no WhatsApp [efeito sonoro de notificação no WhatsApp] e fizeram FaceTime, era o cara realmente e resolveram marcar um jantar e o cara escolheu o restaurante. — Então eu vou falar um restaurante aqui… Não, eu não vou falar, porque se eu falar eu tenho que achar um restaurante que seja caro, porém cafona, eu ia citar o que eu acho caro e cafona, mas aí provavelmente eu vou ser processada. [risos] Digamos que ele marcou num restaurante chamado… Eu queria dar um nome… Madrid 6. —

Marcou no Madrid 6 — não é o perfil de restaurante que a Lucila frequenta, a gente está falando realmente aqui de uma outra classe social — e lá foi Lucila, toda arrumada para o Madrid 6, escolheu lá o prato que tinha menos coisa escorrendo. [risos] Ele escolheu um monte de coisa lá, ele foi muito gentil, muito agradável e, na hora de pagar a conta, a Lucila falou: “A gente divide, não tem problema” e ele pegou um cartão — botou lá no meio do negocinho que vem pra você botar ali pro garçom pegar e ir lá fazer o pagamento, né? Longe de você. — e ela também botou o cartão dela. E aí depois o garçom voltou e meio que chamou ele de lado e ele falou: “Ai meu Deus, não está passando?”, ele tentou pôr a senha, não foi, enfim… E ai a Lucila de boa falou: “Não, não, pode passar tudo no meu”. E aí passou no dela… E pra Lucila isso não foi uma questão. — Pra mim já era uma nota de corte, porque assim, o cara escolheu um restaurante que ele nem conferiu se ele tinha saldo ou se o cartão dele tinha limite… Porque eu sou da classe social, agora estou um pouco melhor, mas ainda assim eu sempre verifico antes de eu ir num lugar, se eu tenho limite, se eu tenho saldo, por que e se não passar? Então como que o cara não pensou nisso? “Ah, vai dar, sei lá, R$500 a conta” e ele ficou pedindo coisa, porque a Lucila podia falar: “Olha, vou pagar só o meu prato, minha taça de vinho e só, entendeu? Mas ela pagou. Então ali, naquele primeiro contato, já deu pra perceber que ele não tinha a grana que ele dizia ter. Nem é tanto pela grana, mas por ele ter sido folgado. —


Mas Lucila achou o cara encantador e assim que saiu de lá — ele não foi levar ela em casa —, ele já mandou mensagem falando que estava apaixonado, que isso, que aquilo… Detalhe: Ele nem tinha beijado ela. Como você se apaixona sem beijar? E aí eles começaram a sair. O primeiro beijo veio depois ali do quinto encontro, porque a Lucila pediu… E a primeira transa depois de uns três meses que eles estavam, entre aspas aí, namorando. E aí uma coisa que Lucila me falou que eu achei, assim, mais um alerta é que esse cara ficava perguntando assim muito da vida dos pais dela, do irmão e ele queria saber de tudo assim… Até quanto Lucila tinha no banco ele perguntou. — Ela desconversou e tal, mas pô, se só eu já vou falar: “Esse cara tá querendo o quê? Me sequestrar? — Depois da transa que foi mediana — foi bem mais ou menos, mais um ponto aí pra Lucila largar esse cara, não largou —, ele pediu a Lucila em namoro… Lucila ficou muito feliz e, assim que ele pediu em namoro, ele exigiu que ele queria conhecer aí os pais da Lucila. Lucila marcou um jantar e os pais da Lucila são muito de boa, trataram o cara super bem e depois conversaram com Lucila, falou: “É isso que você quer? Pra gente tá perfeito, né? Você que sabe da sua vida. A gente achou ele também um rapaz super educado, um rapaz ótimo”.

