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título: pálido
data de publicação: 31/08/2023
quadro: luz acesa
hashtag: #palido
personagens: mirian

TRANSCRIÇÃO

[vinheta] Shhhh… Luz Acesa, história de dar medo. [vinheta]

Déia Freitas: Oi, gente… Cheguei. Cheguei para um Luz Acesa. E hoje vou contar para vocês a história da Mirian. — A Mirian ela é uma salva vidas, então ela socorre aí muitas pessoas afogadas e, na maioria das vezes tem êxito, né? Ela e a equipe dela. E algumas vezes, infelizmente, não. A gente vai falar aqui uma das vezes onde esse socorro não chegou a tempo. — Então vamos lá, vamos de história.


[trilha]


A Mirian é uma socorrista —uma salva vidas — que trabalha no mar. Ela tem uma equipe, a equipe é grande, a equipe tem barco, tem lancha, tem helicóptero… É pra uma praia muito grande, muito frequentada aí do Brasil. E, durante um salvamento de um rapaz que tinha ido… — Assim, a praia que ela trabalha tem épocas que algumas partes da praia são fechadas, justamente por causa de o mar estar bravo, onda forte, enfim, X motivos. E aí, quando está fechada, tem os avisos lá e as pessoas não podem entrar na praia. — Só que esse rapaz ignorou os avisos e entrou com uma prancha no mar. E aí, logo que ele entrou, ele foi avisado para voltar, só que ele foi indo… Ele foi indo, ele ignorou os avisos.

E aí o protocolo é: Você avisa as outras equipes, lancha e tal, só que enquanto a equipe estava se mobilizando, o mar deu uma guinada, assim, [música de suspense] a prancha dele boiou e o cara sumiu… 


A Mirian estava ali na equipe, estava na parte da lancha, eles fizeram buscas ali… — Para ver se o cara subia, né? — Não dava mais para saber o ponto certo que ele afundou, porque a prancha andou demais, enfim, chegou o helicóptero, aquela coisa, todo mundo pra socorrer o cara com vida. Foi—se executado todo o protocolo de salvamento que dava para fazer naquelas condições, né? O rapaz não foi encontrado, a prancha dele foi recolhida porque é uma evidência, enfim, e eles voltaram ali, o helicóptero ficou rodando ainda mais um tempo tal e depois, quando encerrou ali, que deu uma escurecida eles voltaram ali para a margem, para a areia, enfim. E aí a Mirian voltou pro seu posto, porque ela tinha que fazer ali o relatório. Ela que assinaria o relatório e teriam ali nos próximos dias outros procedimentos pra seguir.  O posto de salvamento é ali na praia, né? Então você tem uma visão mais do alto da praia. 


E assim que a Miriam tava fazendo o relatório, a Marian viu o rapaz que tinha entrado com a prancha saindo do mar, andando… E ela largou ali o que ela estava escrevendo e começou a gritar para os companheiros dela: “Alá, ele está saindo, ele está saindo do mar. Ele conseguiu…”, assim, toda feliz. E aí os caras olhavam e ninguém via esse rapaz saindo do mar. E eles falavam: “Onde, Mirian? Onde? Onde que ele está?” e ela apontava: “Ali, ali, ali”, mas não tinha nada. E aí a Mirian, depois de muito apontar e ninguém achar nada e ver que todo mundo tava olhando pra ela estranho, ela falou: “Não sei… Acho que tive uma visão, não sei… Acho que eu vi o cara e tal”, e aí eles são em duplas, né? A dupla dela ali falou: “Olha, eu acho que você ficou bem impressionada e tal. Você quer que eu termine o relatório? Eu passo para você assinar, sem problema e tal”. E aí ele pegou o relatório para fazer e a Mirian, disfarçadamente, foi olhar ali pela praia e realmente não tinha ninguém. Quando ela estava voltando para o posto, ela sentiu atrás dela… Sabe quando você sente que tem alguém andando muito perto, atrás de você? E, quando ela virou, [efeito sonoro de tensão] era o rapaz… 


Ele estava todo molhado, muito pálido, com uma cara muito assustada, olhando pra Mirian. E aí a Mirian gritou de novo: “Gente, gente… Ele tá aqui” e os caras saíram correndo e era só a Mirian olhando pro nada. E aí, como era um afogamento, o chefe ali daquela equipe chegou e presenciou esse final, né? Aí ele falou: “Ai, Mirian, lamento, né? A gente às vezes perde mesmo alguma pessoa… Acho que é melhor você ir pra casa. Seu plantão já está acabando mesmo, pode ir um pouco antes e tal, a gente termina aqui. Eu mesmo assino o relatório”. E aí a Mirian foi dispensada ali umas duas horas antes de terminar o expediente dela e foi para casa. Então, ela entrou no carro, ela deu a partida no carro, [efeito sonoro de carro dando partida] respirou fundo e, muito impressionada, porque ela realmente viu o rapaz e até então ela estava achando que fosse… — Como ela disse: “Andréia, parecia uma miragem assim, sabe? Parecia que eu estava vendo coisa justamente porque eu fiquei impressionada”. — Conforme ela encostou no banco, Mirian sentiu duas mãos que vieram de trás, do banco de trás, no seu pescoço. E ela sentiu apertar o seu pescoço… 


