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título: brigadeiro
data de publicação: 19/11/2020
quadro: picolé de limão
hashtag: #brigadeiro
personagens: sandra, maurício e selma

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Picolé de Limão, o refresco ácido do seu dia. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, Gente… Voltei pra mais uma história, história de pandemia. É a história Sandra e do Maurício.

[trilha]

A Sandra e o Maurício, eles trabalhavam numa academia e, assim, que a academia fechou eles foram demitidos. E como eles eram PJ, pessoa jurídica, o que eu não concordo, eles deviam ser registrados e tal, pra ter um pouco de garantia, como eles não eram, eles saíram praticamente sem nada… E aí aquela coisa: o que fazer? E a Sandra teve a ideia de fazer brigadeiro de colher para vender. E, na casa da Sandra, no apartamento, a Sandra tem um filho casado já, que não mora no mesmo estado que ela, mora em outro alugar. E na casa dela, no início da pandemia, estava ela, a mãe dela e o marido, os dois desempregados e a aposentadoria da mãe para dar uma segurada ali em condomínio e tal. E aí ela resolveu fazer esse brigadeiro de colher.

Começou a fazer 50 por dia, o marido dela saía para vender, vendia tudo, fez panfletinho, começou a deixar nos prédios… E a coisa foi dando super certo, super certo… E ela só fazia de segunda a sexta, então de segunda a sexta ela fazia de manhã, logo cedinho, ela acordava, tipo, de madrugada e o marido dela saía para vender e voltava à noite, tinha dia que ele voltava muito tarde. E tudo, nossa, dando muito certo, ela vendia também pela internet… Vendia não, vende ainda pela internet e tudo… Fazia brigadeiro, fazia mais uns dois ou três tipos de doce, tudo assim de recolher. Aí na terças e sextas, o marido dela falou que tinha arrumado uma encomenda de mais 50 potinhos, 50 por terça e 50 por sexta.

E aí ela ficou mega feliz, ela ia ter que trabalhar mais, mas eles iam faturar bem mais. E ela começou a fazer, então, de terça e sexta ele não saía com 50, ele saía 100. Fora os potinhos que ela vende pela internet também, que aí é a parte. Com um mês e meio que ela estava bombando de vender já os potinhos, ela recebeu um telefonema. Era um telefonema de uma ONG que distribui alimentos e que estava ligando para agradecer… Porque os potinhos dela iam todos com identificação, assim, etiquietinha, com o nome do produto, o link lá do Instagram dela, o contato, telefone do WhatsApp… E aí ela recebeu essa ligação no WhatsApp e era a moça da ONG querendo agradecer.

Aí ela falou assim pra ela: “oi, aqui é da ONG tal, eu quero agradecer os 50 doces que a dona Selma mandou pra gente e tal. A gente gostou…” E até então, a Sandra não sabia pra quem ela estava vendendo, né? Foi o marido dela que conseguiu a encomenda, então ela pensou: “Bom, essa Dona Selma é muito legal, né? Muito minha amiga… E passou, ela na correria louca nem comentou com o marido dela que ela tinha recebido uma ligação da ONG e tal. Mais um tempinho se passou ali, umas duas semanas, ela recebeu uma ligação de uma outra ONG… “ah, porque a gente queria agradecer a doação dos 100 brigadeiros pra nossa instituição, né? A gente distribui e tal, estamos fazendo marmitinha pras crianças que perderam a alimentação na creche, a gente colocou os docinhos, foi um agrando e nã nã nã… Dona Selma incrível, ela que mandou pra gente. Muito obrigado”.