A Lucila falou pra eles: “Olha, mas você percebeu, ele não frequenta os mesmos lugares que a gente, não está nas mesmas rodas…” e os pais falaram pra ela: “Isso aí é de você introduzir o cara no nosso meio… Isso aí não é o problema, né? Se você gosta dele e ele gosta de você, isso que é o mais importante, que o sentimento seja verdadeiro e nã nã nã”, enfim, os pais deram um super apoio. Quatro relações sexuais em três meses de namoro… — Pô, começo de namoro? — Quando Lucila foi cobrar, foi a primeira vez que ele falou: “Então, Lucila, eu acho que a gente tem que pensar nos benefícios… Olha para mim, você está comigo, eu estou com você..”, tipo, falando que ele era muito bonito pra ela e que ela tava na vantagem. Então era aquilo ou era nada, eles podiam terminar… E a Lucila já estava apaixonada, e aí a Lucila chorou, falou que não, que tudo bem então e pediu desculpas pra ele. Porque ele falou: “Eu não vou ter um relacionamento onde eu sou pressionado a transar com uma mulher do seu tamanho. Eu já não transei com você? Já não tá bom? Eu vou transar com você quando eu tiver vontade… Não é sempre que eu olho pra você e tenho vontade de ficar perto de você”. — Ô, gente… Lucila, não tinha uma cadeira nessa hora? Entendedores entenderão… Não tinha uma cadeira por perto? Porque dinheiro para advogado bom você tem. Era uma cadeirada e já a OAB do seu advogado cantando, entendeu? Mas enfim… — 


Tiveram essa primeira discussão e, a partir daí, as coisas foram escalando. Eu acho importante dizer que a coisa subiu aí pra chacoalhões, tapas na cara, xingamentos e na frente dos outros super educado, super querido, um amor de pessoa. Então todo mundo gostava dele — e gosta dele ainda —, Lucila resolveu ir pra terapia. — Não era a primeira vez que ela ia para a terapia, tá? Ela já tinha feito terapia por questões do corpo dela e tal, e agora era uma terapia específica por causa desse cara. — A primeira coisa que a terapeuta na terceira sessão falou para ela, falou: “Bom, eu acho que a gente tem que trabalhar aqui já pra você ir desapegando desse cara”. E aí a Lucila fez o que? Mudou de terapeuta. Foi para uma segunda terapeuta que falou a mesma coisa. Então ela percebeu ali que qualquer lugar que ela fosse fazer terapia, essa questão ia surgir de: Por que você está com esse cara? Vamos largar esse cara… Eu estou aqui para isso, para te ajudar a sair desse relacionamento. Então ela voltou para a primeira terapeuta, que foi aquela mais assertiva, que só faltou falar pra ela: “Eu posso te emprestar a cadeira do consultório”. [risos] Amo… [risos] 

Eu já vou dar a letra pra vocês: Mentir para o seu terapeuta é a mesma coisa que você jogar dinheiro no ralo. Eu sou psicóloga e falo para vocês: Muita coisa não tem realmente como a gente saber se a pessoa não falar… E tem coisa que a pessoa vai mentir, que também não tem como a gente saber… A gente pega uma coisa ou outra, mas é você que está se enganando. Não vai funcionar. O processo terapêutico não vai funcionar para você do jeito que tem que funcionar se que você está mentindo pro seu terapeuta. Então ela começou a mentir para a psicóloga… — E aí óbvio que ela continuou com esse cara. — Começou a falar que agora ele estava melhor, que ele isso, que aquilo… Só que a Lucila exigiu que ele também achasse um terapeuta, que ela ia pagar. E, detalhe: O relacionamento deles nessa época já tinha dois anos e Lucila pagando absolutamente tudo, tudo. Nessa altura do campeonato, ele já tinha devolvido a kitnetzinho dele do centro que ele alugava e ela já tinha alugado um flat para ele — vou dar um bairro aqui equivalente em São Paulo — tipo, sei lá, no Itaim… E ela pagando todas as despesas do flat. 

O carro dela começou a ficar com ele e ela começou a dividir o motorista da mãe — porque a mãe tem um motorista —, então quando ela não estava com ele, no carro dela que ficava com ele, ela usava o motorista da mãe. Lucila trabalhando, uma pessoa com mestrado e tal na área dela, muito bem colocada… — É muito diferente uma pessoa da classe C com mestrado e um rico com mestrado, porque o rico ele tem mais portas abertas e todo mundo conhece alguém da família, ou alguém que é dono da indústria, sabe? E lógico que vai dar um emprego pro rico. Então ela também nunca teve esse problema de arrumar um emprego. –  O cara que se dizia depois “corretor de imóveis de luxo”, ela nunca viu ele vender um imóvel de ninguém e ela agora já tendo que esconder com maquiagem as manchas das agressões que ela sofria. 