E aí a Mirian, num reflexo, virou já com o cotovelo, para dar na cara da pessoa que estava tentando enforcar ela ali, né? E não tinha ninguém. Mirian foi para casa, chegou em casa, estacionou o carro, entrou… Mirian morando sozinha… Assim que ela entrou em casa, ela já foi tirando a roupa para tomar um banho, né? Relaxar e pensar um pouco no que tinha acontecido. [efeito sonoro de queda d”agua” do chuveiro] Conforme a Mirian entrou no chuveiro, todas as coisas do banheiro dela começaram a cair… — Então, assim, vidros de desodorante, perfume, sabonete… Tudo que tinha começou a cair no chão, assim, voando as coisas… — E ela ficou muito assustada. Desligou o chuveiro ali, saiu correndo, se embrulhou numa toalha. E ela viu o rapaz, muito pálido, dentro da casa dela e ele estava com muita raiva. Era nítido no rosto dele que ele estava com muita raiva. — E aí eu fico pensando assim: O cara acabou de morrer, como que ele tem essa força? Como ele tem essa habilidade assim de mover coisa? Fico pensando naquele filme: “Gosth”, que demorou para o cara aprender a mover coisa e realmente o que fez ele mover coisa era raiva, mas demorou… Como que esse cara já acabou de morrer e já sabe coisas do além assim, né? Fiquei aí com esse questionamento. —


Ele ficou olhando feio pra ela e sumiu… E aí a Mirian vestiu a roupa de novo e ela não sabia o que fazer… Mirian pegou o telefone e ligou pra uma amiga, contou o que estava acontecendo e essa amiga falou: “Amiga, eu vou pra aí”. — Corajosa essa amiga… Que a gente pode chamar aqui de Sandra. — E aí a Sandra falou: “Eu vou pra aí pra ficar com você e tal… Calma que eu estou chegando. Foi uma perda e tal, sempre é horrível perder alguém e tal”. E a Sandra, também socorrista, de outro posto, com outra escala de plantão, mas que também estava de folga. E aí a Sandra foi para lá e elas começaram a conversar. Mirian resolveu fazer alguma coisa ali pra elas comerem e, enquanto elas estavam comendo, a Mirian viu este cara pálido de novo atrás da Sandra. Só que a Sandra virava e não via nada… — Só Mirian via esse cara, que era o rapaz que tinha entrado lá no mar. — E perguntei para Mirian, falei: “Mas como ele estava? Ele já estava seco?”, ela falou: “Andréia, ele era muito pálido, muito pálido e parecia que ele estava molhado. Mas, por exemplo, no meu chão, nas minhas coisas, tipo não tinha a água, não tinha nada, mas ele tinha um aspecto de pessoa que estava molhado”.


E aí a Sandra ficou um tempo lá, mas não podia ficar muito também que o plantão dela no dia seguinte começava cedo… Foi embora e a Mirian não tinha para onde ir, para dormir na casa de alguém e tal, né? E aí ela fez a cama dela ali e deitou. E, conforme ela deitou, ela escutava a respiração muito forte e muito brava deste cara aí — o cara pálido lá da praia — e ela dormiu ouvindo essa respiração… E, quando Mirian acordou, Mirian mora sozinha, mas tem uma cama de casal, do lado vago da cama estava molhado… E estava molhado com um cheiro que ela tentou me explicar, mas eu não consigo entender. Ela falou: “Andréia, quando você resgata uma pessoa que morreu afogado, mesmo que seja no dia seguinte ali, ela tem um cheiro que, passando os dias o cheiro, vai piorando… Mas é um cheiro muito característico de tecido de corpo humano com um pouco de maresia, um pouco de peixe”. Ela falou: “Não chega a cheirar peixe, mas é um cheiro muito característico”, que ela não soube me explicar e eu também não sei, porque graças a Deus eu nunca vi um cadáver afogado de perto. —


E essa água que estava na cama da Mirian tinha esse cheiro. Quando ela acordou, tinha mensagem já no celular dela que eles tinham conseguido localizar o rapaz e realmente ele tinha se afogado. — Então, ele ficou horas só no mar. Então, é um cheiro… A pessoa morreu, ela já começa a cheirar, mas era esse cheiro, tipo, de começo de morte, a Mirian falou… E não cheiro já de dias de morte, que estava na cama dela. — E aí localizou o rapaz, a Mirian não precisaria dali para frente tomar nenhuma atitude, porque o relatório tinha sido feito. Quem só resgata corpos é o Corpo de Bombeiros, então já estava com o Corpo de Bombeiros, vai para o IML, outro trâmite. A Mirian não precisaria participar de nada disso. Só que ela resolveu ir ao IML pra ver o corpo… E ela foi e lá, — o pessoal já se conhece, todo mundo se conhece… — ela falou que era o resgate dela e tal, e aí a Mirian viu o corpo do cara e o corpo do cara tava lá e ele não tava com a Mirian… E aí ela falou: “Andréia, eu acho que eu errei… Porque assim que eu vi o corpo, eu fiquei mais impressionada e eu saí abalada do IML. E, conforme eu saí abalada de IML, esse cara voltou a me seguir e ele estava mais agressivo. Parece que agora ele tinha mais acesso a mim, assim, eu conseguia sentir esse cheiro nele e eu conseguia sentir a raiva dele”. 