Então, assim, o marido dela então naquele dia que ele levou 100 doces, ele não vendeu pra mais ninguém, em nenhum prédio, em nenhum lugar… Ele vendia sempre. Ele levou os 100 doces pra essa Selma, né? A Sandra foi comentar com ele: “nossa, ligou uma pessoa aqui de uma ONG agradecendo os 100 doces, você levou os 100 doces para essa tal de Selma?” Se fosse uma coisa ok, ele ia responder normal, né? “Eu passei lá para deixar os 50, ela quis o 100, eu deixei, menos trabalho pra mim”. — Só que, se fosse isso, ele sairia de casa oito horas para vender os doces, quando era nove e meia ele estava de volta, concorda? Porque era só deixar os doces pra essa tal de Selma e voltar. E foi um dia que saiu, tipo, oito horas da manhã e voltou oito horas da noite. Então vendeu os 50 brigadeiros a mais pra dona Selma e ficou onde? —

Então, meio que a conta não batia e ele falou que não, falou que a ONG deve ter se confundido, “eu só vendi 50 pra ela, os outros 50 eu fui vendendo aí ao longo do dia, onde dava, tudo vazio, tudo fechado, você sabe”. E ela ficou cabreira… — Porque mulher tem um radar. Ele reagiu muito mal, assim. — E aí ela comentou com a mãe dela, e mãe dela falou: “tem coisa aí, com certeza tem coisa aí”. Só que, assim, toda semana, duas vezes por semana ela tinha esses 100 brigadeiros aí garantidos, então ela foi fazendo, foi vendendo, ela não tinha muito tempo para ficar pensando nas coisas, mas ela ficou meio encucada, né?

Aí um dia, ela tinha o telefone de uma das ONGs no WhatsApp e ela chamou a moça, falou assim: “olha, eu quero agradecer a dona Selma por ela comprar meus doces, mas eu acabei perdendo aqui o telefone dela, você tem pra me passar?” E aí a moça passou. Sandra muito esperta, comprou um chip diferente, ligou para essa Dona Selma e falou que era da ONG. Então, qual era a intenção dela? Tirar a limpo se eram 100 ou 50 brigadeiros. Então, ela falou: “ah, eu tô ligando para agradecer os 100 brigadeiros que a senhora mandou pra mim”. E aí, quando ela conversou com essa Selma, ela viu já que a voz dessa Selma era meio nova, assim mais ou menos da idade dela, uns 40 anos, não era uma senhora.

E aí ela agradeceu os 100 brigadeiros e a tal Selma falou: “não, que isso, tudo…”, quer dizer, confirmou que foram 100 brigadeiros. — Então o cara ficou pela rua, onde ele estava? — Na hora, a Sandra esperta de mais, falou: “Selma, me dá o deu um endereço que eu quero mandar um mimo aqui das crianças da ONG, que elas fazem artesanato…” E a Sandra conseguiu o endereço da Selma, que era num prédio muito caro em Pinheiros. E aí ela pegou o endereço, falou com a mãe e falou: “bom, o que você quer fazer, né? Ou ele tá saindo com essa Selma, e ela está comprando os brigadeiros, ou ele tá vendendo os brigadeiros e passando o dia com outra pessoa, porque ele sai cedo e desaparece”. E aí o que a Sandra fez, gente?

A Sandra resolveu seguir o Maurício, e aí ele sempre passava lá primeiro, para deixar os doces nessa tal de Selma e depois ia fazer as outras vendas. Então ela falou: “bom, se ele passar dessa Selma e sair com 50 brigadeiros, tudo bem…” Porque ele ia com um negócio na bike, tipo uma bike de vender… Eles improvisaram lá pra vender doce. E aí, quando ele chegou no prédio chique… E a Sandra falou que foi muito engraçado, porque ela dirige, então como ele estava de bike, ele vai muito devagar assim, ela não tinha como ir atrás dele, então tinha hora que ela perdia ele de vista, ele entrava numa rua que ela não conseguia entrar…. Foi um inferno, mas conseguiu achar o cara da bike dos doces.