O fundo de tudo isso é que a Lucila bota essa agressividade e esse mau caratismo dele na conta dele ter sofrido na infância, dele ter sido pobre. — Quando ele conheceu você ele ainda era pobre e ele continua pobre, ele é um pobre bancado por você. — Ela acha que ele tem traumas e é por isso que ele é violento, é por isso que ele é assim. Lucila ainda está com esse cara… O relacionamento deles tem muitos anos, entre idas e vindas… Quando eles terminam esse cara ameaça se jogar da ponte… — Vocês já sabem o que eu penso, né? — E como a Lucila esconde as agressões que ela sofre — tanto verbais quanto física dos pais e da família, dos amigos —, todo mundo gosta dele. — Essa é a questão… Todo mundo gosta dele. — Tanto que o apelido dele entre os amigos da Lucila, eu vou dar um outro apelido, mas é tipo nessa vibe, é “Pequeno Príncipe”, porque todo mundo acha ele muito gentil, muito lindo, muito fofo e todo mundo torce quando eles terminam pra eles reatarem esse relacionamento.


Lucila acha mesmo que ela teve essa vida privilegiada e que ele tem raiva disso e, em certo ponto, ele tem razão. — E aí eu te falo Lucila, aquilo que eu te falei, que todo mundo tem raiva de milionário, isso aí é ponto, entendeu? Agora, você não pode pegar essa raiva que a gente tem de bilionários, de herdeiros e transformar num cara que tá te batendo… Que fala que você é gorda, que isso, que aquilo… Tanto as agressões físicas, quanto as verbais, ele sempre fala que é porque ela é gorda. Agora eles acabaram de reatar e agora ele reatou querendo casar e a Lucila acha que é a única chance que ela vai ter de casar é com esse cara. — Gente, mil vezes ficar sozinho, sem ninguém, do que ter alguém que te trata como lixo, que te bate, que te xinga e que você não sabe amanhã como essa pessoa vai reagir com você… Mil vezes sem ninguém. Cultiva orquídea, cultiva amizades, adota um pet, mas não faça isso com você mesmo, não vale a pena. — E olha como ele não é bobo: Pra ele não se sentir tão mal, ele quer casar com a Lucila em comunhão total de bens. 


A Lucila também tá aí na mão desse cara, mas também não é 100% otária, sabe que desse jeito ela também não vai casar, teria que ser a união parcial de bens, tipo, tudo o que eles adquirirem depois é dos dois. — Mas o cara nem trampa, vai adquirir o que com ele? Uma virose? Única coisa que você vai ganhar dele é uma virose. — E aí agora o cara quer casar, a Lucila está seduzida com a ideia — porque ela acha que é a única forma dela se casar e ela quer casar —, o cara acabou de voltar com você, ele te pede em casamento, fala rapidamente sobre a comunhão de bens, porque ele não é trouxa… E, na sequência, ele fala: “Mas só que tem uma coisa, não dá para você casar de noiva desse tamanho que você tá, porque o seu vestido vai ficar parecendo uma barraca”. — Não era pra Lucila pegar a bolsa dela, virar as costas e ir embora depois da cadeirada? — Tem esse lado do custo benefício, que ele é bonito, que ele é gentil, agradável, que ele foi introduzido no meio dela e foi aceito… — Então pra ela também tem todo esse lado fácil, né? Porque ela está pensando, tipo, nas aparências… Eu acho que é isso, eu falei isso para a Lucila, falei: “Você está pensando mais nas aparências do que no que está acontecendo com você entre quatro paredes com esse cara”. —

Então ela está pensando nas aparências mesmo assim, porque eles são um casal que todo mundo olha e fala: “Meu Deus, eles são muito fofos, são muito incríveis” e o cara é um maldito e ninguém sabe porque ela não conta. Ela não conta… Para a única amiga que ela abriu — porque uma vez ele bateu nela de um jeito que ela ficou com um olho que não dava para cobrir com maquiagem, e aí ela teve que contar para essa amiga, essa amiga acolheu ela no apartamento e inventou uma viagem, tipo para colocar nas redes sociais para elas irem só as duas, para fingir que elas estavam viajando enquanto aquele olho não ficava melhor —, fez o que toda amiga faria, falou: “Então agora a gente vai fazer um boletim de ocorrência, que isso, que aquilo” e não teve jeito, ela não foi na delegacia, não fez boletim e a amiga cortou esse cara de tudo. Só que aí a Lucila fez ela prometer que não ia contar para ninguém, porque ela queria contar para turma e tal, né? E aí a Lucila falou: “Isso vai ser um escândalo”, e aí pela amizade, essa moça que, sei lá, que a gente pode chamar de, sei lá, de “Eugênia”. — Eugênia é nome de rico, né? — E aí essa moça, Eugênia, falou: “Tudo bem então, mas onde esse cara estiver, eu não piso”. 