Aí aqui a gente pensa: “Mirian, você procurou alguém? Você procurou ajuda? Você procurou alguma coisa?”, ela falou: “Andréia, não… Eu não tinha quem procurar, eu não podia ficar falando que eu estava vendo esse cara, que todo mundo já estava me achando estranha e iam me achar uma louca”. E, acredite se quiser, a Mirian conviveu com este rapaz durante quase oito dias. Depois do sétimo ou oitavo dia, que ela não lembra bem, ele sumiu e nunca mais apareceu. Mas nesses dias que ele passou com ela, ela viu ele apodrecendo dia a dia… Sempre muito pálido, só que o cheiro desse cara foi mudando. E aí a Mirian, na cabeça dela, porque ela não foi checar mais nada, ela acha que ele sumiu depois da missa de sétimo dia. — Será que tem a ver? Será que… — Porque ela falou: “Andréia, é a única coisa que na minha cabeça faz sentido, porque eu rezava todo dia e ele não ia embora” e ele derrubou muita coisa dentro da casa da Mirian, ele aparecia, ele assustava a Mirian… E o cheiro da casa dela, ela falou: “Andréia, era uma época meio de frio, mas eu tinha que deixar tudo aberto, tinha que dormir com aquele vento, porque a minha casa estava cheirando podre. Podre. E às vezes na minha cama tinha água”.


E aí só depois de sete ou oito dias da data que ela foi no IML ele sumiu, desapareceu. Nunca mais apareceu. A Mirian é salva vidas até hoje, nesse mesmo grupo de socorristas e tal, né? — Ela já perdeu outras pessoas, porque infelizmente, principalmente, ela pediu até para dar um alerta aqui, final de ano, Carnaval, épocas que tem festas e às vezes as pessoas bebem e entram no mar e tal, então é complicado… — E nunca aconteceu isso, só aconteceu com esse cara aí que entrou com a prancha. E aí a Mirian pergunta: “Por que será que ele estava com raiva de mim?”. Por que ele direcionou isso pra Mirian? Ela era responsável realmente por aquela equipe que estava naquela hora, por aquele resgate, então será que era isso? Mas como ele sabia que ela era responsável, né? Ele não sabia… Então por que ele grudou na Mirian e outras pessoas que morreram posteriormente, uma outra, que ela falou que é muito mais difícil a pessoa morrer afogada, não tem toda hora. Por que nenhuma outra pessoa foi assim e grudou nela? Só ele. Então, esse é um questionamento aí que a Mirian deixa pra gente, né? Eu não faço ideia… Eu acho que ele mirou na pessoa mais suscetível? Ou será que foi tudo coisa da cabeça da Mirian? Mas até o cheiro? Ele ir apodrecendo esses sete, oito dias na casa da Mirian e ela sentindo o cheiro? Assustador, né? E ele todo pálido, todo saído do mar, todo molhado, podre. — Ah, não dá para mim, não… Deus me livre. —

[trilha]

Assinante 1: Oi, meu nome é Priscila, falo do Espírito Santo. Estou aqui escutando a história e eu estava o tempo todo: “Credo, Deus me livre”, “Credo, Deus me livre, coitada da Mirian”, até começar a rir com a ideia fazendo comparação do morto com o morto do Ghost, gente… Se o morto do Gosth demorou pra aprender a movimentar os objetos, como esse cara aprendeu tão rápido? [risos] Ô meu Deus, Déia sendo Déia… [risos] Obrigada por essa história aí. Sinto muito, Mirian por você ter passado por essa assombração toda. Um beijo. 

Assinante 2: Olá, Não Inviabilizers, aqui é a Paula de São Paulo. Oi, Déia, Oi, Mirian, acabei de ouvir sua história, é uma história muito tensa e esse espírito, infelizmente, morreu dessa forma trágica pela imprudência dele mesmo. Você tentou com a sua equipe salvá-lo, mas infelizmente não deu certo. É muito difícil para um espírito que morre de uma forma tão trágica aceitar a passagem, acredito que quanto mais raiva ele ficava, mais ele se apegava a você, tentava te assustar, enfim… Acredito que ele já tenha ido para um lugarzinho melhor, tenha aceitado o que aconteceu com ele e que você esteja bem. Um grande beijo. 

[trilha]

Déia Freitas: Então é isso, gente, um beijo… — Deus me livre. — Comentem lá no nosso grupo do Telegram, e eu volto em breve.

[vinheta] Quer sua história contada aqui? Escreva para naoinviabilize@gmail.com. Luz Acesa é um quadro do canal Não Inviabilize. [vinheta]
Dourado

Dourado é pai, abandonou a teologia e a administração para seguir a carreira em TI e sua paixão por fotografia. Gosta de cinema, séries, música e odeia whatsapp, sempre usou Telegram.