E quando chegou lá na frente de um prédio super chique, com portaria chiquérrima, o cara abriu o portão e ele entrou com a bike. — O que não é normal você entrar na garagem de um prédio… — E, gente, ele entrou nove horas da manhã e saiu do prédio sete horas da noite. Sandra arrasado, arrasada, arrasada… De carro. Chegou primeiro que ele em casa. — Óbvio. — Já gritando, falando com a mãe dela… E a mãe dela falou: “calma, calma, vai pro banho, se acalma e fica na sua”. Ela queria já fazer barraco e a mãe dela não deixou, nem deixou ela falar nada. Ele chegou também, aparentemente cansado, falando que estava muito cansado, mas que estava sem fome… — Deve ter comido comida boa, né? Jantou lá no apartamento da Selma e veio. —

Aí ele foi dormir e ela ficou cochichando com a mãe. Aí a mãe falou pra ela assim: “bom, a gente tem que ser fria agora. Se você colocar ele para fora, quem vai entregar os brigadeiros?” Meio que de graça, porque tudo bem que ele tá ali, ele come e tal, mas ele é mais um na casa, se ele parar de entregar, ela colocar ele para fora, ela vai ter que pagar o entregador, e onde ela vai entregar? Porque ele que sai pra vender, ele que sabe os clientes… Ela só tem os clientes da internet, que são menos clientes… “E outra”, a mãe dela falou, “você está vendendo 200 brigadeiros certos, com dinheiro na mão para essa tal de Selma, que seja amante dele, que seja o que for. A gente vai perder isso também.”.

Aí a Sandra que estava muito puta, ficou um pouco menos puta da vida, mas falou: “bom, acho que minha mãe tem razão, né?” Só que, o que acontece? Isso já tem um mês e pouco. O que aconteceu? E ela me deu uma esfriada com o marido. O marido deu graças a Deus que ela deu uma esfriada, porque ele deve realmente estar com essa Selma… Ela nunca viu essa Selma na vida, ela não sabe como essa Selma é, porque na fotinha do WhatsApp dessa Selma é um cachorrinho de raça, não tem foto de pessoa e ela não está suportando mais o marido dela. Só que tem esse lado, que o marido dela todo dia traz, realmente, a venda dos 50 brigadeiros e duas vezes por semana de 100 brigadeiros. E aí ela está pesando o lado financeiro também.

Bom, eu não sei… Isso me parece aquelas histórias de antigamente, que as mulheres não se separavam porque não tinha renda, né? Eu não sei se eu aguentaria, talvez se eu não gostasse do cara eu até aguentaria, porque ele tá ali, tá trampando e tá meio que trazendo a grana. Então eu não sei… Ela queria saber de vocês. A mãe dela acha que ela não deve separar agora, nem falar para ele que sabe. Ela fingiu que nada tinha acontecido, ela mudou um pouco, ele pergunta… Ela fala que está cansada e tal e vai vivendo. Ou ela deve jogar as cartas na mesa e se divorciar? Porque com certeza, se ele entrou cedo no prédio e saiu a noite, de porteiro ele não está trabalhando.

O que será que ele tá fazendo? Será que tem chance de ser outra coisa que não seja ele com essa tal de Selma? O que vocês acham? Ela tem certeza que é amante, porque ela falou que tem um dia que ele chega com um cheiro de sabonete diferente, mas não sei… Será que, de repente… [risos] Já pensou se é outra coisa nada a ver com amante? Tipo, o cara arranjou um trabalho e não quer contar? Não sei… O que vocês fariam? A mãe acha que ela deve ficar quieta até passar essa pandemia e ela voltar a ter um emprego numa academia, conseguir se sustentar e aí põe ele para fora. E ela tem medo, a mãe tem medo de, se ela confrontar, o cara sai e vai embora com a rica, porque aí ele não precisa nem trabalhar, né? E elas? Como elas vão ficar só com aposentadoria da mãe e um monte de brigadeiro lá parado?

Então, gente, [risos] deixa o recado de vocês aí pra Sandra lá nosso grupo do Telegram, que é só jogar na busca do Telegram “Não Inviabilize” e eu volto daqui a pouco. Um beijo.

[vinheta] Quer a sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Picolé de Limão é mais um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.