Qualquer festa que tinha, qualquer reunião, era todo mundo que ia e a Eugênia falava: “Eu não vou” e inventava uma desculpa… A Eugênia começou a se afastar da turma toda, ela falou: “Olha, eu vou me afastar, eu não vou romper com você, mas vai chegar uma hora que eu não vou aguentar e eu vou falar… A próxima vez que eu souber ou que eu desconfiar que esse cara te bateu, eu mesma vou contar pros seus pais, vou contar para todos os amigos… Vou botar nas redes sociais pra você criar vergonha na cara e não voltar com ele”. E aí elas acabaram brigando e não se falaram mais… — E era uma das melhores amigas aí da Lucila. — A Lucila acha que ela devia apoiar o que a Lucila escolheu… — Mas, gente, a gente em sã consciência a gente não escolhe a violência nunca, né? Se a gente tá num relacionamento desse jeito, onde a gente acha que merece apanhar, é porque tem muita coisa errada com a gente também, né? E a gente precisa ir atrás de ajuda, de terapia, mas tem muita coisa que quem está de fora não vai conseguir fazer também, né? —

Então agora tá assim, a Lucila foi pedida em casamento por esse cara — que quer casar em comunhão de bens, isso não vai rolar, mas pode rolar sim uma separação de bens com contrato, com sei lá, de um dinheiro em caso de divórcio pra ele… Isso pode rolar, isso isso é muito comum de acontecer quando uma pessoa rica como ela casa com alguém mais pobre, assim… Capaz que ele aceite —, mas você vai casar com esse homem, Lucila? — E aí eu fico pensando, pra Lucila ter sentado na frente do computador e me mandado um e-mail é porque eu acho que é o primeiro passo para ela ouvir por que ela precisa sair desse relacionamento, sabe? — É uma mulher linda, rica e está nisso? É uma pessoa milionária que era pra eu ter ódio e eu tô aqui chorando por ela. — Ódio, digo, ódio de classe, não é ódio da pessoa. — A Lucila já deu o primeiro passo e o primeiro passo é esse… — Porque ela sabia que ia chegar aqui, a gente ia odiar esse cara e que a gente ia dar conselhos pra ela no sentido de sair dessa. Então, eu acho que a gente tem que aqui mostrar para ela por que ela não pode de jeito nenhum aceitar alguém que te dê um soco na cara, que te xingue, que te humilhe e que, além de tudo, ainda use o seu dinheiro… Todo seu dinheiro, sabe? Todo não, mas tipo, seja sustentado… Ninguém merece isso.

Uma mulher com mestrado, que já viveu fora, que é riquíssima e que está nisso… Não importa a classe social, quando você está num relacionamento abusivo, ele te ferra a cabeça, te ferra tudo. Então é isso, gente, eu vou pedir para vocês que vocês sejam mais do que gentis e que vocês mostrem para Lucila que ela não é isso que esse cara disse. Ninguém merece passar por isso. Nenhuma mulher tem que ouvir coisas sobre o seu corpo e, quando você se manifesta, você toma um tapa, um soco na cara. Ninguém.

[trilha]


Assinante 1: Oi, Déia, oi, gente, aqui é a Catarina, eu moo em Portugal. E, Lucila, eu vou tentar ignorar todas as violências, que você diz que ele não é um monstro e tal, mas você merece alguém que te coloque num pedestal, alguém que faça assim: “Que sorte a minha que eu estou com a Lucila, olha que mulher maravilhosa”, alguém que te deseje, sabe? Alguém que te ame, que te admire, que olhe para você com olhos de quem ama e tem paixão, e não alguém que diz que você tem que agradecer por estar com ele. Tu tá entendendo? [risos] Que tem que ser quando ele quer qualquer intimidade, não é assim, sabe? Do tipo: “Olha, que sorte a sua que você está comigo”, cara, não… Ele tem que olhar: “Que sorte a minha que eu estou com ela”, pensa nisso, por favor, você merece muito mais. Um abraço. 

Assinante 2: Oi, Não Inviabilizers, meu nome é Simone, eu falo aqui do Rio de Janeiro. Ô, Lucila, mulher, aparentemente você é bem relacionada com seu corpo, né? O que te faz pensar que esse homem te valoriza, mulher? Repensa essa tua dependência emocional. Eu imagino que você possa estar achando que se terminar com ele vai ficar só para sempre, mas você tem toda uma vida pela frente de tentativas… Você esquece esse cara com uma viagem mara pra Paris, porque dinheiro você tem. Me chama, hein? A gente só acha que as coisas não tem saída quando a gente não tenta, tudo tem saída. Eu estou torcendo para que a sua saída seja triunfal, tá bom? Um beijo. 

[trilha] [vinheta] Quer a sua história contada aqui? [vinheta final interrompida]

Voltei para um mini desfecho. — Quem me acompanha há mais tempo já viu isso acontecer aqui na história “Suplementos”. Geralmente, quando a pessoa está muito envolvida e ela manda a história e as pessoas detonam aí o amor da vida delas, [risos] elas tendem a pedir um direito de resposta, enfim… E eu acho justo. A Lucila ela achou que eu exagerei na preocupação e que as pessoas no grupo foram muito desrespeitosas em relação ao relacionamento dela. — Inclusive insinuando que o cara pode vir a matar a Lucila. Eu acho realmente, Lucila, que um relacionamento onde ocorre agressão física pode sim chegar a esse ponto. Como também não pode, sei lá, né? Mas é o que a gente tem medo, né? — A Lucila pediu esse espaço para falar um pouco mais sobre o relacionamento dela. — E uma coisa que eu gostei que aconteceu… — A Lucila mostrou a história para duas amigas e essas amigas de início ficaram chocadas… E aí elas foram conversar as três mais e essas duas amigas resolveram falar com o cara. 

Não contar pra ele que tinha virado uma história, né? Mas falar que elas sabiam que ele tinha agredido a Lucila, que ele xinga a Lucila… E aí o cara fez o que eu acho que eu pelo menos já esperava… Chorou. E ele chorou, prometeu que isso não ia acontecer mais… E explicou pra elas que a Lucila também agride ele verbalmente… — Nenhuma agressão verbal que a Lucila faça pra ele, porque ele também faz pra ela, justifica ele ter batido nela. — E aí a Lucila acha também que do jeito que eu falei, parecia que ela apanhava todo dia. Não foi essa a impressão que eu quis dar, mas assim, ela apanhou mais de uma vez, né? Então ela gostaria que isso fosse também pontuado, que foram vezes específicas, em discussões específicas e que não acontece todo dia. — Eu, Andréia, acho que não tem que acontecer nem uma vez. A primeira vez que uma mulher apanhar, ela tem que sair fora desse relacionamento. Não há perdão. É a minha opinião, tá? Muitas vezes eu falo “misturadas às minhas”, porque é sobre a minha vivência, sobre o que eu já vi por aí, sobre relatos de amigas minhas, enfim, né? É isso… — 

As amigas agora são o suporte dela, essas duas amigas, elas conversaram com ele, ele pediu perdão e disse que não vai acontecer e as amigas acham sim que ela devia dar uma chance pra ele. — Eu acho que não, né? Mas as amigas da Lucila são amigas desde criança, então assim elas conhecem bem a Lucila. Mas as três conhecem bem esse cara, né? A Lucila acha que sim, que ele não não é um assassino, enfim… — Ele concordou durante essa conversa que quem cuida de detalhes financeiros sobre o casamento são os advogados da família da Lucila, né? A Lucila é do agro, a gente está falando de gente muito, muito, muito rica… E quando ela diz que ele fica revoltado, a Lucila falou assim: “Eu não vivo numa bolha, eu sei que as pessoas pobres não são violentas, mas o que eu disse é que, no caso dele, durante as nossas brigas, pode ser que eu fale alguma coisa que ele se sinta humilhado e aí ele fica irreconhecível, assim, fica fora de si”. A Lucila acha que no caso dele específico, a questão da diferença de classe social conta. — E eu acho que em todo relacionamento que tem classes sociais diferentes isso conta, mas também acho que isso não é um fator para você bater em alguém. — 

Ele podia sair fora, mas ele não quer usufruir dos bens e das coisas e ainda te bater? Aí ele fica. — Então, assim, não adianta também a Lucila achar que eu vou chegar aqui e falar tudo o que ela pediu e não vou rebater, gente, porque eu não acredito que a mulher que apanhe tenha que ficar pra ver essa reabilitação do cara. “Ah, ele pode se reabilitar, ele pode mudar?”, pode, mas longe de quem apanhou… Quem apanhou, já apanhou, já foi, entendeu? As questões que a Lucila levantou são essas, que ela sabe que é que as pessoas pobres não são violentas e que ela falou especificamente dele, por questões de talvez algumas coisas que ela fale também no momento da briga… Eles são do agro, eles são muito, muito ricos e ele é uma pessoa pobre… Mas por que ele não trabalha? Não é? Você está namorando uma pessoa bilionária, milionária, mas você não é… Então você tem que dar um trampo. “Ah, mas porque aí a gente fica com pouco tempo para a gente, para a gente aproveitar mais o tempo, ele não achou uma colocação que desse para levar relacionamento e emprego”. — Como que não, gente? Todo mundo que namora e trabalha dá um jeito, né? Então, enfim, também não concordo com isso. —


Não é uma questão pra Lucila isso, porque ela realmente ela pode pagar, né? Tipo, sei lá, dinheiro de pinga… — Eu fico chateada porque eu acho que ela não deveria casar com esse cara, mas eu acho que tudo caminha para que isso aconteça e eu espero então que realmente agora que ele sabe que tem duas testemunhas, que são essas amigas da Lucila, que ele pelo menos, sei lá, né? Se policie e não faça com a Lucila o que ele já fez. — Lucila não gostaria que as pessoas pintassem esse cara como um monstro… — Sim, quem dá o tom da história sou eu e realmente eu pintei ele como um monstro porque eu acho que ele é um monstro, mas a Lucila não acha… E as amigas, depois de conversarem com ele e ficarem por dentro dos pormenores, as duas também não acham que ele é um monstro. Quem sou eu, que estou de fora, que estou longe… Eu falo aqui dentro das coisas que eu já vi, que eu conheci, que eu acompanho aqui no podcast, porque a gente recebe muitas histórias sobre violência doméstica… E é isso assim, gente… 


Um podcast é o último lugar que você tem que procurar para fazer uma queixa de violência doméstica… Precisa procurar sua rede de apoio, precisa procurar as autoridades, enfim, precisa fazer todo um movimento que não é contar sua história aqui. Então, caso alguém que esteja ouvindo esteja passando por isso, a primeira coisa que tem que fazer é: Conte pra alguém e depois vá a delegacia e faça boletim de ocorrência. Muito importante isso. É isso, Lucila, eu desejo o melhor pra você… — Tô falando no meu nome aqui, Andréia. — Não acho que ficar com esse cara é o melhor para você, mas é aquela coisa, aqui a gente só conversa, né? A gente só expõe aí a história e o que a gente acha… O que eu acho é isso, que nenhuma mulher merece, mas se você acha que ele se reabilitou, que ele conversou com as suas amigas, que isso não vai acontecer e que o casamento é viável, se ele aceitou os termos de casamento também que a sua família vai propor, então o que eu vou dizer, né? Esse é o adendo que a Lucila pediu. Eu continuo achando que tem muita questão de aparências nessa história, aparências do status para manter o relacionamento, tanto quanto a aparência física dele, que ele tem essa aparência entre aspas de “príncipe”, sabe? Aquela coisa do loiro de olho azul que jamais faria… 


Essa história, se ela tivesse um outro cara no lugar dele talvez tivesse um outro desfecho, mas como ele é um príncipe loiro de olho azul, pode ser que isso conte, né? Na questão das aparências aí. — E eu acho… Também mais uma opinião minha, Lucila acha que não, que realmente é o cara que ela ama e que ele, do jeito dele, ama também… Mas ele tem essa revolta que talvez venha quando eles briguem, porque ela também pode falar coisas que ele se sinta humilhado, né? Mas é aquilo que eu já falei aqui: Se você está namorando uma pessoa rica e ela te humilha, o que você faz? Você você vai embora… É isso. Você não vai bater na pessoa, né? Enfim… — Esse é o desfecho, eu espero que vocês entendam que essa é a posição da Lucila, são escolhas. Eu posso ter passado realmente uma visão de perigo que tanto as amigas da Lucila quanto a Lucila acham que não existe. Eu falo dentro da minha vivência e dentro do que ela me contou na história. — Pra mim é perigoso… Pra mim é inaceitável. Mas para mim, né? —


Essa é a palavra da Lucila, ela achou importante pontuar para o cara não ficar como um monstro… E eu falei pra ela: “Lucila, eu vou encerrar o seu adendo dizendo o que eu acho, que eu acho que ele é um monstro mesmo”. Então é isso, gente, um beijo e eu volto em breve.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.